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Artigos-->Com a casa em ordem, Serra vai à luta -- 20/04/2010 - 12:13 (Félix Maier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Revista Veja - 21/04/2010



Brasil



Com a casa em ordem, Serra vai à luta



Depois de unificar o PSDB em torno da sua candidatura, José Serra começa a pavimentar o caminho rumo ao seu objetivo: liderar o Brasil na era pós-Lula



Fábio Portela

Paulo Vitale





EM PAZ

O candidato do PSDB à Presidência, José Serra: campanha

na rua. Agora, com o partido unido



VEJA TAMBÉM

• Quadro: Como recuperar a capacidade

de investir



• Quadro: Menos abstração, mais emoção



• Nesta edição: "Eu me preparei a vida inteira para ser presidente"



• Em profundidade: cobertura completa da campanha de José Serra



Ungido há menos de dez dias candidato oficial do PSDB à Presidência da República, José Serra não poderia encontrar ambiente mais propício para iniciar sua campanha. Duas novidades contribuem para isso. A primeira é que os tucanos estão animadíssimos – o que havia muito tempo não ocorria. Desde 2003, quando o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso colocou a faixa presidencial no pescoço do petista Luiz Inácio Lula da Silva, os militantes do PSDB passaram a amargar uma espécie de fossa de fundo existencial. A saída do poder jogou o partido numa crise de identidade em que ninguém sabia ao certo que bandeiras defender ou que líderes seguir. Na semana passada, o PSDB parecia ter reencontrado o seu eixo. Ao barulhento lançamento da candidatura de Serra, acorreram mais de 6 000 militantes do partido. Vindos de todos os estados, carregavam bandeiras, espremiam-se uns contra os outros e cantavam sem parar no amplo auditório alugado pela sigla. A maioria usava camisetas nas cores azul e amarelo, algumas com inscrições como "temos orgulho do que criamos". Era um clima diametralmente oposto ao registrado nos últimos encontros do partido. O motivo da animação é que o PSDB, finalmente, tem um projeto definido, aprovado e defendido por todos na sigla: eleger José Serra presidente da República. E eis aí o segundo elemento a pavimentar o caminho de Serra nessa campanha. Seu partido vai unido para a briga. E isso, tratando-se de PSDB, é outra grande novidade.

O próprio Serra é o maior responsável pela unificação do partido. Nas duas últimas eleições presidenciais, o PSDB marchou dividido. Em 2002, a primeira candidatura de Serra à Presidência só se consolidou ao custo de engalfinhamentos com tucanos diversos, como o ex-ministro Paulo Renato e o senador Tasso Jereissati. Em 2006, Geraldo Alckmin foi o escolhido – mas também só depois de emparedar Serra e toda a cúpula de seu partido. Essas contendas internas costumavam causar fraturas que custavam a cicatrizar. Como resultado, cada um remava para um lado e o barco tucano não saía do lugar. Desta vez, a situação é outra. Serra impôs sua ascendência de forma natural. Depois de passar pelo governo Fernando Henrique, pela prefeitura e pelo governo de São Paulo, ele é hoje reconhecido por seus pares como o mais preparado entre os tucanos para enfrentar o desafio de presidir o país. O ex-governador de Minas Gerais Aécio Neves, que também sonhava em se lançar na disputa pelo Planalto, abriu-lhe passagem, no fim do ano passado, num gesto maduro e generoso. Na festa de lançamento de Serra, foi Aécio o autor do discurso mais inflamado do dia em defesa do candidato. Os tucanos que ainda sonham ver o mineiro candidato a vice-presidente na chapa do partido quase levitaram.

No discurso com o qual se lançou, Serra refutou a narrativa petista de que o Brasil só começou a ser construído em 2003, com a chegada de Lula ao poder. Disse que o momento positivo que o Brasil vive hoje se deve às conquistas obtidas por toda a sociedade desde o fim do regime militar, sobretudo à Constituição de 1988. Criticou a política externa brasileira e a sua inclinação para sustentar regimes autoritários, como os de Cuba e do Irã, e reservou boa parte da fala para condenar a estratégia petista de estimular uma disputa entre pobres e ricos na sociedade. "Não aceito o raciocínio do nós contra eles. Não cabe na vida de uma nação. Somos todos irmãos na pátria. Lutamos pela união dos brasileiros, e não pela sua divisão", disse. O tucano também criticou o modo petista de governar, abrigando apaniguados em todas as engrenagens da máquina pública: "O Brasil pertence aos brasileiros que não dispõem de uma ‘boquinha’, que exigem ética na vida pública porque são decentes, que não contam com um partido ou com alguma maracutaia para subir na vida". Por fim, repisou o slogan que deverá dar o tom da sua campanha, "O Brasil pode mais". Serra está decidido a sublinhar suas diferenças em relação ao PT, mas sabe que não levará vantagem colocando-se como o "candidato da mudança", como fez Lula em 2002 ou Barack Obama, nos Estados Unidos, em 2008. Por isso, pretende insistir no raciocínio segundo o qual o Brasil melhorou muito desde a redemocratização, e ele, José Serra, é o mais preparado para dar continuidade a esse ciclo virtuoso.

