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Contos-->Zélia, a alfarrabista -- 22/01/2004 - 15:27 (MARIA PETRONILHO) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


Numa pequena cidade onde outrora vivi costumava ver uma pequenita dos seus oito anos vendendo revistas e livros usados. Tinha uma luz tão triste nos olhos azuis, um rictus tão sério na boca vermelha, um ar de abandono, que me intrigou.
Um dia, ao passas, meti conversa:
- bom dia! Não vendes jornais?
- Não. Vendo só revistas. Queres comprar alguma?
- sim. Olha, vais escolhê-la tu, queres?
Sorriu. Eu também sorri e ficámos as duas por muito tempo a ver as caras pintadas nas folhas, a soletrar as letras nos artigos.
De vez em quando, muito raramente, aparecia alguém, que olhava desdenhoso e, por fim, lá se decidia a levar alguma para ler na fila do autocarro. Mas sempre por metade do preço que Zélia pedira.
Finalmente, decidimo-nos por uma grande revista com muitas cores e figuras de animais e grandes fotos de artistas - tudo o que as revistas dos grandes sempre trazem.
Dissemos "até amanhã", e parti.
Ao outro dia lá estava eu outra vez, a fazer companhia à pequena alfarrabista.
E assim por diante, ficámos amigas. Eu contava-lhe coisas da minha vida, ela coisas da vida dela.
- sabes? A minha mãe morreu há muito, muito tempo. Eu já não me lembro bem dela, mas era muito, muito linda!
- A minha também - disse eu.
- Depois o pai foi para a América, e eu fiquei com a minha madrinha. Dizem que ele ganha lá muito dinheiro!
- Era muito bom, o teu pai, não?
- Não sei, já não me lembro. A mãe, sim, era boa. O pai.... ora! também era bom!
- E depois?
- E depois a madrinha começou a dizer que só queria lá em casa gente que trabalhasse, que eu estava a mais, que não gosta nada que de me ver lá em casa, que sou uma madrinha.... uma noite o marido dela, que não gosta nada de mim, trouxe um grande embrulho e pô-lo num caixote. Ao outro dia chamaram-me mais cedo. Mal abri os olhos, disseram-me:
- Vamos! Já é tempo de ajudares a pagar o que comes! Arriba! E quero isto vendido, estás a ouvir?!
Olhei o caixote da véspera, mas cheio de livros e revistas. Fiquei um bocadinho confusa, mas depois explicaram-me que devia vir para esta esquina, quanto devia pedir por cada coisa, o que devia dizer... e cá estou!
Passaram-se uns meses. Um dia, ao passar pela esquina, vi a Zélia toda risonha e bem vestida.
- Olá! Nunca mais voltei a ver-te!
- Pois! Já há uns meses que não ando a vender, sabes porquê?
- Eu não! Que aconteceu?
- Bom, noutro dia recebemos uma carta do meu pai a dizer que por toda esta semana aparecia cá, de surpresa!
A madrinha ralhou muito, disse que não gostava de surpresas. Mas também ficaram contentes... Até arranjaram o meu quarto! E vesti-me de lavado, um vestido bonito, dos domingos. E desapareceu o caixote. Agora ando sempre por aqui, à espera do meu pai.
- Ele vem para sempre?
- Sim!
E durante uns dias passámos as tardes por ali, a olhar as pessoas e a esperar o pai da Zélia. Contava milhões de coisas sobre ele... Ora, entende-se: um pai que vem da América é um assunto muito importante, tanto mais se vem rico.
- há quanto tempo não vês tu o teu pai?
- Hã... a minha madrinha diz que já vai em três anos.
- Três anos! Mas então, já o não conheces!
- Conheço sim! Ele diz na carta como vem vestido, percebes?
Traz um fato castanho e uma flor branca na lapela. Ah, para se conhecer melhor traz um chapéu de chuva, se o tempo estiver bom.
- - O quê?! Tu disseste chapéu de chuva e fato castanho, e...
- O que é? Aonde vais?
- O teu pai! O Teu pai, minha tonta! Corre. Passou ali em frente há bocado. Reparei no chapéu de chuva porque está a fazer sol e ninguém mais o trazia. Deve estar na paragem. Corre!
Corremos, aos encontrões, deixando atrás de nós uma cauda de injúrias, provocando uma série de travagens bruscas ao atravessarmos a rua, mas chegámos a tempo: lá estava ele, tal qual a Zélia tinha dito.
- Pai! Pai! És tu, pai?
- Zélia! Minha querida filha....
Que contentes estavam!
O pai pegou nela ao colo e não se cansava de beijá-la, de olhá-la.
Filha, minha filha, mas tu estás cansada! Vieste a correr?
Que tal te trata por cá a madrinha, hein? Estás tão magra...
- Ó, muito bem, pai, muito bem!

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