Paraguai envia mil militares a 5 províncias em estado de exceção para combater grupo pró-Farc
Flávio Freire
Sob fortes temores de desrespeito aos direitos humanos e uma enxurrada de críticas dentro e fora do governo, o presidente do Paraguai, Fernando Lugo, enviou ontem mil policiais e militares num plano de emergência para sufocar as atividades da guerrilha Exército do Povo Paraguaio (EPP), ligada às Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). A medida foi anunciada após o decreto de um estado de exceção em cinco departamentos (estados) do norte do país - inclusive em áreas próximas à fronteira com o Brasil -, levando medo aos cerca de 300 mil brasileiros que vivem na região, os chamados brasiguaios, responsáveis por 80% da economia local com o cultivo e exportação de grãos.
- Aqui, os brasileiros são imigrantes estrangeiros e com uma situação econômica muito boa, então é normal que tentem nos prejudicar. Provavelmente, os brasileiros serão vítimas desses guerrilheiros - disse a advogada Vilma Dias de Oliveira. - Não sabemos o poder de fogo real deles - diz ela, que vive há 30 anos em Ernandaria, na região da fronteira com o Brasil.
EPP faz sequestros extorsivos
Morador de Santa Rosa de Araguari, em San Pedro, Valídio Eschenberger planeja aumentar a segurança particular em torno de sua propriedade de 150 hectares para se proteger:
- Por enquanto, ninguém mexeu com a gente, mas eles (do EPP) parecem muito perigosos. Estamos trabalhando tranquilamente, mas já nos reunimos (com outros brasiguaios) para aumentar nossa segurança.
A crise começou na semana passada, quando o EPP assassinou três civis e um policial num assalto à fazenda Santa Adélia, em Concepción, a 420 km de Assunção, numa provável tentativa de roubar gado. O grupo armado se autoproclama marxista-leninista e acusa o presidente Fernando Lugo de representar a oligarquia sem se importar com a necessidade de uma reforma agrária no Paraguai. Em dois anos, a milícia sequestrou dois fazendeiros e cobrou US$700 mil de resgate. Analistas acreditam que seus cerca de 100 integrantes agem mais pela delinquência do que pela ideologia, mas documentos comprovando sua ligação com as Farc - de onde teriam recebido armamento pesado e treinamento militar - colocaram o governo de Assunção em estado de alerta.
Com o envio de tropas à região, o governo espera capturar, pelo menos, 25 guerrilheiros. Mas, aumentando o clima de tensão, ontem, duas organizações camponesas e uma das principais centrais sindicais do país anunciaram que não respeitarão o estado de exceção.
Previsto para durar 30 dias, o estado de exceção foi decretado nos departamentos de Amambay, San Pedro, Alto Paraguai, Presidente Hayes e Concepción, onde se concentra toda a produção de maconha do Paraguai. O decreto suspende todas as garantias constitucionais nas cinco províncias e permite ao Exército promover detenções e transferências sem a necessidade de ordem judicial - o que despertou a ira de grupos de defesa dos direitos humanos.
- Peço respeito aos direitos de trabalhadores humildes. Muitos conhecem detalhes do EPP, mas não denunciam por medo - advertiu o prefeito de Horqueta, Jorge Centurión.
O episódio deixou ainda mais exposta a crise interna do governo paraguaio. Ontem, o vice-presidente Federico Franco - líder do partido Liberal Radical Autêntico (PLRA) , maior aliado da coalizão - desafiou Lugo, afirmando que seu interesse não era combater o EPP. Diante das insinuações, o vice-presidente foi obrigado a prestar esclarecimentos ao Congresso.
- Jurei sobre a Bíblia respeitar a Constituição e as leis. Esse compromisso com o povo me obriga a ser prudente. Por isso, a postura crítica. Sempre disse que os membros do EPP são criminosos - recuou Franco.
No que pode ser a primeira retaliação do EPP, ontem à noite, o senador liberal Robert Acevedo, um dos políticos que denunciaram o tráfico de drogas no norte do Paraguai, sofreu um atentado em Amambay. Atiradores atacaram o veículo em que viajava e, segundo o jornal "ABC", duas pessoas que estavam com ele morreram. O senador foi levado em estado grave ao hospital.
Com agências internacionais
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O Estado de S. Paulo - 27/4/2010
Guerrilha teria enviado dinheiro às Farc
Jamil Chade, CORRESPONDENTE / GENEBRA - O Estado de S.Paulo
Três paraguaios com status de refugiado dado pelo governo brasileiro estariam transferindo 30% do que arrecadam com os sequestros no Paraguai para as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). A ONU promete investigar o caso e determinar por que o Brasil concedeu refúgio aos três.
A acusação do envolvimento dos refugiados com as Farc faz parte do pacote de informações que o Paraguai entregou ontem à ONU, pedindo que ela pressione o Brasil a mudar sua posição. Ontem mesmo, a organização pediu informações para seu representante no Brasil sobre o caso.
Há seis anos, os paraguaios Juan Arrom, Anuncio Martí e Víctor Colmán, ex-integrantes do grupo guerrilheiro Exército do Povo Paraguaio (EPP), receberam refúgio do Brasil, benefício concedido pelo Conselho Nacional de Refugiados (Conare). Com a proteção, eles não podem ser extraditados para o Paraguai. Assunção alega que os três são fundadores do EPP e coordenam as atividades do grupo no Brasil.
Dois deles moram em Curitiba e o outro, em Campo Grande. No sábado, o Congresso paraguaio aprovou, a pedido do presidente Fernando Lugo, o estado de exceção em cinco Departamentos (Estados), para facilitar o combate ao EPP.
Ontem, diplomatas paraguaios se reuniram com o alto comissário de refugiados da ONU, Antonio Guterres, ex-presidente de Portugal.
Agora, Guterres pedirá que seu representante no Brasil prepare um relatório sobre o caso para que se esclareçam os motivos que levaram o País a conceder o status de refugiado.
"É urgente retificar o erro do Brasil, que deu status de refugiado a essas pessoas", disse Carlos Fleitas, diretor do departamento legal da chancelaria paraguaia. Falando ao Estado, ele qualificou a decisão brasileira de "grave violação". "A condição de refugiado não pode significar impunidade", alertou. "Pedimos uma revisão da decisão. Temos provas de que não são perseguidos políticos, mas criminosos."
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Revista Época
PARAGUAI
Caça aos guerrilheiros
O presidente do Paraguai, Fernando Lugo, pediu a decretação de estado de exceção em cinco departamentos (Estados) do país, como uma medida para facilitar o combate aos guerrilheiros do Exército do Povo Paraguaio (EPP). Acusado de ter vínculos com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), o EPP está por trás de sequestros de empresários e figuras públicas como Cecilia Cubas, filha do ex-presidente Raúl Cubas, assassinada no cativeiro em 2005. Até o fechamento desta seção, após aval do Senado, a Câmara ainda não aprovara a medida, que permitiria ao governo ordenar prisões e impedir reuniões públicas.