Na forma, o discurso do ex-governador de São Paulo foi sensivelmente diferente daquele que ele proferiu em 2002, na primeira vez em que se candidatou a presidente. Naquela ocasião, ainda ministro da Saúde, discorreu de forma técnica e preocupou-se, sobretudo, em elencar seus feitos como homem público. Desta vez, preferiu apelar para a emoção: "Venho hoje, aqui, falar do meu amor pelo Brasil; falar da minha vida; falar da minha experiência; falar da minha fé; falar das minhas esperanças no Brasil", disse. Segundo três linguistas consultados por VEJA, ao entrelaçar sua história pessoal à do país, ele se aproxima de seus ouvintes. O uso mais frequente de metáforas e imagens, afirmam os especialistas, ajuda a produzir o mesmo efeito. "Num determinado trecho, ele diz que governos, como as pessoas, têm alma. A personificação é eficaz porque as pessoas compreendem o mundo em grande parte através de referências físicas", explica Lilian Ferrari, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Um estudo americano, publicado em 2001 na Administrative Science Quarterly, analisou discursos de presidentes americanos, de George Washington a Ronald Reagan, e descobriu que o carisma atribuído a um político está diretamente relacionado ao número de palavras de um determinado gênero que ele usa em seus discursos. Aquelas que evocam imagens, sons, gostos e outras sensações, diz o estudo, atingem mais fácil e imediatamente os ouvintes do que as que exprimem conceitos. Assim, "suor" é mais eficaz do que "esforço" e "mão" é mais forte do que "ajuda". Serra parece ter aprendido a lição.

Embora esteja bem posicionado nas pesquisas, o candidato tucano tem a clara noção de que o mapa eleitoral brasileiro neste momento é muito mais favorável para ele nas regiões Sul, Centro-Oeste e Sudeste do que no Norte e no Nordeste, onde sua principal adversária, Dilma Rousseff, deve levar a melhor. Foi por isso que o primeiro estado visitado por Serra após o lançamento da sua campanha foi a Bahia. No Mercado Modelo de Salvador, ele cantou versos de Ataulfo Alves numa roda de samba ("Atire a primeira pedra, ai, ai, ai, aquele que não sofreu por amor"), amarrou uma fitinha de Nosso Senhor do Bonfim no pulso e abraçou quem passou pela sua frente. Um candidato em estado puro. Para aumentar sua massa de eleitores no Norte e no Nordeste, Serra conta com bons palanques estaduais. Ele terá, ao contrário do que ocorreu com Geraldo Alckmin em 2006, diversos candidatos competitivos disputando o cargo de governador a lhe dar sustentação nessa empreitada.

Andre Dusek/AE





NINHO DE AMOR

No lançamento da candidatura Serra, foi do ex-governador Aécio Neves o discurso

mais entusiasmado. "Vice, vice", gritava a militância



No Nordeste, o tucano subirá em palanques com probabilidade de vitória em seis dos nove estados, sendo que na Bahia, dona do quarto colégio eleitoral do país, ele terá o apoio do único candidato capaz de azedar a reeleição do petista Jaques Wagner: Paulo Souto, do DEM. Na Paraíba, Alagoas, Sergipe, Rio Grande do Norte e Piauí, Serra terá ao lado candidatos apontados entre os favoritos nas pesquisas eleitorais. Em Pernambuco, o PSDB contará com o apoio do senador Jarbas Vasconcelos, do PMDB. Apesar de ter poucas chances contra o atual governador e favorito à reeleição, o dilmista Eduardo Campos (PSB), Jarbas tem excelente reputação no estado e vai usá-la em favor do candidato tucano. O ponto fraco de Serra no Nordeste é o Ceará. Na Região Norte, ele terá bom palanque no Pará, com o ex-governador Simão Jatene. Kátia Abreu, no Tocantins, também é uma candidata forte.

