Solicitado por vários leitores a voltar sobre o tema das ONGs, mostrarei a vinculação entre os “fazendeiros” americanos e a atuação de ONGs ambientalistas no Brasil. Trata-se de uma curiosa conjunção entre o agronegócio americano, ONGs ambientalistas (aqui evidentemente), grandes empresas, governos e “movimentos sociais” no Brasil.
A National Farmers Union (União Nacional dos Fazendeiros) e a Avoided Deforestation Partners (Parceiros pelo Desmatamento Evitado), dos EUA, encomendaram um estudo, assinado por Shari Friedman, da David Gardiner & Associates, publicado em 2010, para analisar a relação entre o desmatamento tropical e a competitividade americana na agricultura e na indústria da madeira. O seu título é altamente eloquente: “Fazendas aqui, florestas lá”.
O diagnóstico do estudo é o de que o desmatamento tropical na agricultura, pecuária e florestas conduziu a uma “dramática expansão da produção de commodities que compete diretamente com os produtos americanos”. Ou seja, é a competitividade do agronegócio brasileiro que deve ser diminuída para tornar mais competitivos os produtos americanos. O estudo é tão detalhado que chega a mostrar quanto ganhariam os estados americanos e o país como um todo. Eles calculam que o ganho americano seria entre US$ 190 bilhões e US$ 270 bilhões entre 2012 e 2030.
As campanhas pela conservação das florestas tropicais e seu reflorestamento não seriam, nessa perspectiva, uma luta pela “humanidade”.
Elas respondem a interesses que não têm nada de ambientalistas. Pelo contrário, o estudo chega a afirmar que os compromissos ambientalistas nos EUA poderiam, inclusive, ser flexibilizados segundo as regras atuais, que não prevêem nenhum reflorestamento de florestas nativas, tipo “reserva legal”, somente existente em nosso país. Eles também denominam isto de “compensação”, que poderia ser enunciada da seguinte maneira: “mais preservação lá [no Brasil], menos preservação aqui [nos EUA]”.
Cito: “Eliminando o desmatamento por volta de 2030, limitar-se-iam os ganhos da expansão agrícola e da indústria da madeira nos países tropicais, produzindo um campo mais favorável para os produtos americanos no mercado global das commodities”.
Eles têm, pelo menos, o mérito da clareza, enquanto os seus adeptos mascaram as suas atividades.
Esse estudo reconhece o seu débito para com a ONG Conservation International e para com Barbara Bramble, da National Wildlife Federation, seção americana da WWF, igualmente presente em nosso país.
A Conservation International é citada duas vezes na página de agradecimentos, suponho que não por suas divergências. No entanto, ela publica, em seu site, um artigo se dizendo contrária ao estudo. A impressão que se tem é a de que se trata de um artifício retórico para se desresponsabilizar das repercussões negativas desse estudo em nosso país e, em particular, na Câmara dos Deputados.
Logicamente falando, a sua posição não se sustenta, pois ao refutar as conclusões do artigo, não deixa de compartilhar de suas premissas. A rigor, não segue o princípio de nãocontradição, condição mesma de todo pensamento racional.
Por que não defende a “reserva legal” nos EUA e na Europa, segundo os mesmos princípios defendidos aqui? Seria porque contrariaria os interesses dos fazendeiros e agroindustriais de lá? Dentre seus apoiadores, destacamse Wall Mart, McDonald’s, Bank of America, Shell, Cargill, Kraf Foods Inc, Rio Tinto, Ford Motor Company, Volkswagen, WWF e Usaid. Os dados foram extraídos de seu site internacional.
Barbara Bramble é consultora senior da National Wildlife Federation, a WWF americana. Sua seção brasileira segue os mesmos princípios e modos de atuação, tendo o mesmo nome. Se fosse coerente, deveria lutar para que os 20% de “reserva legal” a serem criados nos EUA e na Europa fossem dedicados à wildlife, à “vida selvagem”. Entre os seus apoiadores e financiadores (os dados foram extraídos de sua prestação de contas de 2009), destacam-se o Banco HSBC, Amex, Ibope, Natura, Wall Mart, Conservation Internacional, Embaixada dos Países Baixos, Greenpeace e ISA (Instituto Socioambiental).
