Não só no Brasil, mas no mundo inteiro, sempre que os bancos centrais procuram manter a moeda estável sofrem pressões por parte de três grupos: o dos economistas heterodoxos, o dos empresários mal acostumados e o dos políticos da base dos próprios governos. Os primeiros não podem ver um preço no lugar certo, isto é, estabelecido pelo mercado, que têm ataques histéricos e, barulhentos como as gralhas e maritacas, tentam reinventar a roda. Pensam, decerto, que se um quadro estiver torto na parede, ao invés de ajustá-lo, é melhor derrubá-la e construir uma outra, inclinada, para ficar paralela à moldura... Os segundos fogem da competição como o capeta da cruz santa. Já os políticos, bem, são políticos e creio que não é preciso dizer mais nada...
Tenho sido bastante crítico em relação ao presidente, porém já escrevi diversas vezes, aqui mesmo no JB, que a autonomia que ele vem concedendo, desde o primeiro mandato, ao Banco Central, vem sendo o solitário ponto forte de seu governo. Por isso, são muito preocupantes as fortes pressões que as autoridades monetárias vêm sofrendo, oriundas de políticos “mensaleiros” (alguns até acusados de formação de quadrilha), de setores rupestres de seu desmoralizado partido, de aliados interesseiros de ocasião, de federações e confederações de empresários viciados na proteção do Estado, de palpiteiros sempre de plantão e de alguns de seus ministros.
A função principal dos bancos centrais é manter a moeda estável e ponto final! Seu papel não é o de promover o crescimento da economia, nem o de gerar empregos, nem o de “redistribuir” a renda e como é frustrante para um economista ter que repetir isto, já no sétimo ano do novo milênio! Tal discussão podia fazer sentido até os anos 50 do século passado, todavia – e que ninguém venha falar de “pensamento único”, pois se trata de constatação empírica – está completamente ultrapassada!
Como sempre, o berreiro é “contra” a valorização do real e o “conservadorismo” que reluta em diminuir a taxa básica de juros e o tom minimalista da desafinada cantoria é que o Banco Central “não está fazendo nada” para conter a valorização do dólar e acelerar a queda da taxa Selic. Ora, nosso regime cambial é de metas de inflação, que pressupõe taxa de câmbio flutuante e, como bem observou o economista Roberto Fendt Jr., “não está escrito em lugar nenhum que a taxa só pode “flutuar” para cima, com a desvalorização do real”. Ademais, não há evidência empírica de bancos centrais que tenham tido sucesso em estabilizar o câmbio frente a movimentos especulativos contra a sua moeda. A verdade pode incomodar, mas precisa ser dita: o câmbio, simplesmente, está onde deve estar.
E a taxa de juros também. É evidente – ou já deveria sê-lo, a esta altura do campeonato – que as taxas de juros são altas no Brasil tão apenas porque o Estado recusa-se, há décadas, a promover cortes substanciais e estruturais em suas despesas, especialmente nas de custeio. Enquanto não o fizer, qualquer aventura heterodoxa por parte de alguma diretoria do Banco Central estará fadada ao fracasso, vale dizer, a provocar, após alguns meses de falsa euforia, semelhante a uma bebedeira, uma enorme ressaca - a estagflação -, que, no caso brasileiro, estará mais para uma cirrose. A história é velha, mas, outra vez, a verdade parece aborrecer...
Deixem o Banco Central trabalhar em paz! Não tenho receio de afirmar com todas as letras que o quadro técnico do Banco Central do Brasil não fica nada a dever a nenhum outro, de país desenvolvido ou não. É urgente regulamentar o dispositivo constitucional que estabelece a sua autonomia, engavetado desde 88. Como escreveu com propriedade Hayek, a autonomia dos bancos centrais equivale a separar o pires de leite dos gatos, ou, adaptando para o nosso país, dos gatunos perspicazes, dos ladravazes contumazes e dos oportunistas mordazes.