HISTÓRIA OFICIAL: Declarações de Tarso Genro provocam reações conflitantes de militares e ex-militantes políticos (GL, 17Mai08)
`A Lei da Anistia foi feita para os dois lados`
Presidente do Clube Militar diz que, se acusados de tortura forem julgados, o mesmo deve ocorrer com ex-guerrilheiros
SÃO PAULO. O Clube Militar defendeu ontem que o governo "escancare" os arquivos secretos da ditadura, mostrando também supostos crimes cometidos por membros da cúpula do atual governo que militaram contra o regime. Os militares também avaliaram que, se ocorrer uma reinterpretação da Lei da Anistia, de 1979, deverão ser punidos também acusados de terrorismo e assassinatos na época.
As declarações do general da reserva Gilberto Figueiredo, presidente do Clube, foram uma resposta ao ministro Tarso Genro (Justiça) e ao Ministério Público Federal, que defendeu o julgamento de torturadores e chefes dos órgãos de repressão. Tarso avaliou que a Lei da Anistia, de 1979, não protege os crimes de tortura, prática que também era criminosa durante o regime militar.
- Alguns colegas de governo do ministro também cometeram crimes hediondos durante o regime. A Lei da Anistia foi feita para os dois lados e é um assunto superado. Agora, se houver uma revisão, ela terá que valer para os dois lados - disse o general da reserva.
Figueiredo afirmou ainda que a abertura dos arquivos secretos do regime não encontra mais resistências entre os militares:
- Não sei por que não abrem os arquivos. É preciso abrir, sim, escancarar tudo. Tenho conversado com outros militares e não vemos motivos para não escancará-los. Mas é preciso escancarar tudo mesmo, porque quando isso for feito, os militares serão os menos atingidos. Se abrir, quem mais terá a perder são os do outro lado, que cometeram assassinatos, terrorismo e muitos crimes. E muitos estão no governo - disse o presidente do Clube, depois de frisar que o ministro fez tais declarações para desviar o foco das atenções de outros problemas do governo, como os conflitos em Raposa Serra do Sol e o caso do dossiê da Casa Civil.
Especialista diz que momento é de reavaliação
`Quando documentos vierem à tona, trarão muitas dores`
SÃO PAULO. A estabilidade jurídica que paira no Brasil em torno da Lei da Anistia, desde 1979, está em xeque, segundo avaliação do professor Eliezer Rizzo de Oliveira, especialista em Forças Armadas e pesquisador do Núcleo de Estudos Estratégicos da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas). Segundo ele, configura-se um novo quadro na História, depois da transição política do pós-ditadura militar.
- A estabilidade em torno do assunto está realmente em questão pela primeira vez, porque está sendo colocada por poderes estabelecidos. São declarações de pelo menos três ministros (Tarso Genro, da Justiça, Paulo Vannuchi, dos Direitos Humanos e Nelson Jobim, da Defesa e ex-presidente do STF) e agora do Ministério Público.
Para o especialista, está evidente que a interpretação da Lei da Anistia será contestada nos tribunais por ambas as partes: civis e militares.
- Nunca foram registradas tantas iniciativas - disse, lembrando que há dois processos que pedem o reconhecimento de torturadores.
E defendeu a abertura:
- Pessoalmente sou defensor da abertura dos arquivos, pois temos direito à nossa própria história. Talvez o momento seja propício, pois há mais maturidade política e as Forças Armadas não chegam a significar impedimento, pois têm boa relação com a democracia.
Para o especialista, civis e militares precisam refletir sobre as mudanças em questão:
- Quando os documentos vierem à tona, trarão muitas dores. Tanto para os fardados quanto para os civis.