Bispos encaminham o País para a luta de classes e a revolução social?
Conselho Permanente da CNBB declara a Reforma Agrária necessária e quer impor ao País um novo tipo de estrutura fundiária, numa indevida intromissão em assuntos temporais
Marcha do MST, iniciada em Goiânia rumo a Brasília (nov./2003), para pressionar a aprovação do PNRA
O Brasil assiste nestes dias a uma ampla e inquietante articulação de forças da esquerda agro-reformista, que visa impor uma radical transformação no ponto mais vital de nossa organização sócio-econômica, a estrutura agrária do País.
Os jornais têm falado de um novo Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA). A julgar por indícios colhidos na própria imprensa — pois o teor do Plano vem sendo estranhamente mantido em sigilo — o direito de propriedade será atingido a fundo; os critérios de desapropriação (ou melhor, confisco) se basearão no fluido conceito de “função social”; a exploração das terras será coletiva como nos kolkhozes; os assentados, pressionados a se incorporarem a cooperativas dirigidas pelo MST ou por prepostos governamentais, serão reduzidos à condição de vítimas de um socialismo agrário, que só encontra atualmente paralelo na Cuba de Fidel Castro.
Apoios ao PNRA: a CNBB e a marcha dos “sem-terra”
Apesar de seu conteúdo ainda sigiloso, o referido PNRA já começa a receber calorosos apoios das forças mais engajadas no agro-reformismo socialista e confiscatório.
Alguns dos chamados “movimentos sociais” (Comissão Pastoral da Terra-CPT, MST e congêneres) iniciaram uma marcha de Goiânia a Brasília, a qual almeja ser recebida pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e tem como objetivo fazer “pressão” sobre o governo para que aplique com urgência o PNRA, sem que haja um debate nacional com todos os interessados.
Mas o apoio mais expressivo partiu da CNBB, em Nota de seu Conselho Permanente (31-10-2003). A par dessa Nota, altas figuras eclesiásticas publicaram artigos na grande imprensa, glosando o texto da mesma: D. Luciano Mendes de Almeida, Arcebispo de Mariana, na “Folha de S. Paulo” (1-11-2003) e D. Cláudio Hummes, Cardeal-Arcebispo de São Paulo, em “O Estado de S. Paulo” (12-11-2003).
A CNBB — a qual de há muito se tornou a mais influente força propulsora agro-igualitária do País — antevendo prováveis reações ao PNRA, procura mobilizar a favor deste o prestígio histórico da Igreja e toma assim a dianteira na drástica transformação sócio-econômica a ser imposta ao Brasil.
A caminho de uma república clerical?
Miguel Rossetto, Ministro da Reforma Agrária: `A CNBB é nossa parceira nessa questão`
Chama a atenção que os signatários da Nota da CNBB afirmem receber “com satisfação a notícia de que o Governo pretende lançar brevemente o novo PNRA”. Ora, tal PNRA ainda é sigiloso. Estariam os Srs. Bispos precipitadamente comprometendo sua autoridade moral em relação a um plano que nem sequer conhecem, dando-lhe assim uma espécie de cheque em branco? Ou será que a CNBB esteve envolvida na preparação do dito PNRA? Ou quiçá até seja co-autora dele?
Difícil saber. O certo é que causou espécie no público o fato de a Nota da CNBB ter sido divulgada no dia seguinte a uma reunião de Cardeais, Arcebispos, Bispos e Sacerdotes na residência do Sr. José Sarney, presidente do Senado, com 19 senadores, diversos outros políticos e o próprio Presidente Lula, reunião na qual, segundo o noticiário, se tratou largamente da Reforma Agrária.
Tudo parece, pois, apontar para um pacto agro-reformista entre o atual governo e a CNBB. É a própria Nota episcopal que afirma ter “enorme relevância a estreita integração entre o Mutirão da CNBB pela superação da Miséria e da Fome, o projeto Fome Zero e o Plano Nacional de Reforma Agrária”. No mesmo sentido vão as palavras do Ministro da Reforma Agrária, Miguel Rossetto: “A CNBB é nossa parceira nessa questão” (“Folha de S. Paulo”, 1-11-2003).
Estaremos assim a caminho de uma república clerical, à maneira do regime dos aiatolás, em que o Alcorão seria substituído pela Teologia da Libertação, o novo “evangelho” da “esquerda católica”?
