O jornalista Antonio Lisboa, em seu artigo no Diário da Manhã, me atribuiu interesses inconfessáveis. Mas, quem não os terá, pergunto eu. Talvez aquele que tenha uma moral mais pusilânime. De qualquer forma, foi sobre desejos inconfessáveis, e reprimidos, que Sigmund Freud erigiu toda uma obra monumental. A Psicanálise, por sinal, é uma atividade que dispensa diplomas. Um jornalista poderá exercer a psicanálise desde que estude com afinco e demonstre denodo no exercício da profissão. Assim, conseguirá reconhecimento e respeito de seus pares, de modo que surgirão tantos clientes em seu consultório quantos cogumelos após a chuva.
Jamais passou pela cabeça de Freud restringir a prática da psicanálise aos graduados em medicina (sendo ele próprio um médico). Aliás, sempre demonstrou temor a que os médicos pudessem, de alguma forma, deturpar o seu legado, aprisionando-o nos grilhões dos interesses classistas. Admito que apenas personalidades com a estatura moral de um Freud são capazes de se despir dos corporativismos tacanhos, bem como revelar os desejos mais impublicáveis.
O jornalista argumenta como óbvio que o declínio da profissão é inevitável quando ausente o pré-requisito do diploma. Pois bem. Apresenta-se um “papel pintado”, e num passe de mágica a qualidade estará garantida. Como se a mera ostentação do diploma fosse atestado de excelência... Se for verdade, as faculdades de jornalismo deveriam colar o selo do IMETRO no canudo.
Mas o óbvio é que o mercado de trabalho se configura como o instrumento mais eficiente na seleção de profissionais capacitados, sejam eles diplomados ou não. A sobrevivência institucional de qualquer empresa, inclusive no ramo das comunicações, deve-se à qualidade dos serviços que presta, pois é desta virtude que retirará seus lucros. Empresas que contratam jornalistas incompetentes e ineptos – e repito, com ou sem diploma – estão fadadas ao mais vexaminoso fracasso editorial. Daí ser mais do que justo dar-lhes a plena liberdade de contratarem quem bem entender. Na França, por exemplo, é considerado jornalista todo aquele que tira maior parte de seus proventos desta atividade. Não há, portanto, que se falar em diploma. Talvez a França seja um país de insanos, ou talvez aquele que me critica seja o dono da verdade.
Embora tenha me atribuído o uso de chavões, o nobre articulista também não resistiu e tirou um da própria manga, insinuando que os “patrões”, quando supostamente preferem jornalistas sem nível superior, estariam imbuídos do propósito de “adestrá-los” ideologicamente. Não chegou ao meu conhecimento de uma só pessoa que tenha defendido a tese de que jornalistas não devem possuir nível superior, mas tão-somente que tal profissão não estivesse condicionada a obrigatoriedade do diploma de jornalismo. Poderão exercê-la economistas, sociólogos, médicos e, inclusive, bacharéis em comunicação social. Isso é o mais próximo de uma meritocracia que se pode chegar.
Ademais, é bom que se diga que ensino superior nunca foi vacina contra ideologismos, como foi alegado. Ao contrário, esquece o articulista que as universidades de hoje se tornaram uma verdadeira indústria do adestramento ideológico, no qual os alunos saem tagarelando o mais tosco discurso esquerdizante.
De resto, a comparação entre jornalismo e medicina é completamente obtusa. Eu, por exemplo, não entregaria minha mãezinha aos cuidados de um médico sem diploma, pois sua vida depende da própria saúde, e qualquer barbeiragem, nesse particular, seria fatal. Então, é justo que o Estado exija uma qualificação mínima para o exercício dessa profissão. O mesmo, entretanto, não se dá com a profissão de jornalista, cuja principal manufatura é a informação. É verdade que se faz necessária uma ética no exercício desse mister, mas não há razões suficientes para se exigir qualquer documento que comprove perícia, a exemplo da medicina. Quanto à exigência de ética aludida, podemos afirmar que o diploma nunca foi recibo de conduta honesta. Portanto, já se vê por aqui quem faz uso de impropriedades...
Continuo achando que a regulamentação da profissão não passa pela exigência do diploma; e se esse raciocínio parece singelo ao meu interlocutor, é porque todas as verdades são mesmo singelas, enquanto os erros são sempre infinitos e acabam em confusão mental. Mas vou dar uma ajudinha. Digo de antemão que todo aquele que trabalha com jornalismo – e insisto, com ou sem diploma – estará sujeito às regras estabelecidas para o exercício da profissão. Simples assim.
(*) Luciano Porciuncula Garrido é Psicólogo, Policial e Especialista em Segurança Pública.