Direção do DCE da UnB é contra a partidarização dos diretórios acadêmicos, prega ocupações no campus e ameaça levar os estudantes à rua, caso seja comprovado que Lula prevaricou
Paulo César Campos
Já não existe mais na UnB (Universidade de Brasília) a figura do todo-poderoso presidente do DCE, aquele que possui competência exclusiva para decidir os rumos do movimento estudantil, deliberar funções, representar a entidade, falar com a mídia, assinar recibos, notas e manifestos. Estatuto aprovado em 2004 eliminou o cargo, agora exercido por oito coordenadores com as mesmas prerrogativas.
A mudança faz parte de ousada orientação de repúdio aos relacionamentos baseados em troca de favores e promoções pessoais ou corporativas, adotada pela chapa AME (Autonomia do Movimento dos Estudantes), vencedora do tumultuado processo de eleições para o DCE da UnB, ocorrido em dezembro daquele ano, meses depois da aprovação do estatuto.
A AME só ganhou as eleições depois que a chapa que recebeu a maioria dos votos foi impugnada e não pode assumir. A Comissão Eleitoral decidiu que houve gastos não-declarados. Descobriu-se que uma gráfica contratada para imprimir 10 mil panfletos, na verdade produziu 20 mil. Até mesmo uma pasta com material de campanha foi encontrada com uma estudante. Nela, estavam anotações de contabilidade no valor de R$ 8 mil. O regimento determina que os gastos não podem passar de R$ 3.900,00. O caso ganhou notoriedade depois que camisetas com propaganda foram descobertas no gabinete de um parlamentar federal.
Um dos coordenadores da atual gestão, Artur Sinimbu, aluno do curso de Ciência Política, avalia que os diretórios acadêmicos (DCEs e DAs) no Brasil sempre foram foco de interesses partidários. Na UnB prevalece o assédio dos considerados partidos mais à esquerda; PC do B, PT, PSTU e agora o PSOL. “A UnB já serviu de base eleitoral para as esquerdas do país”, assegura Artur. E avisa que não será surpresa se nesse ano o movimento estudantil participar do que ele chama de caixa 3: “Partidos colocam grana para eleição de uma chapa que, aparelhada, vai trabalhar para eles”.
Pelo menos até o fim dessa gestão, o DCE estará fechado ao tal aparelhamento de mão dupla. “Quando apoiamos movimentos sociais evitamos até mesmo aparecer com bandeiras do diretório, para não aparelhar o movimento, partidos, então, nem pensar”.
Como haverá novas eleições para o DCE em junho deste ano e as eleições majoritárias de outubro, recursos de campanha podem parar nos cofres das entidades estudantis.
Telefonemas de gabinetes políticos
Artur conta que é comum receber ligações telefônicas de alunos de dentro de gabinetes de parlamentares que desejam resolver algum tipo de pendência. Para ele, essa é a relação que tem que acabar. “Grupos políticos só gravitam em volta do DCE, na diretoria eles não estão, não agimos sob nenhuma referência político-partidária”.
A maioria dos universitários espera um DCE autônomo, independente. As principais reivindicações são ampliação das bolsas permanentes, melhoria da qualidade da Casa do Estudante e preços menores no restaurante universitário.
A AME costuma agir com alguma conversa e muito barulho. Uma dessas mobilizações ficou conhecida como manifestação casada. Em maio de 2005, quando foram descobertas as fraudes nos concursos do Cespe simultaneamente à decisão da reitoria de manter as grades do Minhocão, os alunos usaram a força para retirar as grades e as levaram para a frente do edifício do Cespe, com o argumento de que ele é que precisava delas. As grades continuam, mas o ato causou impacto.
Para Artur, a questão de segurança alegada pela reitoria viola o projeto urbanístico pensado por Oscar Niemeyer e Lúcio Costa. “Discordamos porque não é uma decisão inteligente. Segurança pode ser feita por pessoas em cada instituto, as grades não evitam transgressões criminosas”, raciocina.
Os coordenadores da AME lideraram também o boicote às últimas eleições para reitor por não terem tido maior participação no processo de escolha.
Depois que tomou posse o professor Timothy Mulholland, eles já foram quatro ou cinco vezes recebidos em seu gabinete, mas com cuidado e precauções: “Não queremos passar idéia de cumplicidade e passividade institucional. “A fala é macia mas sempre tem porrete por trás”, justifica o dirigente.
A tese vale para os dois lados. Prova disso é que, também no ano passado, ele e seus companheiros decidiram invadir a reitoria, onde ficaram durante um dia e uma noite. A AME é adepta de intervenções físicas como pular catracas do restaurante e ocupar departamentos. “O tratamento diplomático é bom mas as coisas só andam com pressão política e sem troca de favores”, diz Artur.