Entre todos os fundamentalismos, sem dúvida o mais incompreensível não é o religioso, mas o econômico. Um indivíduo que defende de forma veemente dogmas de fé normalmente teve pouco acesso a informações, não se instruiu muito, nem se revela capaz da prosaica tarefa de pensar. Ainda que existam exceções, a mais notável delas o famoso inimigo número um do império americano, nem aí se pode anotar alguma estranheza, porque pessoas como Bin Laden não são genuinamente fanáticas; constituem-se, quase sempre, em meras exploradoras do fanatismo alheio.
O que não se assimila com a mesma facilidade é a constatação de que homens cultos, letrados, lidos e vividos defendam seus pontos de vista com tanta ênfase quanto o mais obscuro dos talibãs. Os sujeitos gastam anos de estudo, investe-se dinheiro público para formá-los e nem assim se consegue contornar-lhes a ignorância.
Nessa espécie extremamente perigosa de fanatismo, a figura do Deus é substituída por uma palavra-chave: mercado. Em nome desse orixá, tudo se justifica, nada se perde, tudo se aproveita. O famoso “filósofo” Olavo de Carvalho afirmou outro dia, em um de seus delirantes artigos, que o capitalismo não pode ser confundido com as ideologias, porque o capitalismo, no seu ponto de vista, é uma força da natureza e não a soma de mentiras, tabus e mistificações os mais diversos. O que significa dizer: a divindade não foi criada pelos homens, mas os criou, do alto de toda sua onipotência.
Se há alguma conclusão a extrair disso tudo, não me parece que seja outra, senão a de que as escolhas determinadas pelos grupos preponderantes resumem-se a exigir de todos que abram mão de qualquer influência em seu próprio destino. Não tentem educar o povo: Sua Santidade, o Deus mercado, há de providenciar algo nesse sentido. Não tentem garantir o fornecimento de água à população: o precioso líquido jorrará assim que for atingido o equilíbrio entre a oferta e a demanda...
É assim que funciona o sistema jurídico, político, social e, principalmente, econômico no qual o mencionado “pensador” entende que não se configura e não se caracteriza uma ideologia. Em defesa da tese, sacrifique-se o autor deste pequeno texto e condene-se a resenha feita. Talvez a síntese tenha sido exagerada – é possível que uma exposição tão curta não tenha sido capaz de compreender em toda sua grandeza os fundamentos lógicos de um pensamento como esse.