Delicado foi o Brasil se articular com os bolivarianos para levar a guerra civil a Honduras. O Itamaraty, numa ação concertada com Hugo Chávez e Daniel Ortega, criou meios para a entrada de Manuel Zelaya no país, violando a Constituição do Brasil, a Constituição de Honduras e a Carta da OEA.
Uma embaixada receber um político refugiado em decorrência de disputas políticas é coisa bem diferente de patrocinar o seu retorno ao país, quando a conseqüência dessa volta pode ser a guerra civil.
O fato coincide com a presença de Lula e Amorim em Nova York. É um momento de “protagonismo” do Brasil. O nosso protagonismo consiste em insuflar a guerra civil num país, tomando uma decisão de notável irresponsabilidade.
Ao chamado “governo de fato” de Honduras, Amorim e Lula querem impor a “volta de fato” de Zelaya. Só que há aí uma pequena diferença: o ex-presidente foi deposto por hondurenhos, mas quem quer reinstalá-lo à força no poder é o governo do Brasil — em consonância com os bolivarianos, é claro.
Reinaldo: O nosso protagonismo consiste em insuflar a guerra civil num país, tomando uma decisão de notável irresponsabilidade
Lula está em Nova York e vai falar na Assembléia Geral da ONU. Em seu discurso, vai cobrar o fim do embargo americano a Cuba, uma ditadura odienta, sem pedir qualquer contrapartida aos irmãos Castro. O princípio geral em que se sustenta a tese brasileira é o da autodeterminação dos povos. Pois bem: o país acaba de dar um passo que Celso Amorim certamente classificará de “corajoso”, “ousado” e adjetivos afins: Manuel Zelaya, ex-presidente de Honduras, está abrigado na embaixada do Brasil em Tegucigalpa.
Isso quer dizer que Brasília decidiu entrar para valer na história. O Brasil mergulha de cabeça na política interna de outro país sem ouvir nem mesmo seus parceiros em entidades multilaterais — ONU, OEA ou aquela patética Unasul. Chávez e Daniel Ortega certamente sabiam de tudo e deram o suporte material para o bandoleiro golpista cruzar a fronteira da Nicarágua com Honduras. O Brasil se torna protagonista do conflito. Desta vez, Lula e Amorim foram longe demais.
Uma embaixada receber um político refugiado em decorrência de disputas políticas é coisa bem diferente de patrocinar o seu retorno ao país, quando a conseqüência dessa volta pode ser a guerra civil. Ao chamado “governo de fato” de Honduras, Amorim e Lula querem impor a “volta de fato” de Zelaya. Só que há aí uma pequena diferença: o ex-presidente foi deposto por hondurenhos, mas quem quer reinstalá-lo à força no poder é o governo do Brasil — em consonância com os bolivarianos, é claro.
Notem que o fato coincide com a presença de Lula e Amorim em Nova York. É um momento de “protagonismo” do Brasil. O nosso protagonismo consiste em insuflar a guerra civil num país, tomando uma decisão de notável irresponsabilidade. Tanto pior se descobrirmos que se tratou de uma ação concertada seja lá com quem for, incluindo-se aí o governo americano. Nesse caso, o Brasil teria se oferecido para fazer o serviço sujo. Pesem bem: qual seria o passo seguinte? Uma intervenção armada?
Trata-se de mais um passo da asquerosa política externa brasileira, levada a efeito por Celso Amorim. Não é por acaso que seus subordinados, no Itamaaty, só se referem a ele, reservadamente, como “Megalonanico”.
O Brasil se articulou com os bolivarianos para levar a guerra civil a Honduras
Delicado foi o Brasil se articular com os bolivarianos para levar a guerra civil a Honduras. Já se sabe que o avião que conduziu Zelaya ao país é venezuelano (alguma surpresa?) e partiu da Nicarágua, com um pouso supostamente não-autorizado em El Salvador.
Zelaya, um mentiroso compulsivo, disse ter chegado à embaixada no porta-malas de um carro! Pobrezinho! Ocorre que, com ele, chegaram nada menos de 60 pessoas. Uma operação, como se vê, discreta…
É bem possível que o governo hondurenho ficasse mais ou menos de olho nas imediações de algumas embaixadas, mas não da brasileira. A tresloucada ação do Brasil é contrária à tradição da nossa diplomacia. Ainda que o governo brasileiro viesse tendo um comportamento detestável nesta crise, ninguém esperava que ele pudesse se unir a Hugo Chávez para levar Zelaya de volta a Honduras.
