Mídia Sem Máscara entrevista o Padre Luiz Carlos Lodi - 2a Parte
por Gerson Faria em 18 de maio de 2007
Resumo: Na segunda parte da entrevista com o Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz, da Diocese de Anápolis - GO, ele explica as diferenças entre a legislação americana e a brasileira sobre aborto, mostra que só é possível defender o aborto por meio da mentira intensiva e opina sobre a onda pró-abortista que assola o país.
MSM: A decisão da Suprema Corte do Estados Unidos de 1973, no caso Roe v. Wade, tornou o aborto na América legal ou não? Ou é um caso como no Brasil, de “crime não punível”?
Pe. Lodi: A decisão Roe versus Wade é muito pior do que a não aplicação de pena a um crime. A Suprema Corte dos EUA declarou, por sete votos contra nove, que toda mulher tem o direito de exterminar sua prole, por qualquer motivo, nos dois primeiros trimestres de gestação. No terceiro trimestre, ela continua a ter esse direito desde que a gravidez ameace a sua “saúde”, entendida como o completo bem-estar físico e psíquico. Nesse sentido, toda mulher que não se sente bem com a própria gravidez, ainda que esteja no terceiro trimestre, pode abortar alegando motivo de “saúde”. Em outras palavras: o aborto a pedido (abortion on demand), por simples solicitação da gestante, tornou-se livre nos EUA a partir de 1973. E todas as leis estaduais que impediam o aborto foram declaradas inconstitucionais.
No Brasil, graças a Deus, não existe um direito ao aborto. O aborto é crime em toda e qualquer hipótese, ainda que praticado a pretexto de salvar a vida da gestante (art. 128, I, CP) ou quando a gravidez resulta de estupro (art. 128, II, CP). O que existe, por força do Código Penal, é tão-somente uma escusa absolutória, ou seja, uma cláusula em que a pena não se aplica por razões de política criminal. As escusas - é bom frisar - não eliminam o crime nem o criminoso, apenas excluem a pena.
Se um filho já furtou do pai (não importa qual bem), se um alguém furtou de seu próprio cônjuge (não importa a quantia), ficará isento de pena em razão do que dispõe o art. 181 do Código Penal. Essa escusa absolutória não dá ao filho o direito prévio de furtar dos pais, nem ao marido o direito prévio de furtar da mulher (ou vice-versa) mas exclui a pena se o crime já ocorreu.
Nesse caso, seria um absurdo falar em furto legal, simplesmente por não haver punição.
Analogamente, não há aborto legal, nos casos em que tal crime “não se pune”. O Código Penal não dá (e nem poderia dar) permissão prévia para abortar, mas tão-somente uma isenção da pena se o crime do aborto já ocorreu naquelas circunstâncias. Trata-se de um perdão legislativo.
Lamentavelmente, o Estado tem estimulado a prática de abortos quando não há pena prevista para eles. Que tal, se o Estado ensinasse as crianças das escolas a surrupiar coisas do papai e da mamãe, alegando que tal furto, por não ser punível, é “legal”? Que tal, se o Estado ensinasse às mães dos presidiários as melhores formas de escondê-los da polícia, uma vez que esse crime (chamado favorecimento pessoal de criminoso) não se pune quando quem presta auxílio é ascendente, descendente, cônjuge ou irmão do criminoso (art. 348, §2°, CP)?
MSM: Em Portugal, talvez o principal mote utilizado na campanha pró-aborto dos socialistas foi de que o povo português estava culturalmente atrasado, tomando-se a União Européia como modelo desejável. No Brasil, o discurso, como de costume, é o da desigualdade. As mães pobres que são vítimas de toda sorte de violência. O que dizer do fato de que a grande maioria da população de menor estudo e renda seja mais fortemente avessa à idéia de aborto, e que nas faixas de maior estudo e renda, o aborto seja visto com maior tolerância e aceitação?
Pe. Lodi: Não há como defender o aborto sem recorrer a mentiras (falsidades materiais) ou a sofismas (falsidades formais). O apelo à “isonomia” é mais do que usado pelos abortistas. Dizem eles que só as mulheres ricas têm condições de praticar um aborto “seguro” (sic), ao passo que as mulheres pobres morrem às centenas de milhares (sic!) em decorrência de “abortos mal feitos”.
Deixemos de lado a superfaturação de estatísticas, uma vez que segundo os dados do DATASUS, disponíveis a qualquer internauta, o número de mulheres cuja morte se dá em decorrência de “gravidez que terminou em aborto” não passa de duzentas por ano (e não duzentas mil). Suponhamos que de fato houvesse uma enorme mortandade de mulheres por causa de aborto feito “em condições precárias”, “sem higiene” e “sem segurança”, como dizem os abortistas.
Qual seria a solução para esse quadro caótico? Muito simples: não abortar. Melhor ainda: fazer campanhas preventivas e repressivas à prática do aborto. A prevenção seria feita, obviamente, com uma sadia educação para a castidade. E a repressão seria feita pela persecução penal e pela aplicação de penas proporcionais à gravidade do delito.
No entanto, os abortistas pensam diferentemente. A “solução” é legalizar o aborto, a fim de que todas as mulheres, ricas e pobres, tenham o direito de cometer a mesma atrocidade, sem correrem o risco de morrer.