Já no Sul e no Sudeste, os ventos não poderiam ser melhores para o tucano. Menos por causa da montagem dos palanques estaduais do que pela sua influência na região. Em São Paulo, por exemplo, estado que ele governou nos últimos três anos, Serra espera impor uma respeitável dianteira de 4 milhões de votos sobre Dilma. Nesse diagrama eleitoral, há um estado que se destaca: Minas Gerais, que tem o segundo maior colégio eleitoral do Brasil, com 14 milhões de eleitores. Nas últimas duas eleições presidenciais, quem venceu lá foi Lula. Desta vez, o ex-governador Aécio Neves, provavelmente o mais popular da história mineira, garante que colocará todo o seu peso a favor de Serra. O PSDB acredita que Aécio é capaz de dar aos tucanos a vitória no estado. E que essa vitória pode ser determinante para definir o resultado da eleição nacional. Dez entre dez militantes do PSDB, no entanto, acreditam que Aécio arrastaria muito mais votos atrás de si se aceitasse integrar a chapa, no papel de vice. Ele resiste, e diz que prefere o Senado. O próprio Serra leva a discussão em banho-maria, e diz que vai esperar até o fim de maio para anunciar quem fará dobradinha com ele.

Serra tem dito que se preparou a vida inteira para este momento. Como ele, o Brasil de 2011 não poderia estar mais maduro para iniciar uma nova fase da sua história. A era pós-Lula, que virá com Serra ou com Dilma, celebrará e colherá os frutos de 25 anos de redemocratização e dezesseis anos de estabilidade monetária. Tem, portanto, todos os elementos para ser uma primavera do desenvolvimento. Com Serra, ela poderá vir com a vantagem adicional da alternância de poder, seiva da democracia, sem a qual se corre o risco de ver vicejar o voluntarismo dos governantes, a corrupção da máquina do estado e o fenecimento das novas ideias. É em busca dessa oxigenação no poder que os tucanos, com Serra à frente, alçaram voo na semana passada. E agora estão voando juntos.



Com reportagem de Kalleo Coura, Laura Diniz, leonardo coutinho e Marina Yamaoka



Tucano, signo Peixes

Alexandre Scheiner





ORÁCULO

Para Oscar Quiroga, o astrólogo preferido

de Serra, está escrito nas estrelas:

o tucano será o próximo presidente



José Serra, dizem os que o conhecem, é do tipo que se pauta sempre pela razão. Há, no entanto, pelo menos uma irracionalidade que o fascina: a astrologia. Sim, o tucano adora ler horóscopo. "Acho curioso quando alguém chega para o outro e fala: ‘Você é de Peixes?’. E acerta na mosca. Eu não tenho capacidade de entender essas interpretações, mas acho incrível, fico intrigado. Há uma espécie de ciência por trás disso", disse Serra a VEJA. Seu astrólogo favorito é Oscar Quiroga, do jornal O Estado de S. Paulo. A pedido de VEJA, ele traçou o mapa astral do candidato. Os prognósticos não poderiam ser mais auspiciosos para o tucano. No que depender dos astros, arrisca Quiroga, José Serra está eleito.

Perfil astrológico de José Serra

Nascimento: 19/3/1942, às 2h, em São Paulo

Signo: Peixes

"Sol e Netuno em oposição É movido pelo idealismo. Como todo visionário, tem dificuldade de comunicar o que vê. Por isso, é hermético e tem um ar de quem está fazendo mistério

Lua em Áries Liderança inata

Saturno e Urano em conjunção É motivado pela necessidade de reformular dogmas. Tem habilidade organizacional e de trabalhar em equipe. Consegue reunir pessoas diferentes em prol de uma mesma causa

Ascendente Aquário Sua estrela é racional-intuitiva. Navega bem em ambientes e situações complexas e sua "missão" neste planeta é descomplicar

Prognóstico para os próximos meses

É notável a coincidência de que no dia 10 de abril, quando sua pré-candidatura a presidente foi formalizada, o planeta Urano tenha atingido a localização em que o Sol se encontrava no momento do seu nascimento. Esse aspecto se repetirá em 7 de outubro. Urano representa a comunidade organizada. A natureza desse relacionamento astrológico indica que José Serra se tornará capaz, durante esse período, de reunir o apoio de diferentes vertentes em torno de sua candidatura.

