A conhecida trova: "Eu vi minha mãe rezando / aos pés da Virgem Maria: / - Era uma santa escutando / o que outra santa dizia.", da autoria do saudoso médico poeta Barreto Coutinho, nascido em Palmares-PE e que exerceu sua profissão em Curitiba-PR, foi atribuída a diversos autores e vista pelo próprio autor, em parede de prédio de Lisboa, Portugal, sem indicar autoria(somente a trova).Inclusive, há anos, o poeta, já idoso , foi a Juiz de Fora -MG, receber prêmio por outra trova classificada em concurso, quando o, também, saudoso poeta Rangel Coelho (muito brincalhão), em conversa ao redor de mesa de hotel, duvidou da autoria da trova. Então, Dr. Barreto Coutinho, mostrou um recorte do jornal A Província, editado no Recife no Sec. XIX e documentou ser o autor da trova. Na ocasião, outro poeta presente (de quem não lembro o nome), arrebatou o recorte da mão do autor, e, este, brandindo uma bengala que já usava, disse: "Devolva!" O que foi feito, imediatamente.
Eu, Geraldo Lyra, procurei A Provìncia, no Arquivo Público da rua do Imperador - Recife - PE e encontrei, em edição muito antiga, com o papel amarelado já se decompondo, o poema Mãe, de sete estrofes setissílabas, sendo que o primeiro verso da quinta estrofe está assim redigido;"E, um dia, a vi rezando..."
Como se nota, o primeiro verso foi modificado, para a trova ficar com sentido completo... Não se sabe se a modificação foi do próprio autor ou de algum confrade... O que não tira o mérito da autoria!
Inclusive, indo, certa vez, ao Rio, aproveitei para ir "bater um papo" com o poeta Mauritônio Meira, então editor da Revista Nacional, a qual saía, todos os domingos, encartada no Jornal do Commercio, do Recife e que publicou alguns trabalhos meus, a exemplo do soneto Topless. Na oportunidade, falando na trova "Eu vi minha mãe rezando...", o Mauritônio disse ser uma das mais belas da língua portuguesa e que, na sua opinião, o autor dela "é o poeta Da Costa e Silva, de Amarante-PI, autor do famoso soneto Saudade": na época, ainda não tinha pesquisado no Arquivo Público local e fiquei calado...
Quando é agora, o poeta A.A. de Assis, de Maringá-PR, passou-me e-mail perguntando-me se sou parente do trovador Hormino Lyra, de Pão de Açucar-AL e respondi-lhe não saber, embora o escritor Teóphilo de Andrade (da família Pereira Lyra), tenha escrito alguns artigos publicados no Jornal do Comércio, do Rio (e sem dois "mm"), em que pesquisou a genealogia da família "Lyra"(ou Lira, que, segundo ele, têm a mesma origem). A propósito, disseram-me que um Miranda provou não ser parente de outro Miranda...
Ainda, o Assis, mandou-me o seguinte:"Certa vez, procurávamos resolver equação algébrica, a uma incógnita, quando se nos deparou este quadro: na casa da Família Medeiros entrava uma pessoa, sobraçando umas flores para alguém que completava mais um ano de existência; na casa da Família Cravo outra pessoa levava flores para enfeitar o caixão mortuário de uma das senhoras idosas.
O quadro em causa nos despertou o senso íntimo, a chama ardente que se embala no maravilhoso e, bastante sensibilizado, pela primeira vez na nossa vida compomos uma quadrinha em redondilhas maiores:
"Até nas flores se encontra
a diferença da sorte:
uma enfeitam a vida;
outras enfeitam a morte!"
O nosso bom pai, Higino Lyra, chegou, sem que o percebessemos, por trás de nós, leu o que escrevemos e disse, não sabemos se em ar de troça ou de gravidade, porque não tivemos coragem de o encarar:"Seu Hormino, não seja tolo! Deixe de bobear, perdendo o seu tempo! Estude as suas lições!".
E saiu inopinadamente da sala de frente, onde estudávamos.
De todos os irmãos, fomos nós sempre o mais levado na idade própria; mas, ao tempo em que se deu isso, Ele sabia que nós levávamos os nossos estudos a capricho."
Hormino Lyra-"Troveiro" - Rio de Janeiro: Livraria São José - 1960.
Acontece que o próprio poeta A.A. de Assis, atribui a trova do Hormino Lyra ao poeta cigano Jerônimo Guimarães. E o autor destas linhas considera-a anônima, com o primeiro verso tendo o verbo notar:"Até nas flores se nota...", no lugar de "Até nas flores se enconta..."
Acho algo extraordinária a declaração do "parente" Hormino Lyra, de que "pela primeira vez em nossa vida compomos uma quadrinha em redondilhas maiores." A ser verdade, ele começou por onde os outros acabam:ficou famoso com uma só trova - não precisava escrever mais nada!