As mais variadas análises têm sido feitas sobre o Brasil, em relação à crise de 2009, muitas delas favoráveis e outras negativas, todas, entretanto, reconhecendo potencialidade de crescimento superior ao de outros países, dependendo da forma como enfrentará os seus gargalos.
Indiscutivelmente, a imagem do Brasil é, no momento, boa. Não superamos a crise, como se estivéssemos observando uma “marolinha”, mas recebemos o impacto de vagalhões, como bem Roberto Macedo assinalou, em artigo para O Estado de S. Paulo. De longe, porém, a nossa performance foi melhor do que a dos países desenvolvidos, embora inferior à da China e de outros emergentes.
O otimismo empresarial, todavia, manteve-se em alta e, apesar de termos recebido menos investimentos exteriores que a média de todos os países (-49% no Brasil contra -35% no mundo inteiro) e de o déficit das contas externas ter explodido, todos esperamos um 2010 melhor, acreditando que não seremos atingidos por eventual estouro da nova bolha, que se forma na economia mundial.
Em nosso livro A crise financeira internacional , escrito com Paulo Rabello e três economistas portugueses (Fernando Alexandre, João Souza Andrade e Pedro Bação), editado pela Universidade de Lisboa, em Portugal, e pela Lex Editora, no Brasil, ao analisarmos o menor impacto que a crise teve sobre os países emergentes, mostramos que, principalmente no Brasil, o fato de ainda parte substancial dos ativos financeiros das instituições serem títulos do governo, fez com que os fenômenos do subprime e dos derivativos sem lastro terminassem não ocorrendo. Em verdade, porque o Brasil cresceu menos que os outros, atrasou o processo de universalização do buraco financeiro, com o que, quando estávamos para entrar no mesmo esquema e ritmo, a crise estourou sem atingir-nos.
No momento, o Brasil tem alguns indicadores positivos, entre os quais a maior confiança do empresariado, e alguns negativos (redução do superávit primário, aumento considerável das despesas de custeio, carga tributária crescente, déficit nas contas externas recorde, queda no saldo da balança comercial, atraso na evolução do PAC, problemas decorrentes do Plano de “Direitos Humanos”, preconceitos contra o agronegócio e outros), sendo que enfrentará um ano eleitoral.
A meu ver, o tom da campanha definirá as perspectivas para 2010. Se ela se pautar pela volta ao debate da década de 60 (ricos contra pobres ou esquerda contra direita), a mesma desconfiança do empresariado nacional e mundial que está arrasando a economia da Venezuela – por força da desastrosa administração de Chávez – poderá atingir o Brasil, embora nossos anticorpos democráticos sejam incomensuravelmente mais fortes do que os da monoeconomia venezuelana.
Se o debate eleitoral for um debate de proposições, de planos consistentes entre governo e oposição, creio que a confiança do empresariado brasileiro e estrangeiro será fortalecida e, não obstante suas amarras burocráticas, o país crescerá.
Tudo dependerá da forma como caminhar a campanha eleitoral. O próprio presidente Lula há de lembrar-se que, em 2002, atacou de tal forma o FMI, que quase levou ao descompasso a economia brasileira, o que não aconteceu graças ao presidente Fernando Henrique ter conseguido um empréstimo que permitiu ultrapassar a turbulência da campanha, com o compromisso dos quatro candidatos de que o respeitariam. Caso contrário, Lula teria assumido o governo com a economia em crise. Inteligente, todavia, o candidato Lula mudou o seu discurso e, como primeira medida de seu governo, foi convidar Henrique Meirelles para presidente do Banco Central, que continuou rigorosamente a política de seu antecessor.
Espero que o mesmo bom senso da campanha de 2002 ambos os candidatos com maiores possibilidades de vencer o pleito tenham em 2010.
(*) Ives Gandra Martins é professor de direito e escritor.