A esse aspecto, agrega-se o fato de que Júpiter também atingirá a posição de seu mapa natal no fim de maio e de setembro, o que é outro sinal positivo para seu desempenho como candidato à Presidência. O sinal mais marcante e auspicioso de sua candidatura se dará entre os dias 1º e 25 de agosto de 2010, quando a Lua progredida estará em trígono com Vênus e Júpiter de seu mapa natal, indicando sucesso e bem-aventurança.

Com todos esses sinais astrológicos, seria tolice não arriscar a afirmação de que José Serra deve ser o próximo presidente do Brasil, a não ser que o mapa dos outros candidatos também possua elementos tão ou mais favoráveis do que esses. Porém, isso não significa que o caminho até lá seja um mar de rosas, pois o destino humano funciona de forma dialética. Ou seja, quando há aspectos afortunados acontecendo, como é o caso de José Serra, as circunstâncias se tornam mais duras e adversas, justamente para demonstrar a boa fortuna em andamento através da capacidade de administrar essas adversidades com perícia."



Brasil

"Eu me preparei a vida inteira

para ser presidente"



Lunaé Parracho/Ag. A Tarde /O Globo





Figurino de candidato

Com fita do Senhor do Bonfim e chapéu na cabeça, Serra visita Salvador: em Roma, como os romanos



VEJA TAMBÉM

• Nesta edição: Com a casa em ordem,

Serra vai à luta



Aos 68 anos de idade, o economista e ex-deputado, ex-senador, ex-prefeito e ex-governador de São Paulo José Serra parte para a sua segunda tentativa de chegar à Presidência da República. A VEJA, ele falou dos motivos que o levaram a candidatar-se e do país que sonha em construir, caso vença: em síntese, um país que ofereça às pessoas oportunidade de crescimento. Oportunidade que, no caso dele, poderia ter faltado não fossem os esforços do pai, comerciante. "Ele carregava caixas de frutas no Mercado Municipal para que um dia eu pudesse carregar caixas de livros", diz. Foi na sala que abriga alguns deles, parte de uma biblioteca pessoal de 10 000 volumes, que José Serra concedeu a seguinte entrevista.

Por que o senhor quer ser presidente da República?

Porque eu creio que o Brasil pode avançar mais, o Brasil pode mais, e eu me sinto preparado para isso. Eu me preparei a vida inteira para ser presidente.

O senhor sempre teve vontade de ser presidente?

Evidentemente, ser ou não presidente não é uma escolha sua, não depende apenas de uma decisão. Mas, desde a primeira adolescência, sempre tive vontade de me envolver na vida pública. Eu me lembro de um episódio curioso – e não quero aqui parecer pretensioso. Na 4asérie do ginásio, eu tinha um professor de latim que se incomodava e, ao mesmo tempo, se divertia com o fato de eu ser muito barulhento nas aulas. Um dia, ele olhou para mim e disse aos colegas: "Esse aqui, o senhor Serra, vai ser político no futuro, e ele é quem vai mandar. Ele vai mandar em todos vocês aqui". Eu tinha uns 14 anos. Os colegas, claro, ficaram me caçoando, e eu mesmo fiquei embaraçado. Mas o fato é que foi uma observação que eu guardei para o resto da vida.

Desde que o senhor entrou para a vida pública, há alguma convicção que a experiência tenha modificado?

A minha experiência de governo, nos vários governos, me possibilitou conhecer o essencial de diversas áreas e também me ajudou a entender por que, algumas vezes, as coisas não acontecem. Por exemplo: se você deixar a rédea solta, elas não acontecem.

O senhor tem fama de centralizador. De onde ela vem?

Ela é errada. Uma coisa que eu aprendi ao longo das minhas experiências foi descentralizar: formar boas equipes, permitir que os diferentes integrantes tenham liberdade para trabalhar na formação das suas próprias subequipes e também evitar antagonismos. Para mim, é inconcebível a ideia de colocar um sujeito que pensa "x" e trazer outro que pensa "y" para, nessa divisão, eu arbitrar. Isso não existe comigo. Mas eu cobro muito, até porque tenho uma memória praticamente impecável em matéria de ações, de trabalho. E o computador acrescentou uma agilidade à cobrança que antes não dava para ter. Quando eu era ministro da Saúde, durante a noite eu escrevia bilhetes, a mão mesmo, com cobranças para A, B e C. No fim, dava um volume que tinha de ir dentro de uma caixa. Eu grampeava tudo, mandava para a secretária, e ela despachava. Hoje, com o e-mail, você escreve a um secretário: "E aí?". Ou: "E a ciclovia?", por exemplo. Com três palavras você se faz entender. Basta mandar um e-mail desses dia sim, dia não para que, dessa forma, as coisas andem.

