O direito de expressão é assegurado a todos, o que é bom, pois do debate nasce a luz já que não existem donos da verdade. Pode até ser cansativo, como é para mim, voltar a ver a invocação das Forças Armadas, agora acrescida da novel Força Nacional de Segurança (FNS), para o combate ao crime organizado, como está ocorrendo no caso específico do Rio de Janeiro. Como acredito nas boas intenções, não hesito em alertar que essa não é a solução para a ansiada segurança pública, dever do Estado a ser exercido pela polícia federal, polícias rodoviária e ferroviária federais, polícias civis, polícias militares e corpos de bombeiros militares, conforme dispõe a Constituição Federal.
O tema é recorrente e os avanços insignificantes. Costuma-se perder tempo, por falta de conhecimento ou por má fé,desviando-se o foco da segurança pública para a questão do papel das Forças Armadas na sociedade brasileira. Não será o meu caso.
Tenho convicção que o melhor caminho é analisar a situação dos citados órgãos legalmente responsáveis, buscando-se identificar suas vulnerabilidades e promover os aperfeiçoamentos requeridos. Se o problema for de insuficiência de efetivo, a solução compete às autoridades constituídas, da mesma forma que o atendimento às necessidades de recursos financeiros indispensáveis à difícil missão de “preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio”. Optar por atribuir a outros esse relevante encargo é enganar com promessas vãs e protelar a solução da angustiante situação brasileira, em especial a carioca.
Não se pode duvidar que a FNS é composta de homens selecionados, razoavelmente instruídos e bem armados, recrutados nas diversas polícias estaduais, mas incapaz de ações preventivas e repressivas eficazes só possíveis mediante conhecimento e acompanhamento constante do crime organizado. Então, por que não tomá-la como parâmetro a ser atingido pela totalidade dos seus órgãos formadores? Certamente seria mais proveitoso do que os desfalques eventuais comprometedores do desempenho das respectivas corporações estaduais.
A dramática situação atual da segurança pública é decorrente da intencional falta de prioridade que requer determinação caracterizada por dotações orçamentárias adequadas às necessidades de estrutura operacional, mobilidade, modernização de meios e incorporação de avanços tecnológicos específicos respaldados em adequada seleção, formação criteriosa, avaliação contínua de desempenho, ação de comando ou de chefia competente e reciclagem periódica dos recursos humanos. Há algum político, governante ou não, pensando nisso? Lamentável é constatar-se, contrariamente, casos como o ocorrido na recente posse do reeleito governador do Espírito Santo que preteriu, segundo noticiado, a sua polícia militar, melindrando-a, em benefício da guarda municipal que lhe fez descabida escolta. É triste a despreocupação com essas relevantes ações e a sua substituição por medidas de impacto, sem sustentação, mas de ressonância política e popular.
Há também quem aponte a questão salarial como uma das principais vulnerabilidades, mas se tal argumento prevalecesse, lógico seria deduzir que as Forças Armadas, notoriamente mal remuneradas, não deveriam ser lembradas em ocasiões de crise e que os nossos congressistas deveriam ser os melhores do mundo uma vez que dinheiro não lhes falta... Há ainda quem pense, comodamente, que a questão se limita à escolha de nomes para a cúpula dirigente afinados com a sigla partidária dominante, relegando-se até o valor profissional.
Por oportuno devo dizer que para casos especiais, soluções especiais, como aconteceu por ocasião da famosa “Rio 92”, evento que reuniu no Rio de Janeiro mais de uma centena de presidentes e chefes de estado, protegidos pelo bom êxito do emprego, em toda a cidade, durante cerca de vinte dias apenas, de tropa do Exército, cujo comando honra-me ter exercido, fruto de criterioso planejamento e diretrizes superiores. Sem dúvida, esse emprego eventual e de curta duração é aplicável à elogiada Força Nacional de Segurança, como deverá ocorrer no corrente ano por ocasião dos Jogos Pan-americanos.
A segurança pública, contudo, exige continuidade de ação e não pode ser improvisada! Que se abandonem as soluções mágicas e que se enfrente o problema com menos discursos e mais seriedade e competência. As Forças Armadas, especialmente o Exército, jamais se omitiram em contribuir, em tempo de paz, para a harmonia e a paz social, inclusive como opção de lazer para o casal presidencial, sem esquecer, contudo, que não há substitutos para suas próprias missões. Finalmente, não se trata apenas de questão de recursos humanos e de dotações orçamentárias, mas envolve também a existência de leis capazes de dissuadir e de punir os criminosos e de um sistema penitenciário efetivo e eficaz.
Vamos encarar e resolver ou vamos continuar apenas discursando?
(Publicado em “O JORNAL DE HOJE”, de 10/01/07 – Natal-RN)