A lista não é exaustiva.
Observe-se que a ONG Conservation International reaparece como parceira da WWF.
Ora, a mesma consultora é sóciafundadora do ISA (Instituto Socioambiental), ONG ambientalista e indigenista.
A atuação dessa ONG nacional está centrada na luta dita pelo meio ambiente e pelos “povos da floresta”.
Advoga claramente pela constituição de “nações indígenas” no país, defendendo, para elas, uma clara autonomia, etapa preliminar, inclusive, de sua independência posterior nos termos da Declaração dos Povos Indígenas da ONU.
Ela, junto com o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), possui o mais completo mapeamento dos povos indígenas do Brasil. Sua posição é evidentemente contrária à revisão do Código Florestal. Dentre os seus apoiadores e financiadores, destacamse a ICCO (Organização Intereclesiástica para a Cooperação ao Desenvolvimento), NCA (Ajuda da Igreja da Noruega), Embaixada da Noruega, União Europeia, Embaixada Britânica, Embaixada da Finlândia, Embaixada do Canadá, Funai, Natura e Fundação Ford. Esses dados foram extraídos de seu site.
O ISA compartilha as mesmas posições do Cimi (Conselho Indigenista Missionário), da CPT (Comissão Pastoral da Terra) e do MST. Ora, esses “movimentos sociais”, verdadeiras organizações políticas de esquerda radical, por sua vez, seguem os princípios da Teologia da Libertação, advogando pelo fim do agronegócio brasileiro e da economia de mercado, contra a construção de hidrelétricas e impondo severas restrições à mineração. Junto com as demais ONGs, lutam por uma substancial redução da soberania nacional.
Dedico esse artigo aos 13 deputados, de diferentes partidos, e às suas equipes de assessores que tão dignamente souberam defender os interesses do Brasil, algo nada fácil nos dias de hoje.
Transferir ou criar riqueza?
‘Cem milhões de brasileiros vivem com o dinheiro público”, estampou O GLOBO em sua primeira página da edição deste domingo. A matéria é de Gilberto Scofield Jr., com base em estudo de Raul Velloso, veterano especialista em nossas contas públicas.
“Metade da população do país depende hoje de recursos repassados pelo governo federal. São servidores públicos, pensionistas e pessoas beneficiadas por programas sociais, transformando o orçamento federal em uma grande folha de pagamentos”, prossegue a reportagem.
São compreensíveis as pressões de uma democracia emergente sobre os gastos sociais. Orçamentos públicos refletem essas exigências. A preocupação da matéria é a degeneração do processo político. “O poder de influência eleitoral é muito grande quando o governo tem tanta gente dependendo dele”, dispara o economista.
Isso explica em boa parte a feroz disputa intestina da social-democracia brasileira e as acusações recíprocas de corrupção. Os tucanos mexeram na Constituição para garantir a reeleição de FHC. E acusam agora os petistas de aparelhamento do Estado e de assistencialismo para garantir sua permanência no poder.
Mas outra importante preocupação é com a dimensão econômica. O que esses 48,8 milhões de núcleos familiares, envolvendo 100 milhões de brasileiros, transmitirão a seus filhos como perspectiva de futuro? Devem buscar um emprego industrial no ABC paulista? Ou entrar para os sindicatos, onde o futuro parece mais brilhante? Devem ser empreendedores e criar postos de trabalho, enfrentando o cipoal de impostos, ou se candidatar à política, onde os recursos parecem não faltar? E o jovem no campo, deve frequentar uma escola técnica e buscar uma especialidade no agronegócio ou entrar no subterrâneo da política através do MST, com o colorido dos bonés e das camisas vermelhas, a força da enxada e da foice nas mãos, a “fúria dos justos” no olhar e toda a ignorância quanto à complexidade do organismo econômico moderno e à sofisticação política de uma sociedade aberta? E a classe média, o contribuinte, deve apenas recomendar a seus filhos a aprovação em concursos públicos? Se o futuro do militante, do sindicalista e do político parece bem melhor que o do estudante, do trabalhador e do empreendedor, a perspectiva é de baixa produtividade e lenta melhoria no padrão de vida dos brasileiros.