Dado que as incertezas fazem parte do jogo econômico, o que se espera dos governos é que se esforcem para minimizá-las. Mas não é de hoje que nossos mandatários, um após outro, as têm aumentado, impossibilitando qualquer esboço de retomada do crescimento. Neste momento, há três fontes de incertezas externas anuviando o céu de brigadeiro que o PT encontrou em seu primeiro vôo pelos céus do poder: a primeira é a forma como o Fed vai aumentar a taxa de juros; a segunda vem da China, gerada por um modelo econômico e político que combina câmbio fixo com taxas de juros reais artificialmente baixas e expansão desenfreada do crédito - promovida por quatro grandes bancos estatais, todos com fortíssimas conotações políticas e desempenhando ao mesmo tempo a função de Banco Central -, receita infalível para criar inflação e posterior recessão; e a terceira vem do Oriente Médio e traduz-se na expectativa de que o preço do petróleo poderá, até o final deste ano, atingir os US$ 50 por barril, o que poderá configurar um terceiro “choque” do petróleo.
A letárgica incompetência política e administrativa – que parece não ter limites – do atual governo brasileiro, maximiza, ao invés de minimizar, as incertezas! Os superávits primários têm sido conseguidos com uma brutal elevação da carga tributária; não há qualquer indício de reformas no Estado, já que nossos governantes insistem em crer no modelo “desenvolvimentista” estatal, fragorosamente derrotado pela História; há fortíssimos sinais de desarticulação política, emitidos por partidos e bancadas parlamentares, empenhados na sustentação do governo, bem como pelo próprio Executivo, que parece inteiramente perdido em sua função de governar.
À evidência, multiplicam-se os focos de incertezas, causando forte volatilidade nos mercados financeiros, mostrando ser um castelo de cartas a aparente solidez dos fundamentos econômicos. Se a inflação permanece sob controle, é porque nossa taxa de juros vem sendo a maior do mundo, há bastante tempo. Mas baixá-la irresponsavelmente, como desejam os derrotados pela História e os políticos que só enxergam as eleições, seria, nas atuais condições, apenas antecipar o caos. Não há atalhos para o crescimento sustentado! A alternativa “desenvolvimentista” de flexibilizar as metas de inflação e de aumentar a intervenção do Estado na economia é uma falácia econômica, uma mentira política e uma agressão irresponsável à ética que se exige dos que devem zelar pelo bem comum. Por mais duros que sejam os sacrifícios, inclusive o de uma eventual derrota nas eleições deste ano, verdadeiros estadistas não podem deixar-se enganar e pisar na casca de banana da renúncia à austeridade fiscal e monetária que, mesmo sem ser estrutural, é o que tem assegurado a indispensável estabilidade de preços.
A opção correta, porém de percepção impossível para um governo que ainda trata Castro, Chávez e outros ícones do totalitarismo tardio de “vossas excelências”, é avançar na verdadeira agenda positiva, a das reformas: a política; a tributária; a independência do Banco Central (que, se já tivesse sido aprovada como o presidente prometeu na campanha, evitaria boa parte das incertezas internas e externas atuais); a trabalhista; a desburocratização; o prosseguimento das privatizações e uma reforma – mas estrutural! – da previdência, entre outras.
Diante de tantas incertezas, só há uma certeza: a de que, sem a imprescindível reengenharia do Estado, qualquer brisa vinda do exterior continuará sendo um ciclone ameaçando soçobrar o “barco Brasil” . Certos tripulantes até merecem, mas os passageiros não...
(*) O professor Ubiratan Iorio (lettere@ubirataniorio.org) escreve no Jornal do Brasil às segundas-feiras, de 15 em 15 dias. Artigo publicado no JB no dia 24/05/2004.