O Itamaraty, numa ação concertada com Chávez e Ortega, criou meios para a entrada de Zelaya, violando a Constituição do Brasil, a Constituição de Honduras e a Carta da OEA
O Brasil não reconhece o governo de Honduras. Muito bem. É parte do jogo e do concerto das nações. Este não-reconhecimento tem graus e vai da suspensão de qualquer cooperação até o fechamento da embaixada, com a retirada de todo o corpo diplomático. Mas aquilo a que se assiste em Tegucigalpa é outra coisa: o Itamaraty, numa ação concertada com Hugo Chávez e Daniel Ortega, criou meios para a entrada de Manuel Zelaya no país, violando a Constituição do Brasil, a Constituição de Honduras e a Carta da OEA. Já demonstrei isso. Mas o bolivarianinho Celso Amorim achou pouco: permitiu que Manuel Zelaya usasse as dependências da embaixada para convocar os seus seguidores para a “resistência”.
Embora fale em nome da “paz”, o apelo do bandoleiro deposto não descarta a guerra civil: “Pátria, restituição ou morte”. Lula e Amorim usam a pobre Honduras de forma miserável para exibir seus músculos (santo Deus!!!) e esperam que os hondurenhos tenham o juízo que eles não têm. Afinal, que compromisso o chamado “governo de fato” pode ter com a inviolabilidade da embaixada do Brasil se é considerado um “fora-da-lei”? [1]
A esquerda carnívora uniu-se à esquerda herbívora
“Creio que, no momento, tudo que se pode dizer é reiterar nosso pedido diário para que ambas as partes desistam de ações que tenham um desenlace violento”, afirmou Ian Kelly, porta-voz do departamento de Estado dos EUA. E, então, chegamos ao problema.
Os americanos já perceberam — e vai demorar bastante tempo até que a opinião pública mundial se dê conta — que Barack Obama como “líder” do Ocidente é uma piada. Poderíamos supor que a ação do eixo Lula-Chávez-Ortega contou com a bênção dos EUA. Não faltará quem vá buscar indícios de que a Casa Branca sempre esteve no controle. Bobagem! O governo americano foi surpreendido pelo protagonismo da esquerda carnívora (Chávez e Ortega) unida à esquerda herbívora (Lula).
Tenho me correspondido com hondurenhos. Não há menor a possibilidade de Zelaya governar o país a não ser com leis de exceção. Seus únicos apoios são sindicatos dominados por grupelhos de esquerda. Os EUA já tinham se dado conta disso e contavam empurrar a situação com a barriga até novembro, quando há eleições. Mas não deixaram claro que uma ingerência nos assuntos internos de Honduras era inaceitável. Então os lobos e os ruminantes entraram em ação. Tudo debaixo do queixo de estátua de Obama. Se a opinião pública ainda não percebeu que ele é fraco, hesitante, colegial, os governos já entenderam tudo. Pode passar a mão no joelho do rapaz, que a reação indignada virá umas 48 horas depois.
Lula e Amorim jogam no lixo Constituição do Brasil
Reitero: uma coisa é o Brasil abrigar na embaixada perseguidos políticos (para usar uma expressão genérica); outra, distinta, é patrocinar a volta de uma liderança, pouco importa quem seja, imiscuindo-se na realidade interna de um país. A ação de Lula e Celso Amorim viola também o artigo 4º da nossa Constituição:
Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:
I - independência nacional;
III - autodeterminação dos povos;
IV - não-intervenção;
VII - solução pacífica dos conflitos.