Que tal legalizar o roubo, a fim de que todos possam roubar, tanto os ricos quanto os pobres, a fim de evitar a presente “desigualdade” entre os amigos do alheio? A legalização do roubo não seria uma forma de evitar que só os ladrões mais pobres e menos experientes vão para a cadeia? Legalizar o seqüestro não seria um meio de impedir que tantos seqüestradores morram em “seqüestros mal feitos”, justamente os que não têm recursos para fazerem um “seqüestro seguro”?
Graças a Deus, esses sofismas, que repugnam a quem ainda tem um pouco de bom senso, só costumam encontrar aceitação entre os “grandes”, ou seja, dos que se consideram intelectuais. Os “pequeninos”, a quem o Pai revelou os mistérios de seu Reino (cf. Lc 10,21), facilmente detestam o que é naturalmente detestável.
MSM: Embora o Estado brasileiro ainda não esteja estimulando diretamente a surrupiar coisas dos pais, ele está estimulando as crianças nas escolas de que a prática homossexual é preferível à heterossexual, que o sexo pode ser feito sem qualquer responsabilidade exceto a de usar preservativos, que se masturbar é saudável e que abortar é “legal”, utilizando duplo sentido de “legal”...
Pe. Lodi: Sem dúvida, o Estado, ao praticar o aborto com o dinheiro público está sendo coerente com inúmeras outras medidas insanas que ele vem tomando para estimular o vício e a corrupção entre o povo, sobretudo entre crianças, adolescentes e jovens. Diria que o Estado brasileiro não é coerente com sua função natural de promover o bem comum, mas que ele está sendo coerente com sua própria incoerência de corromper a população.
MSM: O padre Michel Schooyans argumentava que o feminismo que defende o aborto é na verdade um machismo, pois facilita mais ainda ao homem sem escrúpulos se desresponsabilizar por sua parte na vida gerada. Rótulos à parte, parece que isso é mesmo verdade, não?
O único beneficiado pelo aborto, por exemplo, em caso de estupro, é o estuprador. Ele ficará isento do ônus de responder civilmente pela criança gerada.
O feminismo, desconsiderando as preciosas diferenças naturais entre os sexos, pretende nivelar a mulher ao homem. E esse nivelamento se dá por baixo. A mulher, dizem as feministas, deve fazer tudo o que o homem faz: trabalhar fora do lar (mesmo com imenso prejuízo para os filhos), tomar anticoncepcionais (imitando o homem, que não engravida nem sente as dores do parto), ter o direito de praticar a união carnal com outras mulheres (sempre imitando o homem) e até mesmo, poder optar por matar a própria prole antes de nascer. Esta última “opção” o homem não tem. Ao defendê-la, as feministas pretendem, não apenas imitar o homem, mas colocar-se ainda abaixo de seu nível.
MSM: Em “O Aborto: aspectos político”s, de 1990, Michel Schooyans afirma “a ação [dos militantes pró-vida dos Estados Unidos] justifica grandíssimas esperanças em escala mundial”. E com grande alegria observamos uma regressão acentuada na velocidade de abortamentos nos EUA pois a oferta de médicos dispostos a realizá-los é cada vez menor, como afirma a revista Whistleblower “ENDING ABORTION: How the pro-life side will win the war”. Os médicos brasileiros não têm “direito de escolha”?
Pe. Lodi: A “Norma Técnica de Atenção Humanizada ao Abortamento” (Ministério da Saúde, 2005) diz, ridiculamente, que o médico não pode alegar objeção de consciência quando não houver outro médico disponível para praticar um aborto “juridicamente permitido” (o que não existe). Nesse caso, por incrível que pareça, o médico seria obrigado a fazer aborto contra a própria consciência.
É óbvio que essa “norma” não tem qualquer valor jurídico, e que qualquer médico pode e deve desconsiderar o que nela está escrito. Mas ela serve para intimidar e pressionar os profissionais que às vezes carecem de melhores informações jurídicas. Estamos assistindo à ditadura da implantação do aborto no Brasil, por obra do Governo Federal (cf. CRUZ, Pe. Luiz Carlos Lodi da. Aborto na rede hospitalar pública: o Estado financiando o crime. Anápolis: Múltipla, 2007, p. 60)
MSM: A estratégia do International Planned Parenthood, é a de financiar grupos ativistas a fim de apoiar a violação das leis anti-aborto o máximo possível, para assim forçar sua mudança total, como “demanda da sociedade”. Como desmascarar esse atentado às instituições do país, quando essas já estão em processo adiantado de auto-destruição e desmoralização?
Pe. Lodi: Sem fazer trocadilho, o trabalho de “desmascarar” é o que você já está fazendo no Mídia Sem Máscara, pela Internet. O Prof. Humberto Leal Vieira, presidente da Associação Nacional Pró-Vida e Pró-Família (PROVIDAFAMILIA) e membro da Pontifícia Academia para a Vida, costuma afirmar que a missão de quem é pró-vida é tríplice: 1°) informar; 2°) informar; 3°) seguir informando.
De fato, a desinformação (aliada à mentira) é a grande arma dos autores da cultura da morte. É necessário divulgar essas informações preciosas (e que nem sequer são secretas!) sobre os interesses internacionais de implantar à força o aborto nos países do Terceiro Mundo, como meio de dominação demográfica e política. É preciso dizer quantos dólares são investidos para esse fim e quais são as entidades nacionais pró-aborto beneficiárias.
Meu grande amigo Jorge Scala, na Argentina, escreveu um livro só com esse propósito, e que eu tive a honra de traduzir para o português: “IPPF: a multinacional da morte”, de leitura obrigatória para os defensores da vida.
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