João Paulo II e a Reforma Agrária
Em 1960, Mons. Helder Câmara, então Secretário-geral da CNBB, já favorecia um projeto socializante de revisão agrária
A Nota da CNBB faz alusão vaga a declarações de João Paulo II a respeito da Reforma Agrária, insinuando dessa forma um endosso pontifício à posição agora assumida. Mas, além de serem as citadas alusões de si inteiramente inconclusivas, a que tipo de Reforma Agrária se teria referido o Sumo Pontífice? A uma Reforma Agrária de caráter socialista e confiscatório? Não parece, pois seus ilustres predecessores condenaram largamente o socialismo e o comunismo e enalteceram a propriedade privada. Seria fazer injúria ao Santo Padre supor ter ele uma doutrina pessoal diferente.
Ademais, não é verossímil a hipótese de que João Paulo II quisesse pronunciar-se a respeito dos aspectos técnico-temporais implicados na questão da Reforma Agrária brasileira, uma vez que estes estão fora do alcance de sua missão espiritual, tão mais elevada. Ora, são exatamente esses aspectos técnicos, aliás muito complexos, que há décadas, e ainda agora, dão a tônica da controvérsia em torno da Reforma Agrária no Brasil.
Em sentido bem diverso da Nota dos Srs. Bispos, afirmou ainda recentemente o Pontífice que “para alcançar a justiça social se requer muito mais do que a simples aplicação de esquemas ideológicos originados pela luta de classes como, por exemplo, através da invasão de terras — já reprovada na minha Viagem Pastoral em 1991 — e de edifícios públicos e privados, ou, por não citar outros, a adoção de medidas técnicas extremas, que podem ter conseqüências bem mais graves do que a injustiça que pretendiam resolver” (discurso de 26-11-2002 a Bispos brasileiros em visita “ad limina” a Sua Santidade).
Intromissão indevida em assuntos temporais
D. Geraldo Magella Agnelo, Presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB)
Todo católico reconhece que a missão de ensinar autenticamente a Moral cristã compete, na Igreja, à Sagrada Hierarquia. Em conseqüência, a voz dos Bispos deve ter normalmente uma influência determinante sobre a atitude dos católicos face aos aspectos morais implicados na controvérsia agro-reformista. Sempre suposto, é claro, que se situe em consonância com os ensinamentos pontifícios e a Tradição bimilenar da Igreja.
Porém, quando se trata de aspectos técnicos e materiais, a opinião dos Bispos, embora merecendo respeito pela alta condição eclesiástica de quem a emite, de modo algum faz autoridade, nem se pode exigir para ela uma atenção diferente daquela dada ao parecer de um mero particular não especializado.
Ora, a Nota da CNBB pressupõe uma análise de aspectos da situação econômica nacional e da agricultura brasileira, de caráter técnico, que está fora da alçada de sua missão espiritual. Os católicos brasileiros têm, portanto, todo o direito — e até o dever — de discordar respeitosamente da visão economicista-marxista da CNBB, bem como das soluções por ela propugnadas. Essa atitude dos católicos, é bom frisar, de nenhum modo infringe o Direito Canônico, o qual reconhece aos leigos uma legítima autonomia em matérias temporais (cfr. câns. 215, 225, 227 e outros).
Reforma Agrária: insistência obsessiva por uma falsa solução
A Nota do Conselho Permanente da CNBB baseia-se numa apreciação gravemente deturpada da realidade sócio-econômica nacional, afastada de uma visão sensata e cristã. Tal realidade, sem ser ideal, por certo não se identifica com o quadro de pesadelos a que costuma aludir a “esquerda católica”, como pode constatar qualquer brasileiro ao percorrer as imensas vastidões de nosso País.
Por outro lado, a Nota dos Bispos silencia inexplicavelmente dados fundamentais da questão agrária. Relega ao olvido, por exemplo, os notórios fracassos das repetidas experiências agro-reformistas, que não fizeram senão criar favelas rurais no campo brasileiro. E omite igualmente os extraordinários avanços e o êxito crescente de nossa agro-pecuária, fundada na propriedade privada e na livre iniciativa, com evidente vantagem para o bem comum da Nação.
Ora, a simples constatação desses fatos contraria de si a política agro-reformista onímoda e açodada que, numa atitude não isenta de agressividade, a CNBB quer impor ao País.
Mesmo supondo que os problemas apontados pela Conferência Nacional dos Bispos tivessem a dimensão que a entidade lhes atribui, que provas ela apresenta para afirmar que a Reforma Agrária “constitui um instrumento privilegiado de inclusão social”? Quais as garantias do acerto dessa medida tão drástica e tão grave cuja aplicação a CNBB quer já e já? Nenhuma...