A lua-de-mel do PT com a esquerda ilustrada está próxima do fim. O sentimento de traição à causa (à revolução?) generaliza-se e assume diversas formas de expressão. As ilusões foram perdidas pelo realismo maior do que o rei, que tem sido praticado pelos novos governantes, contrariando discursos e promessas de décadas a fio. Eles, os novos governantes, revelaram-se os maiores oportunistas e os mentirosos mais contumazes. O cinismo é o traço mais marcante dessas pessoas, um vício desgraçado que dá bem a sua dimensão moral.
Todas a publicações de hoje revelam essa realidade, em maior ou menor proporção. Vou tomar alguns exemplos que li na Folha de São Paulo por serem emblemáticos sobre o que está acontecendo no meio jornalístico, a indignação com o adesismo do PT e de Lula ao que há de mais odiado pelos petistas em matéria de administração econômica.
Josias de Souza, em sua coluna de hoje na Folha (“PT vira lobo, mas finge que é vovozinha”), ele próprio uma das viúvas do “velho PT” que se extinguiu ao assumir o poder, foi feliz ao sintetizar: “Em cinco meses de exercício do poder, Lula fez com o PT o que os inimigos dele tentaram sem sucesso havia duas décadas. Ofereceram em holocausto (sic) o maior patrimônio do partido: a presunção de superioridade moral”. É o desabafo indignado de um petista frustrado, mas vale a citação.
Outro que parece uma Madalena abandonada, chorando pelos bancos do jornal, é o Clóvis Rossi. A coluna dele daria pena se o que está na cabeça dele não fosse mais destrutivo do que aquilo que tem sido feito pela malta governante. Referindo-se à questão dos juros pagos pelo Banco Central e ao ataque feito pelo vice-presidente da República a essa política, ele diz, na coluna de hoje (“Expulsem o Alencar”), que (Alencar) “expõe com mais dureza as contradições entre o que foi o PT e o que é o seu governo do que os mal chamados radicais”.
A própria Folha de São Paulo, que foi cabo eleitoral do petismo sem qualquer pudor, fez publicar hoje editorial na primeira página (“Sem medo de crescer”) no qual brada:
“Manter a economia nos trilhos atuais significa estagnação, desemprego e deterioração da renda, embora agrade àquela fatia francamente minoritária de brasileiros que faz fortunas emprestando dinheiro ao Estado ou intermediando essa operação. De que lado está o governo Lula? Dos bancos ou da produção? Da mudança ou da permanência de um modelo que não consegue responder à exigência do crescimento?”.
Claro que nesse parágrafo condensam-se todos os pressupostos e preconceitos da visão econômica esquerdista, a de que a falta de crescimento se dá apenas pela alta taxa de juros e pelo pouco ativismo estatal, ignorando a imensa carga tributária que asfixia a produção (não há uma única palavra no editorial sobre o assunto!) e que a construção do desenvolvimento é uma questão microeconômica, e não estatal. O ponto central do problema brasileiro é a impossibilidade de formação de poupança na magnitude necessária para financiar o desenvolvimento. A alta taxa de juros, esquecem eles, é apenas o sintoma do excesso de gasto público que deprime a poupança, tornando-a um bem artificialmente escasso. Como sabemos, o Estado brasileiro é o Grande Gastador, valendo-se, para isso, do excesso de tributação e da enorme dívida pública para bancar a sua prodigalidade.
Juros altos são apenas um sintoma do tamanho disfuncional que tem o Estado brasileiro.
O divertido (e trágico) é que os sinistros em economia não perceberam que não há nenhuma saída dessa sinuca de bico que não passe por uma redução rápida, portanto dura e implacável, dos gastos públicos, acompanhada de redução dos impostos. Afora isso, é ficar como um cachorro vira-lata, correndo atrás do próprio rabo. Se tentar reduzir juros na penada a economia explode, haverá fuga de capitais, a crise cambial estoura e a inflação volta, a todo o vapor. É simples assim.
Enquanto isso tramitam no Congresso proposituras para elevar a carga tributária. É suicídio! É loucura! Infelizmente, a nossa classe pensante não se deu conta dos enormes perigos que rondam a Nação. Por não saber qual é o problema real, não serão nunca capazes de formular a devida solução.