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Artigos-->Cidadão honesto desarmado -- 13/10/2005 - 11:10 (Félix Maier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Cidadão honesto desarmado



Roberto Romano (*)



Em questões éticas ou políticas, honesto é assumir atitude própria, presa ao exame dos fatos e dos princípios universais. Lastimável - e muito -, no Brasil de nossos tempos a reiteração dos lugares comuns e dos truques fraudulentos usados pelo governo petista para mergulhar o País na aventura do Estado forte, que açambarca os direitos da cidadania. O pior exemplo tem origem no Chefe do Estado. Em artigo de jornal, o escritor da presidência comete algo inacreditável (no Estado democrático de direito): "Sei que algumas pessoas, peritas em armamento, consideram a vedação ao porte uma ofensa a seu direito individual. Essas pessoas, contudo, são exceções e a lei não é feita para as exceções. Todos os países do mundo admitem restrições aos direitos individuais quando seu exercício pode colocar em risco os direitos ou a vida de terceiros. O direito ilimitado por excelência é o direito de opinião" (Folha de São Paulo, 9/10/2005). Embora o presidente ocasional não saiba escrever nem ler com destreza, o secreto redator retoma uma "idéia" antiga e totalitária do pai do povo: "Acho que a liberdade individual está subordinada à liberdade coletiva. Na medida em que você cria parâmetros aceitos pela coletividade, o individualismo desaparece. Ou seja, não há razão para a defesa da liberdade individual. O que você precisa é criar mecanismos para que a grande maioria da comunidade possa participar das decisões". (Palavras da mesma pessoa que hoje preside a república, na Folha de São Paulo, naquela data (1986), relutante defensora da luta armada.



O presidente não gosta de ler e o exercício do direito e da lógica passam longe de suas arengas. O escritor fantasma que o serve, no entanto, antes de publicar artigos de enorme responsabilidade pública, deveria consultar juristas e lógicos. Claro, se o alvo do seu texto consistisse em defender a democracia. Não é o caso do aranzel publicado. Nele, o indivíduo deve curvar-se ao coletivo. Este último, como não tem personalidade própria (nem o governante, nem o seu escritor fantasma mostram leitura de Hobbes, mas neste ponto situa-se a base mesma do Leviatã), é personificado pelo presidente e demais "autoridades". Assim, o truque primário de reduzir direito universal e um princípio à reivindicação de "algumas pessoas", nega a amplitude da lei, transforma os que exigem respeito pela Constituição em "exceções". Bem na linha de Hobbes, mas sem ter consciência (se abrir livros é impossível para o presidente e seus acólitos, imaginem esmiuçar volumes do ardiloso defensor do arbitrio!). A escrita de Hobbes não combina com Zeca Pagodinho que, sabemos, é o grande mestre da filosofia e do direito que regem o Planalto. Chefe de Estado e seu escriba só permitem as liberdades públicas no "direito de opinião", que não se traduz em leis, atos e fatos. Um direito que não é um direito. O poder, pelo menos, constata a loucura de arrancar o pensamento das pessoas, façanha tentada sem sucesso pelos totalitarismos pretéritos.



O presidente insulta os contrários ao "desarmamento" (desarmamento enganoso, porque os ricos e os políticos terão os seus exércitos de "seguranças" armados) e publica sua opinião sobre o referendo. Ele tem o direito de opinar. Mas convocado um referendo, todo o poder estatal, incluindo o governo, torna-se magistrado. O presidente representa todos os brasileiros e tem o dever de acatar a opinião de todos e de não se pronunciar antes das urnas. O "artigo" citado é ato de guerra contra os que discordam da política governamental. Nele, se afirma sem provas idôneas que a culpa da violência encontra-se nos que defendem o porte de armas para auto-defesa. Estivéssemos num país que respeita as leis, o presidente responderia pela calúnia contra uma parte considerável da cidadania. A atitude presidencial seria apenas hilária se não definisse o destino de seres humanos, como no referendo convocado para validar a lei imposta no Congresso com o modus operandi habitual, delatado por Roberto Jefferson, o companheiro do presidente, a quem este último daria um cheque em branco. Não confio em Jefferson e tenho certeza de que ser contra desarmamento é seguir a doutrina mais antiga do mundo democrático e do ensino cristão. Nas Revoluções inglesa, norte-americana e francesa, sem as quais não conheceríamos direitos humanos, a prerrogativa do particular possuir armas é sagrada. Tomás de Aquino reconhece o direito à defesa própria (Summa, IIa IIae q. 64 a. 7). Prefiro aqueles movimentos e Tomás de Aquino, em vez da hipocrisia bem pensante que entrega os cidadãos aos fora da lei e aos donos do poder, os quais não têm coragem e meios para enfrentá-los. Na lógica de nossos governos, é mais seguro arrancar impostos, trair a confiança, impedir o armamento dos cidadãos honestos, com endereço e lugar de trabalho conhecidos. Não existe, para esse método, outro nome senão covardia.





(*) Roberto Romano da Silva é Professor titular de Filosofia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), professor de Ética, também pela Unicamp. Doutor em Filosofia pela École des Hautes Études en Sciences Sociales de Paris e membro do Instituto de Filosofia e de Ciências Humanas da Unicamp, é autor dos livros "Brasil, Igreja contra Estado", de 1979, "Copo e Cristal, Marx Romântico", de 1985, e "Conservadorismo Romântico", de 1997. Os artigos do Professor Roberto Romano da Silva também são publicados semanalmente no Correio Popular, de Campinas.











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