Como o senhor pretende orientar a formação de sua equipe ministerial, caso seja eleito?

Eu consegui, na prefeitura e no estado, formar equipes sem indicações de vereadores, de deputados ou de partidos. As pessoas que vieram de outros partidos foram pessoas escolhidas por mim. Não existe isso de "tal setor nomeia tal cargo". Essa vai ser a orientação. Não é que não vai ter político, mas tem de ser um político apto para aquela função.

E como, então, o senhor fará o jogo político? Como fará para ter uma base forte no Congresso?

Através do Orçamento. Ao contrário do que se acredita, 90% das emendas que os parlamentares apresentam são boas. E você pode inclusive orientar. Dizer, por exemplo: "Quem fizer emendas para concluir obras terá prioridade sobre os que fizerem emendas para começar obras". Isso funciona, porque o que o parlamentar quer é aprovar a emenda e satisfazer sua base eleitoral. Não é só no Brasil que é assim, é no mundo inteiro – até nos países mais arrumadinhos. E esse é o melhor caminho para formar a unidade com o Legislativo. Outra coisa importante: nenhum grupo de deputados nomeia diretor de empresa pública. Nenhum. Isso porque, para um deputado, a pior coisa que pode acontecer não é ele não nomear: é o outro nomear e ele não. Tem de ter isonomia.

Quais serão suas prioridades na economia?

Eu tenho claríssima a prioridade que deve ser dada à área produtiva, à indústria. Até algum tempo atrás, vigorou o pensamento de que se deveria estimular só o setor de serviços. Isso é uma bobagem. O Brasil não pode voltar a ser uma economia primária exportadora. Isso não criaria empregos para 200 milhões de pessoas.

Por que os banqueiros gostam de falar mal do senhor?

Se falam, não chegou a mim. Eu acho que é importante para o Brasil ter um sistema financeiro sólido, e batalhei muito por isso. Na Constituinte, havia propostas de proibir bancos com capital estrangeiro de operar no Brasil e até de proibir bancos nacionais – ou seja, queriam liberar apenas os bancos locais. Eu ajudei a derrubar as duas propostas. E estava no governo quando foi feito o Proer, que realmente deu solidez ao sistema financeiro – solidez que permitiu, inclusive,

o enfrentamento da crise atual. Agora, quanto a custos, taxas de juros, essas são questões operacionais de um governo. E aí eu tenho uma visão de que é essencial para o Brasil ter um sistema financeiro que empreste bastante, e empreste a custos suportáveis para as pessoas e para a área privada. Isso é uma meta. Em suma, quero dizer o seguinte: como ajudei a erguer

a mesa, jamais a viraria. As pessoas do sistema financeiro que realmente me conhecem sabem disso.

O senhor, caso seja eleito, vai encontrar um Brasil que avançou na área social, mas que ainda tem carências sérias...

Eu acho que o Brasil avançou muito nos últimos 25 anos. Nós afirmamos uma democracia de massas, com uma Constituição que pode ter os seus problemas, mas que enfatizou como nunca as liberdades civis e políticas. Conseguimos acabar com a superinflação, avançar no combate à pobreza, consolidar o SUS, a inclusão educacional e até retomar o crescimento econômico. Não foi um desempenho brilhante, se você o comparar com o da Índia ou o da China, mas foi um desempenho razoável em relação ao dos países desenvolvidos. Agora, isso significa que as coisas estão resolvidas? Não. No que se refere ao crescimento, nós precisamos de infraestrutura. As carências nessa área são dramáticas e representam um gargalo para o nosso desenvolvimento.

E do ponto de vista da economia?

