BRASÍLIA - Enquanto não merecer solução definitiva, continuará produzindo maléficos efeitos a questão dos documentos da repressão verificada nos governos militares. Ora é um juiz que determina ao Exército abrir os arquivos daquele período, ora é um militar que protesta, alegando revanchismo. Tudo entre discursos candentes no Congresso, reportagens amargas e notas para todo gosto, nas Forças Armadas.
Existe essa solução? Existe. Bastaria liberar tudo. Não só a documentação oficial existente nos estabelecimentos militares, mas, da mesma forma, os papéis do outro lado. Porque se horrores foram praticados pelo aparelho do Estado, também é verdade que a subversão usou e abusou de violência cruel e inaceitável.
PC do B deveria abrir arquivos
Que tal, por exemplo, exigir do PC do B os arquivos sobre a guerrilha do Araguaia? Que mecanismos foram utilizados, que objetivos pretendiam para estabelecer pela força um enclave revolucionário do centro do País? Por que o "paredón" fazia parte de sua estratégia? Como foram tratados os dissidentes naquele e em outros movimentos subversivos? Quantos participantes se viram "justiçados" pelas implacáveis lideranças?
No Vale da Ribeira, faltam detalhes do relatório feito pelos assassinos sobre a execução, a pauladas, de um oficial da Polícia Militar paulista. Na capital, como planejaram e executaram sentinelas na porta dos quartéis? De que forma e sob que argumentos fuzilaram delegados de polícia e até militares de outros países? Nos vários seqüestros de embaixadores, a ordem era mesmo matar os seguranças? Com base em que manual de direitos humanos? Nos assaltos a bancos, que instruções receberam e como relataram seus atos que sacrificaram inocentes?
A lama escorreu em duas vertentes. Se é para passar a limpo, resgatar a memória nacional, a lógica indica devassa completa. Com nomes e práticas, apesar de a anistia ter suprimido responsabilidades. Ainda: como eram ministrados cursos de guerrilha em Cuba e na China? Aprendia-se a matar pelas costas, com as próprias mãos e pelo garrote, sob patrocínio de governos estrangeiros?
Aqui para nós, a saída para acabar de vez com essa crise latente situa-se na abertura de todos os arquivos. Porque arquivos existem nos dois lados...
Novembro vermelho
Preocupa o acirramento das ações do MST. Porque uma coisa é invadir fazendas improdutivas. Outra é ocupar hidrelétricas e fechar rodovias. Estão desmoralizando a autoridade pública, que não terá outro remédio senão tentar preservar a ordem. Quando menos se esperar, vai aparecer um cadáver. Ou vários. A partir daí, abrem-se as portas para o imponderável.
A história é velha. Faz algum tempo o jornalista e historiador paraibano Nelson Coelho publicou livro relatando evento acontecido em janeiro de 1964, antes do movimento militar. No município de Mari, próximo de João Pessoa, vidas foram sacrificadas num entrevero entre camponeses e policiais, fruto de uma dessas perigosas conjunções da irresponsabilidade. Os sem-terra tomaram o revólver de um administrador de fazendas. A polícia entrou. Jagunços também.
Resultado: onze mortos e muitos feridos. De lá para cá episódios parecidos sucederam-se. Outro hoje, sabe-se lá onde e de que forma, seria o que de pior poderia acontecer ao governo Lula, afinal, aquele que se propõe realizar a reforma agrária.