O Editorial abaixo, assinado pelo Presidente do Clube, estará na próxima Revista e já se encontra no nosso Site.
CLUBE MILITAR - 120 ANOS DE HISTÓRIA
GILBERTO BARBOSA DE FIGUEIREDO (*)
Vivemos, todos nós que pertencemos ao Clube Militar, um mês muito especial em junho de 2007. Nossa associação comemorou, no dia 26, cento e vinte anos de gloriosa existência. Anos de muita luta, muita determinação, muitas conquistas, de participação efetiva em casos relevantes da história pátria. Celebramos um marco relevante na vida de um clube revolucionário, usando as palavras do Coronel Ernesto Caruso, em artigo publicado neste número de nossa revista.
A fundação do Clube, em si, constituiu-se em importante fato histórico, uma ação empreendida por homens determinados, gerada no turbilhão de episódios que marcaram a história brasileira, no final do século XIX, e que estaria fadada a produzir marcas sensíveis na vida política nacional.
Entre os incidentes que influíram na fundação do Clube Militar, nenhum, acredito, tenha exercido papel mais ponderável do que a Questão Militar, uma seqüência de ocorrências, entre 1884 e 1886, que colocou em oposição oficiais do Exército e políticos monarquistas. O pano de fundo era o ressentimento dos militares ante a indiferença com que eram tratados pela classe política, após o término da Guerra da Tríplice Aliança, quando arriscaram suas vidas pelo país. O primeiro incidente ocorreu com o Tenente Coronel Senna Madureira, então comandante da Escola de Tiro de Campo Grande, ao ser punido e transferido para a Escola Preparatória de Rio Pardo (RS), quando organizou uma recepção festiva ao jangadeiro Francisco do Nascimento, que se recusou a transportar escravos em Fortaleza.
Estavam os militares, à época, proibidos por lei de discutir assuntos políticos na imprensa. Senna Madureira, no entanto, contestou decisão do Ministro da Guerra Franco de Sá, através do jornal republicano “A Federação”, dirigido por Júlio de Castilhos, para defender “sua honra militar”. Estava detonada a crise.
Em setembro de 1886, o próprio Castilhos tratou de colocar um pouco mais de pólvora no barril da crise ao publicar, em seu jornal, um artigo chamado "Arbítrio e Inépcia", atacando a Coroa, dando visibilidade nacional à "Questão Militar". No artigo, o Exército era apresentado como a única força que se mantinha "impoluta" em uma "nação em ruínas".
O resultado todos conhecem. O Marechal Deodoro, Presidente em exercício da Província do Rio Grande do Sul, decidiu não punir Senna Madureira. Foi exonerado da presidência e transferido para o Rio de Janeiro. Ao chegar ao Rio, em 26 de janeiro de 1887, junto com Senna Madureira, foram ambos recebidos como heróis pelos cadetes da Escola Militar da Praia Vermelha. Em maio do mesmo ano, o Ministro da Guerra Alfredo Chaves caiu, Deodoro e Senna Madureira foram anistiados por D. Pedro II e a questão militar chegou a seu final. Foi, em nossa história, a primeira vez em que os militares mostraram ser possível apresentarem-se à sociedade como grupo coeso – como uma autêntica “classe militar”. A conseqüência imediata foi a fundação do Clube Militar, alguns meses após.
Esse é o ângulo através do qual temos de encarar o Clube Militar. Algo nosso, que deve representar nossos valores, nossos ideais, defender nossos interesses e os interesses maiores da pátria. Há uma profunda necessidade do ser humano em se associar para mais facilmente obter a satisfação de suas necessidades. Nas sociedades modernas, particularmente nas mais desenvolvidas, proliferam associações de todos os tipos, desde as recreativas e culturais, até as representativas de classe. Isso representa algo imprescindível para o próprio desenvolvimento de uma democracia que cultive eqüidade nas oportunidades de seus cidadãos. Cito um trecho de Aléxis Tocqueville , autor de “A democracia na América”: “Entre as leis que governam o destino das sociedades humanas há uma que parece mais precisa e nítida que as outras. Para que os homens se tornem ou permaneçam civilizados, é necessário que a arte da associação cresça e se aperfeiçoe na mesma razão em que aumenta a igualdade de condições”.
Assim entendo o nosso Clube. Uma associação que, ao longo do tempo, foi partícipe de episódios importantes da história brasileira como na Abolição da Escravatura, na Proclamação da República, na questão do petróleo e na Contra-revolução de 1964, apenas para citar alguns. Uma associação que precisa continuar atenta e vigilante, propugnando comportamento ético para nossos homens públicos, defendendo a dignidade da classe militar, hoje tão constrangida com escândalos em série, cortes em orçamentos e salários aviltados.
(*) O autor é General-de-Exército e Presidente do Clube Militar