Era apenas um dia como outros. Daqueles sem grandes novidades em que a vida é simplesmente uma rotina. Acordar, tomar o café da manhã... Arrumar-se para o trabalho como se fosse um autômato, qualquer coisa assim. Um dia que não prometia nada de novo nem no front, nem na vida. Apenas mais um dia...
Olhar-se ao espelho, portanto, era apenas um ato mecânico... Tentar corrigir imperfeições que a mãe natureza insiste em colocar em seus filhos só para vê-los tentar melhorar... "Preciso cortar os cabelos", era o máximo que conseguia pensar ao olhar sua face implacavelmente refletida naquela superfície de vidro. Nada mais.
Uma roupa qualquer, um sapato qualquer, a pasta de sempre... Ligar o carro como todo dia, engatar primeira, tirar da garagem e molengar no trânsito sem reclamar do engarrafamento. Pra que? Buzinar, reclamar não fariam as sinaleiras abrir mais rápido...
Tudo igual a todo dia... O mesmo serviço. No máximo um ou dois pensamentos... algo como "estou ganhando pouco" ou "preciso mudar de emprego". Que mudança? "Melhor ficar como está"... Almoço naquele restaurante a quilo de sempre. Comendo a mesma salada de repolho... Arriscar? Pra que?
Mas nem tudo é tão igual quanto parece... As vezes as surpresas acontecem, e aconteceu naquele dia em que tudo parecia igual como sempre. Mais tarde... bem mais tarde... Ao chegar em casa, depois de um dia tedioso de rotina, acabou rendido por assaltantes... Sequestro relâmpago... Perdeu suas minguadas economias em um banco 24 horas. Teve seu carro levado embora, misteriosamente. Nunca mais foi encontrado. Dizem que deve Ter sido levado para o Paraguai... Tomou dois tiros, foi largado num matagal.
Sobreviveu por milagre... Alguém passava perto e ouviu gemidos... Conseguiu socorro a tempo. Apaixonou-se pela enfermeira, uma morena engraçadinha e carinhosa que lhe dava comida na boca. Depois de seis meses de paquera, namoro, noivado, se casaram. Precisou de dois tiros para dar uma virada e fazer de sua vida mais do que uma sucessão de dias, uns iguais aos outros...