Lula e Amorim jogam Carta da OEA na lata do lixo
A ação do Brasil em Honduras, conte lá com a concordância de quem for, agride de maneira frontal, clara, inequívoca e inquestionável a Carta da Organização dos Estados Americanos (OEA). A íntegra está aqui. Leiam, por exemplo, o que segue:
A Organização dos Estados Americanos não tem mais faculdades que aquelas expressamente conferidas por esta Carta, nenhuma de cujas disposições a autoriza a intervir em assuntos da jurisdição interna dos Estados membros. [Artigo 1]
Um cínico poderia dizer que o que vai acima não se aplica mais a Honduras porque ela foi suspensa da OEA. Pois é… Cuba também não pertence à organização. Algum país se atreveria a fazer o mesmo com a ilha, a saber: abrigar de maneira clandestina uma liderança de oposição ao governo de Raúl Castro?
Sigamos com a Carta da OEA:
Todo Estado tem o direito de escolher, sem ingerências externas, seu sistema político, econômico e social, bem como de organizar-se da maneira que mais lhe convenha, e tem o dever de não intervir nos assuntos de outro Estado. Sujeitos ao acima disposto, os Estados americanos cooperarão amplamente entre si, independentemente da natureza de seus sistemas políticos, econômicos e sociais. [Artigo 3, e]
O artigo 9 da Carta prevê a reação caso um governo democrático seja deposto. Vocês sabem que não considero que tenha sido o caso do bandido Manuel Zelaya. Mas digamos que fosse. Que papel está reservado aos membros da OEA? Leiam a íntegra do artigo 9:
Um membro da Organização, cujo governo democraticamente constituído seja deposto pela força, poderá ser suspenso do exercício do direito de participação nas sessões da Assembléia Geral, da Reunião de Consulta, dos Conselhos da Organização e das Conferências Especializadas, bem como das comissões, grupos de trabalho e demais órgãos que tenham sido criados.
a) A faculdade de suspensão somente será exercida quando tenham sido infrutíferas as gestões diplomáticas que a Organização houver empreendido a fim de propiciar o restabelecimento da democracia representativa no Estado membro afetado;
b) A decisão sobre a suspensão deverá ser adotada em um período extraordinário de sessões da Assembléia Geral, pelo voto afirmativo de dois terços dos Estados membros;
c) A suspensão entrará em vigor imediatamente após sua aprovação pela Assembléia Geral;
d) Não obstante a medida de suspensão, a Organização procurará empreender novas gestões diplomáticas destinadas a coadjuvar o restabelecimento da democracia representativa no Estado membro afetado;
e) O membro que tiver sido objeto de suspensão deverá continuar observando o cumprimento de suas obrigações com a Organização;
f) A Assembléia Geral poderá levantar a suspensão mediante decisão adotada com a aprovação de dois terços dos Estados membros; e
g) As atribuições a que se refere este artigo se exercerão de conformidade com a presente Carta.
Atenção! O artigo veta explicitamente a ação brasileira no item mais aparentemente anódino: o “g”. A pressão dos demais membros tem de ser feita “em conformidade com a Carta”. E isso implica que um país não interfira na realidade interna do outro — e o Brasil está interferindo de maneira óbvia.
Agora leiam o artigo 19:
Nenhum Estado ou grupo de Estados tem o direito de intervir, direta ou indiretamente, seja qual for o motivo,nos assuntos internos ou externos de qualquer outro. Este princípio exclui não somente a força armada, mas também qualquer outra forma de interferência ou de tendência atentatória à personalidade do Estado e dos elementos políticos, econômicos e culturais que o constituem.
A intervenção do Brasil, como notam, nada tem de “indireta”. É direta mesmo. A expressão “seja qual for o motivo” exclui qualquer desculpa que o governo brasileiro possa dar. Amorim e Lula jogam no lixo a carta da OEA.
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* Excertos de comentários postados por Reinaldo Azevedo em seu blog.
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NOTA DE SACRALIDADE:
[1] Nota do governo hondurenho dirigida à embaixada brasileira:
“É inaceitável para o Governo da República a conduta de tolerância da embaixada brasileira, ao permitir que se formulem chamados públicos à insurreição e à mobilização política por parte do senhor José Manuel Zelaya Rosales, fugitivo da Justiça hondurenha”, assinala uma nota do governo Micheletti dirigida è embaixada brasileira, divulgada pela chancelaria hondurenha. “Tal ingerência nos assuntos privados dos hondurenhos é condenável e por tal motivo se protesta de maneira enérgica”, pois isso “constitui uma flagrante violação do direito internacional”, acrescenta. (OESP)
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