Resumo: Durante esse tempo todo em que o PT preparou seus planos totalitários bem reais, o jornalista Luis Nassif não se chocou. Mas agora encontra tempo para se chocar com o fantasma favorito da esquerda brasileira: a "direita raivosa".
Quando se ataca a argumentação ou estilo de alguém chamando-a de inculta, tosca, violenta, raivosa, impensada, é razoável esperar que o autor do ataque não incorra nestes mesmos erros. Questão de coerência. Ou, se ele se posicionar imparcialmente, no intuito de contrapor duas posições ou estilos, espera-se que haja honestidade em enxergar diferenças reais na essência de ambas que sejam contraditórias no aspecto relevante. Caso contrário, se para opor duas posições, for necessária a ocultação do que há de mais saliente em uma delas, diríamos que houve aí fraude deliberada. É o caso de Luís Nassif no artigo da Folha de S. Paulo, "A volta da direita inculta".
Perguntará o leitor: a quem se refere Nassif quando fala do ressurgimento vindo das trevas, de uma ‘direita raivosa e inculta’ assim, de forma genérica, apelando excessivamente à imaginação do leitor? Ele bem poderia estar se utilizando do artifício da infamação genérica e, uma vez sofrendo críticas de qualquer espécie, gritar em sua coluna: “Eu não disse a você leitor? Eis aí a prova!”.
Por que se atém a um fantasma de direita tão radical quanto difuso, tão inculto quanto inominável se há incultura e raiva materializada em carne, osso e mensalão, visível em todos os espaços da vida pública, de padres e professores a vereadores e presidente da República? Ora, 2002 não está tão distante que nos impeça de lembrar que a classe jornalística em massa, no sentido de Ortega y Gasset, fez o possível e o impossível para calar o fato de que o senhor presidente não sabe se comunicar com um mínimo de decência. Disseram que o povo era preconceituoso. Que o povo não estava acostumado a se enxergar no poder. Que a lógica do ex-metalúrgico era emocional e não racional, ou seja, guiada pelo mesmo ‘feeling’ alertado pelo jornalista como perigoso e por ele vislumbrado nesse fantasma fascista redivivo.
Por décadas nos obrigamos a ouvir ‘os companhero’ e tolerá-los no vernáculo e em sua tosquice: eles trazem a mensagem salvadora; essas sutilezas léxicas e conceituais pequeno-burguesas devem ser extirpadas, ameaçaram. Não há tempo para estudar, camarada.
As últimas CPIs mostraram ao povo a fala tosca, impiedosa, entorpecida e completamente desarticulada da elite do partido hegemônico, vários deles professores. Souberam chegar ao poder mas não aprenderam a utilizar o plural, algo bem mais fácil. Mas o jornalista se auto-censura afirmando que a tosquice raivosa é coisa só encontrável no infantilismo xiita dos radicais da esquerda.
Afirma que esse fantasma traz em si um discurso de ódio. Não há muito tempo, o que só se ouvia destes que hoje estão no poder era que se precisava destruir a burguesia. Sempre atiçaram o ódio e a inveja. Modo de dizer , disseram os jornalistas.
Afirma que “O resultado [da atividade dessa direita inculta] tem sido a editorialização da notícia, o exercício de um opinionismo autoritário e raso, que choca o público mais sofisticado, o leitor mais instruído, mas soa como música para uma classe média que há pelo menos 15 anos se deleita com linchamentos e catarses”.
Ora, durante esse tempo todo o jornalista, que se coloca na posição do público sofisticado, não se chocou. Agora é hora de se chocar com o espectro, pois espectros não demitem, não se juntam para processar coletivamente, não ameaçam de morte e não mandam matar.
Já sobre a identificação ectoplásmica-ideológica dos espectros que promoveram os linchamentos e catarses de há pelo menos 15 anos, sugerimos a tarefa a algum pai-de-santo com conhecimento de ‘Ética na Política’.
Segundo o feeling do jornalista, "Há demanda por ódio, radicalização, simplificação e autoritarismo". Demanda? Não há demanda. Há tudo isso já há bastante tempo, tanto que esses anseios baixos observados pelo jornalista culminaram na eleição do partido hegemônico.
Mais uma vez, por que se utilizar de fantasmas, quando a realidade identificada pelo jornalista nesses espectros existe plenamente como força histórica, real? Tanto é real que até comemorou seus 25 anos há pouco tempo. Diria Nelson Rodrigues, é tão real que podemos farejá-la, tocá-la, pedir a ela dinheiro emprestado... Bem, deixemos de lado a última sugestão do escritor.
E afinal, por que razão citar de forma utilitária e pejorativa os nomes de Olavo de Carvalho, Miguel Reale, Oliveiros S. Ferreira, Gilberto Kujawski, Ortega y Gasset? Para dar a impressão de que as pessoas inspiradas por estes filósofos não têm o conhecimento devido de suas obras e ele, Nassif, embora divirja ideologicamente destes, as absorveu de forma proveitosa, para além do estilo, numa afetação de superioridade? Ou, como diria o vulgo, a citação foi para ‘puxar o saco’ dos mestres invejados?