Considerando a dificuldade teórica implícita na tarefa da constituição de uma ciência do belo – a saber, como falar cientificamente sobre o objeto de uma ciência (o belo/ciência do belo) se, exatamente, a teoria desta ciência, que é aquilo que possibilita o discurso científico (sendo, então, condição de possibilidade para), ainda não se constituiu – reconstrua os principais momentos daquela temática, destacando a especificidade da estética hegeliana.
Hegel tratou do belo como algo pertencente à arte; não da forma de imitação da Natureza, mas como uma espécie de ponte para a reflexão contextual de épocas, algo como a mentalidade subjacente a cada espírito vivencial de épocas, séculos, até mesmo correntes filosóficas, etc.
Ora, se a estética aparta o belo natural, resulta que, além de nada ganharmos, mais nos afastamos do necessário. Pois o termo natureza não implica já a idéia de necessidade e de regularidade, quer dizer, a de uma atitude que parece entregar-se e oferecer-se ao estudo científico? Ao contrário do que acontece com a Natureza, a arbitrariedade e a anarquia reinam, absolutas, no espírito em geral e, sobretudo, na imaginação, pelo que os seus produtos, isto é, a arte, se tornam completamente impróprios para o estudo científicos. (Hegel, p.87)
Mas o caso é que a reflexão que aparece como produto da arte, que é a atividade da criação, e tem o belo submisso á ela, por isso Hegel diz:
Ora, originadas e engendradas pelo espírito, a arte e as obras artísticas são de natureza espiritual, até quando oferecendo a representação uma aparência sensível, esta esteja penetrada no espírito. Neste aspecto, já a arte se aproxima mais do espírito e do pensamento do que da natureza exterior, inanimada e inerte; o espírito revê-se nos produtos da arte. [...] Constituindo o pensamento a essência e o conceito do espírito [...] a arte não é a forma mais elevada do espírito e recebe na ciência a verdadeira consagração. [...] Acrescentamos as novas razões de nossa época para justificar a aplicação à arte do ponto de vista do pensamento. [...] Já para os a arte não possui o alto destino que outrora teve. Tais razões provêm das relações estabelecidas entre a arte e nós, do nível e da forma da nossa cultura. Poder-se-á deplorar que sejam para nós coisas desaparecidas a sublime beleza da arte grega e o conceito, o conteúdo dae época tão bela; poder-se-á explicar esta situação pelas maiores dificuldades de viver, provenientes da crescente complexidade da vida social e política, e poder-se-á deplorar que a nossa situação tenha sido absorvida por interesses mesquinhos e visões utilitárias que tiraram à alma aquela serenidade e aquela liberdade que proporcionam o gozo desinteressado da arte. [...] Por isso a arte dos nossos dias tem por finalidade servir de objeto ao pensamento. (Hegel, pp. 89,90)
Estas últimas reflexões nos levam a dizer que a arte atualizou-se, conforme a época, para uma noção de abstração, conceito que o próprio Hegel apresenta em seu texto e desenvolve-o como aparência, e “é a arte que nos abre os horizontes das modificações destas potencias universais, que no-las torna aparentes e sensíveis”. (Hegel, p. 92)
Sendo que é a verdade que se procura, a arte possui uma realidade mais alta e uma existência verídica, apresentando-se como o produto de uma época como forma de pensamento.