A privatização das telecomunicações brasileiras completa 10 anos nesta terça-feira. A data sugere um balanço setorial. No dia 29 de julho de 1998, o Brasil só contava com 5,5 milhões de celulares em serviço. Hoje são 133,1 milhões - um crescimento de 2.300%. Nesse mesmo período, o número de linhas fixas mais do que dobrou, passando de 19 milhões para 40 milhões. A soma de acessos (telefones) fixos e móveis alcançava 24,5 milhões. Hoje são 173 milhões. O número de usuários de internet, que era de 1,4 milhão, hoje ultrapassa 40 milhões. O indicador mais significativo do ponto de vista social, a densidade telefônica, saltou de 17 acessos por 100 habitantes para 93 por 100. Em dois anos, o País terá mais telefones do que gente.
Em 1998, a infra-estrutura de telecomunicações do País era defasada e insuficiente. Ao longo de 25 anos, o Sistema Telebrás investiu uma média de R$ 3,5 bilhões por ano, enquanto as operadoras privatizadas elevaram essa média anual para R$ 17 bilhões, nos últimos 10 anos, sem incluir os R$ 40 bilhões pagos pela aquisição do controle e das 28 subsidiárias do Sistema Telebrás e pelas licenças de telefonia fixa e celular.
Só a iniciativa privada poderia aportar esse volume de investimentos às telecomunicações do País - que são hoje praticamente o único setor de infra-estrutura que não traz nenhuma preocupação quanto à demanda futura, mesmo que o País venha a crescer a taxas muito superiores a 5% ao ano.
Compare, leitor, a disponibilidade e a qualidade de serviços de telecomunicações com as de outras áreas - como energia, estradas, aeroportos, saúde, educação, previdência ou segurança -, verdadeiros gargalos ou freios do desenvolvimento nacional.
O QUE FALTA
Esse cenário positivo não significa que tudo vá às mil maravilhas nas telecomunicações. Absolutamente, não. O modelo privatizado precisa de constante aperfeiçoamento institucional. O governo do PT - partido que, no passado, combateu radicalmente a privatização das telecomunicações - não tem feito qualquer esforço para aprimorar o modelo. Pelo contrário.
Esse aprimoramento deveria envolver cinco grandes temas:
1) o fortalecimento da Anatel;
2) a unificação da legislação setorial, com a elaboração da Lei Geral de Comunicações (integrando todas as áreas cobertas pelo Ministério das Comunicações);
3) qualidade do serviço e, em especial, o padrão de atendimento do usuário pelas concessionárias e prestadoras de serviços em geral;
4) estímulo à competição;
5) incentivo à universalização de serviços, muito além da telefonia básica.
Comecemos pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).
Em qualquer país, uma das condições essenciais para o sucesso do modelo privatizado é contar com agências reguladoras fortes, política e financeiramente independentes, altamente profissionalizadas e dotadas dos recursos técnicos adequados.
Quase nenhum apoio tem sido dado no governo Lula com vistas ao fortalecimento das agências reguladoras, a começar pela Anatel. Pelo contrário, o governo tem feito tudo para enfraquecê-las politicamente, em especial com a indicação e nomeação de pessoas profissionalmente menos qualificadas para dirigi-las. Uma honrosa exceção foi a escolha do embaixador Ronaldo Sardenberg para a presidência da Anatel.
LEGISLAÇÃO
O segundo aspecto negligenciado pelo governo é o do aprimoramento do modelo institucional como um todo. Caberia ao governo Lula continuar o processo de reestruturação do marco legal das Comunicações, modernizando e adequando a legislação dos demais segmentos - como radiodifusão (rádio e TV), correios e comunicação eletrônica de massa.
A terceira área em que as coisas ainda precisam melhorar, e muito, é a da qualidade do atendimento do usuário. Embora tenha hoje à sua disposição muito mais canais para encaminhamento de suas reclamações - como a legislação, a Anatel, o Procon, a mídia e a própria Justiça -, o usuário merece muito maior respeito e atenção das operadoras, em especial nos call centers.
Uma quarta área em que há necessidade de maior empenho do governo federal é o estímulo à competição. Embora o grau de concorrência seja bastante satisfatório no segmento de telefonia celular e telefonia de longa distância, o mesmo não acontece em telefonia fixa local. E, para surpresa geral, o governo Lula apóia e estimula a redução do número de concessionárias - como no caso da aquisição da Brasil Telecom pela Oi, com enorme participação de capital estatal e financiamento de bancos públicos.
ACESSO
Finalmente, um objetivo que deveria merecer maior atenção do governo é a universalização dos serviços - com a utilização do Fundo de Universalização das Telecomunicações (Fust) e dos bilhões excedentes do Fundo de Fiscalização das Telecomunicações (Fistel) e outros, dando prioridade a segmentos como telecomunicações rurais, informatização das escolas, com o uso intensivo de banda larga e internet de alta velocidade.
Que seria do Brasil hoje se ainda dependesse do velho Sistema Telebrás?