Ele estava naquele período da manha em que sonho e imaginação se confundem, quando Jorge, o finado porteiro de seu predio, seu amigo durante quaze vinte ininterruptos anos, lhe aparecia dizendo:
— Eu tento falar com a minha mulher, mas não consigo.
— E ela sabe disso – ele respondia, sem entender como fora parar naquele cena insólita de falar com o amigo morto.
— Sim, as vezes ela ate toca minha cabeça.
Quando despertou, possível ate fosse que sua conversa com o amigo falecido tivesse sido mas longa – mas só lembrava dessa parte do dialogo.
Ficou intrigado, pois tudo fora real demais, como quando amigo era vivo e viviam rindo ate da morte, entre cervejas e vinhos. O amigo o deixava ser.
O que faria com essa experiência? Não era dado a espiritismos, embora desde pequeno fenômenos de sensibilidade o intrigavam; como uma intuição desenvolvida, percepção de quando havia alguém se aproximando, ainda que sorrateiramente. Já era para ele coisa normal.
Neste caso pensou que era pouco provável ser sonho, posto que na visão e na conversa, ambos sabiam suas respectivas condições de vivo e de morto.
Estava diante de um dilema.
Ocorreu-lhe contar o caso a viúva.
Sim, tinha diante de si um mistério que poderia revelar a condição eterna dos seres, e ate´ de universos paralelos.
Mas no intimo de seu coração, metafísica a parte, ficara a indelével condição de ser lembrado pelo amigo, mesmo depois de morto.