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Erotico-->20. RODOLFO SE INTEGRA AO GRUPO -- 12/07/2003 - 07:24 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Contrariando o costume de deixar aos sábados a loja sob os cuidados dos empregados, na manhã seguinte, conforme me recomendou insistentemente Ana Paula, chamei Raimundo para um entendimento definitivo a respeito dos motivos por que nos escondera acontecimentos tão importantes para a compreensão do processo que nos movia Setembrina.

O velho chegou manso como sempre, sem demonstrar nenhuma apreensão quanto ao que eu tinha para lhe dizer. Talvez se recordasse da mensagem do Zabeu, da noite anterior, segundo o hábito do centro de se efetuarem, ao final das sessões, as leituras de todos os trabalhos psicografados.

— Boa dia, “Seu” Raimundo!

— Bom dia, patrãozinho! O senhor passou bem a noite?

— Otimamente! E você?

— Dormi como os anjos.

— Quer dizer que não lhe dói a consciência por nos ter mantido na ignorância de fatos tão decisivos pro andamento da demanda contra a família de Maria?

— Quer saber por que não contei nada?

— Se não for muito incômodo...

— Incômodo nenhum.

O velho parecia não entender a minha ironia ou era evoluído demais para atribuir aos meus sentimentos valores transcendentais. Prosseguiu:

— Em primeiro lugar, venho fazendo de tudo pra agradar a família que tão bem sempre me tratou. Caso dissesse alguma coisa que trouxesse aflição ou tristeza, eu não me perdoava o atrevimento.

Impacientava-me com a formulação das frases buscadas e rebuscadas, porque sentia que o empregado havia percebido que me magoara e que tinha pensado muito nas perguntas que sabia que eu iria fazer. Se não estivesse tão envolvido emocionalmente, teria suspeitado de que ele estava recebendo ajuda dos protetores. Em todo caso, observei:

— Mas você acabou me deixando numa situação muito ruim. Você não acha?

— O senhor me pegou desprevenido. Não tive tempo pra dizer nem não nem sim. Quando vi, a gente estava conversando com a mulher e a menina veio correndo me abraçar.

Nesse instante, Raul e Rodolfo foram entrando sem cerimônias. Logo perceberam que algo de mais grave estava acontecendo, com certeza pelos semblantes dos dois basbaques que conversavam sem ir ao encontro do que interessava.

Foi Raul quem abriu o jogo:

— Que ocorre?

Recobrei a serenidade, lembrando-me de que fora o causador da periclitante situação, e rapidamente referi os sucessos do dia anterior.

Se disser que Raul foi empalidecendo com as revelações das atividades de Raimundo, estarei sendo infiel à verdade. Ele simplesmente ficou transparente. Resolvi, porém, ajustar as minhas baterias contra meu irmão:

— Por que é que você não me avisou de que, nos autos do processo, foram citadas as somas mensais que Luís dava à amante?

Recuperando um pouco a cor, esclareceu:

— Porque não constam, simplesmente. Constam, sim, no pedido endereçado à cúria, porque a requerente deseja ver ressarcido o prejuízo dos três salários mínimos que afirma ter recebido regularmente mas que não comprova materialmente. Vejo agora que Raimundo era a arma secreta a ser sacada no momento do tiroteio no tribunal. E eu que pensava em utilizá-lo como testemunha da defesa...

Rodolfo, que ouvira atentamente tudo, ponderou:

— Vocês estão dando o caso por encerrado. Onde ficou a certeza de que Luís é inocente?

Contra as expectativas, Raimundo, aproveitando-se da acusação de Raul e da defesa de Rodolfo, foi incisivo:

— No meio espírita, as pessoas ligadas à mediunidade devem confiar que os protetores, um dia ou outro, vão permitir aos espíritos que dêem as informações definitivas.

Rodolfo acrescentou:

— E se não derem de viva voz, se não escreverem, se não assoprarem no ouvido das pessoas estimadas, irão, assim que se juntarem no plano espiritual, fornecer todos os elementos, para que o amor fraterno não fique abalado pelas suspeitas que se levantam sem comprovação. Vamos aguardar pela decisão da justiça dos homens e, acima de tudo, vamos ter fé em que Deus colocará tudo em pratos limpos, quando merecermos adentrar em seu reino de felicidade.

Raul tentou ressaltar um aspecto significativo da exposição de Rodolfo:

— Não há dúvida de que, nesse instante supremo, estaremos fulgurantes em nossa vestimenta de espíritos de luz. Será compreensível, portanto, se desprezarmos o conhecimento das comezinhas atividades humanas inspiradas nos desejos carnais.

