...Quererá dizer que o colectivo de cidadãos de um país politicamente democrático elege quem a maioria votante determinar?
Colocarei de imediato a enunciar um breve desiderato que há 2007 anos impera sobre uma «religiosa» minoria da humanidade.
Após pareceres, discursos e estrambólica sugestão de eminências assaz pardacentas, à época, Pilatos perguntou à ávida e cega multidão: - Jesus ou Barrabás?... E obteve como resposta em uníssona aclamação: - Barrabás, Barrabás!...
Para mais ainda salientar a nauseante evidência, acrescento o corrente dito unânimemente aceite por quem possuindo raciocínio não raciocina: «A voz do povo é a voz de Deus».
Ora, os elementos que acabo de referir e posicionar não têm ineditismo algum, aliás, são do comezinho conhecimento geral. Estarão por consequência as Leitoras e os Leitores de acordo ou não com eles? Terão sido factos? Emanarão da autenticidade? Merecerão em apreço o crédito que se lhes atribui?
Prosseguindo, vou de imediato à questão que há uns largos e estranhos tempos a esta parte me têm colocado o pensamento da boca aberta.
Consabe-se que Isaltino Morais, em Oeiras, Fátima Felgueiras, em Felgueiras, e Valentim Loureiro, em Gondomar, em ruptura com os seus respectivos partidos (forte suspeição de desonestidade) e apesar das arguíções judiciais sob as quais estavam e continuam a estar foram eleitos presidentes de Câmara Municipal nas respectivas regiões. «O povo é quem mais ordena». Terá ordenado bem e em plena legalidade?
Cavaco Silva, contra os indignados protestos do PCP que estulto se presumiu ridículo dono do dito, num inteligentíssimo arroubo no decurso da sua campanha presidencial, proclamou, em relação à sua provável eleição: « - O povo é quem mais ordena». E o povo ordenou. Terá ordenado bem e em plena legalidade?
Num caso, quanto a mim, ordenou péssimo e ilegalmente, e no outro ordenou muitíssimo bem e com inequívoca legalidade.
Um candidato a um emprego, cidadão comum, sobre o qual recaia a suspeição de ser desonesto, ainda que deveras não o seja, terá porventura algum patrão que lhe dê trabalho? Ah, tem, tem sim senhor: se for contratado para cometer um crime ou empregar-se entre uma seita de ladrões.
Foi há dias decidido que Isaltino Morais vai finalmente sentar-se no banco dos réus, porque, decerto e ao fim de tanto tempo, as autoridades concluíram que há ilicito criminal para fazer-se justiça. Vai ser julgado, arguído de desonestidade, o presidente da Câmara de Oeiras.
O que é isto? Isto é uma bandalheira e uma indignidade cívica sem nome. Quem deveria sentar-se no banco dos réus seria o ex-presidente e, porventura se fosse julgado inocente, voltaria sem mácula a exercer as suas funções. O que se está a passar, e tem passado, traz a política e a justiça de rastos, tão de rastos, como de rastos andam os processos que envolvem os ricos, só os ricos, porque os pobres e os remediados, como o Sargento Gomes, um homem com coragem, dignidade e honestidade invulgares, vão presos em tempo célere e sem hesitação.
Ah, caramba, o que é que o povo deveras ordena? Pôde ordenar o holocausto? Ordenou-o. Pode ordenar a carnificina no Iraque? Ordenou-a duas vezes.
Pergunto, e é preciso alguma coragem só para perguntar: merece algum licito crédito aquilo que o povo ordena?