Para muitas pessoas que frequentam as praias cariocas, a rotina de um guarda-vidas é uma tremenda barbada. Imaginam que os afortunados trabalhadores passam o dia todo de sunga nas areias das praias , assistindo de camarote o mulheril pegando aquele bronze, entre umas poucas incursões no mar para retirar algum banhista incauto e pronto. Porém por trás de todo esse bucolismo tropical há um lado bastante cruel , meio mundo cão.
Marambaia, esse é o apelido pelo qual o nosso personagem era conhecido em todo o litoral carioca, guarda-vidas aposentado, conta que no seu tempo não havia helicóptero dando apoio tático e que tudo era resolvido na base da disposição, vigor físico e muitas braçadas. - “ A gente arriscava a nossa vida e as vezes ainda era mal compreendido, como num salvamento que eu fiz de uma mulher que estava se afogando e que quando a trouxe desfalecida para a areia, ainda fui agredido pelo marido enciumado que não gostou de ver a sua mulher nos braços de um outro qualquer.”
Certa vez um camarada que estava se afogando começou a gritar : - “ Socorro ! Eu sou empresário ”. De uma vez só pularam n’água uns três guarda-vidas. Após o salvamento , o “Empresário” agradeceu a todos e disse que aquele gesto não iria ficar em brancas nuvens. Anotou então o nome , CPF matrícula, e endereço de todo mundo. Passou-se um mês, um ano e nada da recompensa chegar, até que um dia alguém descobriu que o tal homem era um empresário, proprietário de uma “frota” de três carrocinhas de pipocas na baixada fluminense. Depois dessa Marambaia jurou que nunca mais salvaria ninguém pela sua profissão. Ao se aproximar do afogado ia logo lhe aplicando uma gravata e nem queria saber da patente da vítima.
Mesmo com todas essas experiências mal sucedidas e muita precaução, o nosso herói ainda foi vítima de outra esparrela. Após retirar do mar uma jovem em apuros, Marambaia recebeu uma carta da Embaixada do Chile. Ninguém entendeu nada. A questão era que a jovem salva na ocasião, era a filha única do embaixador do Chile , no Brasil , e o diplomata queria de todas as formas conhecer o anjo da guarda que havia salvo o seu tesouro, e o que era melhor : queria recompensá-lo. A euforia tomou conta de todos no Salvamar. Qual seria a recompensa? Para uns : uma televisão, para outros uma viagem ao Chile ou quem sabe mesmo um carro usado. Porém em uma coisa todos eram unânimes: Marambaia deveria melhorar a sua apresentação pessoal, já que ele iria representar o Salvamar junto a um órgão estrangeiro.Correu então a uma loja de roupas e às duras penas comprou um paletó em doze prestações escorchantes mais um par de sapatos novos. Passou numa barbearia e mandou fazer barba, bigode e cabelo. Gastou o que não podia mas ficou parecendo um executivo bem sucedido. No dia e hora marcados foi recebido pelo Embaixador que emocionado o abraçou e agradeceu pelo salvamento de sua filha querida, a razão do seu viver. Com os olhos cheios d’água o velho diplomata abriu uma gaveta e retirou uma garrafa empalhada. Nessa hora Marambaia calculou que o mesmo iria lhe oferecer um brinde antes da recompensa. Foi quando ouviu o seguinte : - “ Essa é a melhor cachaça que nós temos no Chile e eu faço questão de lhe oferecê-la como recompensa pelo seu ato heróico”. E aos prantos tascou um forte abraço em Marambaia e os dois ficaram ali um tempão chorando copiosamente, um em sinal de profundo agradecimento e outro de profundo arrependimento.