O mundo infantil é povoado de magia. Toda criança sonha com superpoderes, capacidade de voar e o dom de reger a realidade com uma varinha de condão. Nesse mundo habitam Papai Noel, a fada madrinha e multidões de inimigos imaginários a serem derrotados. Toda criança que dispõe, no fundo do pátio, de um canto só seu, a sua casinha, sabe que ali é seu palácio, seu mundo encantado, onde ela é a senhora do destino. A transição para a realidade vem com gradual constatação de que as coisas não funcionam assim. Papai Noel tem recursos limitadíssimos. A fada madrinha é omissa e incompetente. A casinha fica pequena demais e vira tapera.
Nosso presidente me passa essa impressão de um adulto brincando de casinha em seus palácios. Lá chegou como alguém com autoridade para convocar Papai Noel, dotado de poderes para fazer o que ninguém mais fez. Sua pueril felicidade era contagiante e dezenas de milhões de brasileiros estavam convencidos da força do seu querer. Era uma multidão de crentes, para os quais o menino pobre de Garanhuns encarnava a esperança de converter em realidade todos os sonhos.
Gradualmente, o Brasil está acordando para o fato de que a utopia com que lhe acenaram durante duas décadas era exatamente isso. Mas nosso presidente permanece envolto na fantasia dos seus palácios. Não estou dizendo que seja proibido sonhar, nem impossível transformar a realidade. O que estou dizendo é que só se muda a realidade com realismo, pés no chão e ideais elevados no coração. Quem, como Lula, vive noutro mundo, fica assim como ele se mostra, distanciado dos fatos, sem os compreender, ou, mais grave ainda, sem sequer saber o que acontece à sua volta. Perdoem-me os fãs de Lula, mas o homem vive num mundo encantado. As estrelas no jardim, as mordomias, o avião e as viagens têm tudo a ver com isso. A alegria dele, há bem poucos dias, visitando o túmulo de Lênin, seria bonita não fosse o homenageado pela visita um genocida. Para encontrá-lo pessoalmente seria preciso pedir a Dante Alighieri o endereço do círculo mais quente do inferno.
Tenho ouvido muita gente dizendo que Lula viaja demais. O problema não é esse. O problema é que ele sempre volta.
(*) O autor é arquiteto, político, escritor e presidente da Fundação Tarso Dutra de Estudos Políticos e Administração Pública.