Estava eu, saciando minha sede de informações, lendo “O Estado de Sergipe”, quando ouvi aquele pigarreado infantil, por mim bastante conhecido, que sempre prenunciava um questionamento polêmico, mascarado em uma simples dúvida estudantil.
- O Pai ! Dá para o senhor me elucidar uma dúvida?
Não é exagero, nem “corujice” minha não. “Vitinho”, meu primogênito, fala assim mesmo. Embora tenha apenas 14 anos e pequeno porte, se expressa muito bem, escreve até bem e tira notas, não tão bem assim.
- Desembucha, filho. O que é dessa vez?
Ele fez um suspense “hitchcockeano”, próprio para a ocasião, pigarreou, tentando purificar a voz mutante, infanto-juvenil e fulminando-me com aquele olhar maroto de quem vai perguntar algo já sabedor da resposta, inquiriu:
- Por que os judeus e palestinos, que vivem brigando há anos uns com os outros, para resolver suas diferenças, agora que se deslumbra uma situação de paz, começam a brigar entre eles mesmos ?
Eu sabia que vinha algo desse nível e já estava preparado com o meu discurso preliminar:
- Boa pergunta, meu filho. A situação parece incoerente mas para tudo há uma explicação – disse eu, quase que filosofando - Senão, vejamos !
- Pai, só peço que sejas sucinto pois ainda tenho que terminar a pesquisa e para isso preciso desta informação.
Quase que desabo, juntamente com a pose de imortal acadêmico que vestira para impressioná-lo, mas agarrando-me ao que restava da minha dignidade e a algumas notícias recém lidas na Internet, endireitei-me e sintetizei, secamente:
- A paz entre esses povos fere a interesses particulares.
- Sim, isso eu sei, mas e daí?
- Daí, o que? É isso! Não pedistes para que eu fosse conciso?
- Conciso! Bonita palavra, sinônima de sucinto, reduzido, breve. Mas agora deixando de lado o seu amor-próprio ferido, será que o senhor poderia responder, realmente, a minha questão? Se servir de incentivo para estimular o seu brio, somente pergunto-lhe, pois confio na sua cultura e sapiência.
Refeito da queda momentânea do meu ego, agora devidamente massageado, enaltecido e estimulado, retornei ao trono paterno abdicando da pseudo-realeza e continuei:
- Algumas pessoas, de cada um desses povos; extremistas por natureza; querem a paz, mas não cedem em nenhuma das suas reivindicações; outras, mais condescendentes, diferem de parte do acordo, são irredutíveis mas, estão abertas a novas negociações e, infelizmente, uma minoria, que é a mais perigosa, não quer o fim do conflito pois precisa dele para satisfazer seus interesses pessoais, sejam eles materiais, políticos ou financeiros.
- Mas quem decide não são os Premiers?
- Em princípio, sim, mas ...
- Mas o que?
- O Premier de Israel, Ariel Sharon, depende da aceitação popular; do mercado financeiro e da obediência dos colonos israelitas, ocupantes das terras tomadas dos inimigos e principais futuros prejudicados. Já o Premier da Autoridade Nacional Palestina (ANP), Mahmoud Abbas, depende do bom humor de Yasser Arafat; que o nomeou para o cargo; do compromisso e fidelidade dos grupos terroristas, totalmente desconfiáveis e desconfiados e da aceitação dos grupos radicais palestinos que já se manifestaram avessos ao acordo, alguns até com ramificações terroristas como o Hamas, que seria melhor nomeado como “Hodeias”.
- Mas se os governantes já se decidiram pela paz, é um passo importante para que ela realmente aconteça e a mídia mundial não os deixará retroagir
- A mídia não, mas um projétil, faca ou bomba, sim. Foi dessa forma que eles “retroagiram” com o ex-premier Yitzhak Rabin, em 1995.