Há, nesse sentido, um desequilíbrio externo que vem se agravando pelo lado da balança comercial e do déficit em conta-corrente. Claro, nós temos reservas e temos tido entrada de capital, mas nove entre dez economistas se preocupariam com esse crescimento rápido do déficit externo. A eficiência da ação governamental, ou seja, a capacidade de fixar metas e de cumpri-las, é outro dado que preocupa. Ela ainda é baixa no Brasil. O grande loteamento político que foi feito resultou no aparelhamento de toda a esfera do setor público. Em relação às áreas sociais, há uma necessidade desesperada de avançar no campo educacional, no campo da saúde, que semiestagnou, e no campo da segurança – uma área em que, indiscutivelmente, o governo federal tem de se envolver mais. Até porque boa parte do crime organizado no

Brasil se alimenta de armas e drogas que vêm sob a forma de contrabando, e combater isso é uma tarefa essencialmente federal.

No governo estadual, o senhor conseguiu aumentar o investimento e reduzir a relação entre a dívida e a receita, sem elevar impostos. E no governo federal, dá para aplicar a mesma receita?

Não só dá como será feito. O enfrentamento dessa questão se dá, como se deu em São Paulo, pelo aumento da arrecadação via combate à sonegação, e não pelo aumento da carga nominal de impostos. O corte de custos e de desperdícios aqui também teve um papel imenso.

Como é possível cortar gastos no governo federal?

Você revisa o preço de todos os contratos, para começo de conversa. Mas é preciso também ter novas formas de gestão. É crucial introduzir o fator mérito nas remunerações, por exemplo. Isso tem dado certo em São Paulo. A ideia geral é cortar desperdícios, reduzir custos e selecionar

as prioridades. Com isso, você faz mais e melhores investimentos.

O PT tentará transformar esta eleição numa comparação dos governos Lula e Fernando Henrique. Como o senhor vê essa estratégia?

Eu acho que a eleição tem a ver com o futuro, não com o passado. É assim que a população vai julgar. De toda forma, o governo FHC acabou, e agora será julgado pelos historiadores. Assim como os governos anteriores. Assim como o de Lula será julgado um dia, quando o peso do poder dele não mais puder interferir. E aí veremos o que a história dirá de cada um. É espantosa a quantidade de energia que o PT gasta para falar mal do Fernando Henrique. Quando são aliados deles, como o Sarney e o Collor, só elogiam. Quando são adversários, atacam sem limites. Ou seja, não é uma avaliação honesta. É enviesada. Eu fui ministro de FHC e fui aprovado na função. Tanto que depois disso me elegi prefeito de São Paulo e governador de São Paulo. Agora, todos sabem que eu não sou FHC, sou José Serra. Isso parece incomodar o PT, mas é a realidade.

E quanto à reeleição?

O senhor é mesmo contrário a ela? Eu sou contrário. A minha proposta de reforma política incluirá o fim da reeleição no Brasil.

Qual será a prioridade zero do seu governo?

A essência do governo, como orientação para o Brasil, precisa ser a de oferecer uma maior abertura de oportunidades para a população. O povo brasileiro quer é ter oportunidade na vida: estudo, boa saúde, emprego para os jovens, acesso a bens culturais e de lazer. Nasci e fui criado num bairro operário de São Paulo. Eu me lembro de todos os meus amigos, de criancinha ou de adolescente, que não puderam estudar porque tinham de sustentar a família, ou que não tinham ambiente familiar porque o pai era alcoólatra ou eles tinham muitos irmãos... Por que eu consegui estudar e chegar ao que sou, estudando em escola pública? A explicação é muito simples: porque eu era filho único. Se eu tivesse quatro irmãos, como a maioria, quando chegasse ao ginásio, teria de trabalhar para eles poderem ir à escola. Então, o que o povo brasileiro quer não é muito, é oportunidade.

Qual seria a frase que o definiria?

"Na vida, ninguém fracassa tanto quanto acredita nem tem todo o sucesso que imagina", de Joseph Rudyard Kipling, via Jorge Luis Borges. Trata-se de uma reflexão que levo muito em conta – minha vida, aliás, é uma ilustração disso. Tê-la em mente permite que sejamos mais humildes nas vitórias e mais altivos nas derrotas. E há uma frase que complementa essa: "O único limite às nossas realizações futuras são as nossas dúvidas no presente. Vamos adiante com fé", do presidente americano Franklin Delano Roosevelt. Para mim, a política não é a arte do possível, mas a arte de ampliar os limites conhecidos do possível.

Ed Ferreira/AE





Fernando Henrique Cardoso, aclamado na festa do PSDB: "É espantosa a quantidade

de energia que o PT gasta para falar mal dele", diz Serra



Mário Sabino, Thais Oyama e Fábio Portela





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