Eu mesmo me impregnei do entusiasmo do grupo e aduzi:

— Mesmo bem antes de chegarmos a tão magnífico estágio evolutivo, teremos tido oportunidade de auxiliar a muitos mais carentes de entendimento dos porquês de se envolverem em problemas originados nas emoções e sensações próprias dos terrestres.

Rodolfo, vivaz, aproveitou a deixa:

— Mas o bem deve começar a ser feito já, para podermos alçar vôos espirituais de categoria. Como chegar ao final da estrada, sem passarmos pela metade dela? Vamos pensar que somos aqueles anjos, aqueles querubins e serafins a serviço do Senhor, para realizarmos quanto estiver ao nosso alcance em favor daquela família que perdeu um ganho fixo de vários anos.

Raimundo sentiu que era oportuno dar uma informação:

— Agora que vocês sabem que estou a par da situação de Dona Setembrina, devo dizer que, desde que Luís parou de mandar dinheiro, estão passando por graves necessidades. Orlando anda meio abobado, porque o advogado que está tratando de seu divórcio disse que deverá pagar pensão pra ex-mulher. Ele está desempregado e anda bebendo. Ela é que tem feito o possível, lavando e passando, porque não pode arrumar nada fora, já que tem de cuidar dos cinco filhos.

Raul parecia ser o mais interessado:

— E como é que eles conseguem o que comer?

Raimundo complementou:

— Ainda bem que não pagam aluguel, porque a casa é própria.

Tive um momento de lucidez intuitiva:

— Foi Luís quem...

Mas Raimundo não me deixou concluir:

— Luís ajudou na reforma do prédio.

Raul adiantou-se:

— A casa está em nome de Dona Quitéria, a avó de Orlanda.

Raimundo concluiu:

— Eles comem mal e, quando não dá, vão buscar a sopa num centro espírita lá perto.

Sempre fui rápido nas deduções:

— Quer dizer que são espíritas...

Mas Raul foi além, porque sabia algo mais:

— Eles foram vistos num terreiro de Umbanda, conforme me asseguraram os advogados dos padres. A sua inferência, caro Cláudio, deveria pender para os lados do Raimundo, pois, com certeza, foi quem arrumou as refeições gratuitas e é quem está dando uns trocados a eles.

Descoberto, Raimundo desculpou-se e se retirou. Eu não vi mas suspeito de que estava com os olhos lacrimejados.

Rodolfo pegou o touro pelos chifres:

— Desempregado ou vagabundo, beberrão que seja, Orlando está passando por momentos complicados. Se concordarem, eu dou um salário mensal e cada um de vocês, mais um. Raimundo sabe o caminho e leva o dinheiro anonimamente. Afinal, parece ter ficado evidenciado que Luís estava exatamente fazendo quase isso.

Lembrei-me da bonita mulher, da filha, das outras crianças que não conheci, da humilhação de receber o óbolo das mãos de Raimundo e da miséria da mesa que um dia abrigara meu irmão e me decidi:

— Concordo, sem objeções.

Raul foi menos cordato:

— Vou aceitar a premissa da ajuda, enquanto a Igreja não for acionada pelo tribunal. Depois disso, a gente suspende o auxílio. Para não me acusarem de “morrinha”, peço a Rodolfo que dê emprego ao Orlando, fazendo o possível para que não freqüente nem o bar nem o Candomblé.

Inteligentemente, sentindo que vencera a sua proposição, Rodolfo partiu para um aspecto jurídico implícito na fala de Raul:

— Eu não entendo de questões do Judiciário, entretanto, o bom senso me avisa que o juiz vai dar ganho de causa aos sacerdotes. Afinal, como é que se pode responsabilizar alguém que morreu no acidente?

Raul mordeu a isca:

— Esse é um problema que tenho discutido com um colega mais enfronhado nas pendências em que se solicita ressarcimento de prejuízos. O que precisaria ficar claro na mente do meritíssimo é se Aristides estava ou não no exercício de sua função sacerdotal. Caso contrário, o pedido de indenização haverá de ser solicitado à família dele.

Rodolfo foi um pouco além:

— Agora que estamos vendo que Maria não vai ter o arrimo moral da Igreja e que Raimundo não vai prestar depoimento favorável, sugiro que o Doutor Raul passe a incumbência da defesa a esse seu colega, para você poder dar livremente testemunho em favor de Luís.

Apoiei incondicionalmente a lógica dos raciocínios do expositor:

— Também concordo com isso.

Saímos os três para contar as novidades às mulheres, congregadas em meu lar por convocação telefônica.

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