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Erotico-->5. MUDANDO DE COR -- 02/06/2003 - 07:09 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Lourival lembrava-se das alterações que se procederam em sua convivência social. Não se recordava, ao tempo em que ingressara no candomblé, de jamais ter tido contacto com pessoas que não fossem brancas. Quando muito, no comércio de peles, às vezes, vendia algum produto para pessoas de cor afortunadas. Mas era raríssimo.

Ao adentrar o sagrado ambiente do terreiro da umbanda (nunca soube distinguir com exatidão as diferenças entre os cultos), avaliou logo que precisaria mudar os conceitos a respeito das raças, se quisesse aceitar tais pessoas como irmãos.

No catolicismo e no protestantismo, isolava-se, aninhando-se em canto absolutamente discreto. Só desejava mesmo aparecer para as pessoas mais íntimas e que lhe interessassem do ponto de vista comercial. O mais eram flertes ou namoricos camuflados, pois não gostava de correr riscos inúteis nem de fazer perigar a boa conceituação que as mulheres conseguiam naqueles ambientes religiosos.

No candomblé, desde logo, sorriu-lhe a possibilidade de maior liberdade no campo sexual, conforme ia percebendo que as pessoas não tinham história conhecida, ficando muitas delas completamente afastadas das demais, assim que saíam no recinto das orações e demais trabalhos.

Muita gente, inclusive, tal como ele no início, assistia do lado de fora às cerimônias públicas, ficando-lhes vedadas as relativas aos iniciados.

Mas havia uma médium...

Engraçou-se por jovem quinze anos mais nova que sua Margarida e passou a cortejá-la, nos limites dos temores da estranheza dos cultos.

Queria e não queria atrever-se, mas eram tantas as solicitações dos olhares e tantas as malícias dos requebros que juntou forças para pedir as orientações, para adentrar no campo das manifestações das entidades protetoras do centro espiritual.

Foi informado de que precisaria passar por inúmeros preparativos, o que não suspeitava, pois tudo lhe parecia totalmente falso. A ingerência das bebidas alcoólicas e as inebriantes queimas de incensos e dos charutos, associadas à alucinação dos tambores, era-lhe a evidência de que ninguém poderia refletir sobre que fazia naquela barafunda.

Mas submeteu-se, mesmo porque estava, havia bastante tempo, afastado da esposa, encontrando-a de quando em vez nas dependências da casa para arrufos e querelas. Por essa época, até para as brigas não tinham ânimo.

Assim, pôde desenvolver-se em área insuspeita, sob os conselhos diretos do orixá responsável pelo desenvolvimento dos trabalhos.

Junto ao coração da irmãzinha pôde infiltrar-se, prometendo-lhe instalá-la e à família em casa de alvenaria, em bairro pobre mas muito mais digno do que a favela em que residiam.

De fato, naquela época, os negócios, por incrível coincidência, melhoraram muito, pois era o que pedia com mais insistência junto aos benfeitores do terreiro. Toda recompensa e demais sacrifícios que lhe eram pedidos, fazia questão de pagar sem titubeios e sem desafios, pois evidenciava-se-lhe que havia forças superiores, transcendentais, a comandar os atos humanos, ajeitando para que os desígnios dos protegidos dessem certo.

Só não foi morar com a amante porque, desde cedo, se patenteou que as diferenças culturais seriam obstáculos intransponíveis. De resto, as exigências iriam crescer, inevitavelmente, e ele queria ficar a coberto de possíveis represálias no campo social em que vicejava.

Não lhe parecia que nada daquilo fosse sério. Em pouco tempo iriam cansar-se um do outro. Era o que lhe apontava a experiência.

Mas Felícia não dava mostras de saciar-se das carícias e jamais lhe solicitou nada. Os familiares repreenderam a moça, mas aceitaram as ofertas com boa vontade, não levando a Lourival qualquer manifestação de desagrado. Todos freqüentavam o mesmo culto espiritual e não haviam recebido aviso para que procedessem em desacordo com o arranjo proposto.

Nem por isso deixaram de investigar a vida pregressa do herói, para concluírem que seria uma rocha no que se referisse a desfazer legalmente o matrimônio, fundamentado, aliás, em legítimo congraçamento de bens.

Este teria sido período de muita felicidade, não fossem os parentes da esposa. Se houve investigação de um lado, do outro houve plena devassa das atividades do coitado, que, inesperadamente, se viu nas mãos de uns pilantras que desejavam amealhar sem trabalhar.

Lourival, porém, sabia com quem lidava e não opôs muitas resistências às pretensões, armando-lhes, contudo, feliz ardil, para o desvelamento das indecorosas propostas. Não deixaria a pele na mão dos assaltantes. Iria apontá-los à execração familiar, no íntimo desejo de vingar-se da consorte, que o atenazava com doentios ciúmes.

Parou para refletir a respeito dos conceitos sobre a esposa. Chamara de “doentios ciúmes” àquelas cenas de vulgar dramatização de acusações? Estava sendo condescendente com as más intenções. Margarida o que desejava mesmo era forçar que pedisse separação, para poder ficar com quinhão maior das propriedades...

Começou a desfilar o que possuía à época. Não era tanto que configurasse grande fortuna. Propriedades sem muito valor e a loja, onde trabalhavam mais de vinte empregados. A conta bancária não era tão recheada e o mais estava em sociedade com os irmãos. Margarida nada acrescentara de seu e era isso, com certeza, que a fazia prender-se a ele tão arraigadamente.

Começou a se lembrar das reconciliações e dos transbordamentos de paixão sexual. Era quando se esquecia dos desvios e dos insucessos das afeições passageiras.

Eram de puro amor os seus transportes de felicidade e de luxúria...

Começava a estranhar os empuxos sensuais que estava sentindo. Parecia-lhe crescer o entusiasmo amoroso, como se, naquele ermo, junto às tumbas, às cruzes, aos salgueiros e ciprestes, defunto já, pudesse sentir o fogo juvenil das carícias.

Quis apalpar-se mas não sentiu o corpo. Olhou para as mãos. Não havia mãos. Não era possível! Lembrava-se de ter bebido daquela asquerosa água do vaso, tendo feito concha com as mãos. Quis arregaçar as calças, para enxergar os pés. Não havia calças, não havia pés. E quando puxou o cordão luminoso que o transportou para junto do cadáver? Não fora com as mãos?

Impacientava-se. Será que a materialização das lembranças eróticas se dava apenas no íntimo do ser? Onde estava o perispírito, que não conseguia localizar? Sem dúvida, ele (Lourival) bem que estava ali. Pensava e, portanto, existia. Mas não se concretizava...

Achou que desesperar-se seria dar aos seres em piores condições oportunidade para se aproximarem. Imaginou que os pensamentos não eram os mais puros e, por isso, poderia estar sofrendo de alucinação, como quando sonhava pesadelos horríveis.

Lembrou-se das leituras espíritas, das lições dos instrutores do centro. Lera André Luís. Tentou avaliar as personagens para ver se alguma sofrera a mesma desdita. Nada.

Deflagrou, então, sentido pranto, chamando Felícia em altas vozes, elaborando perfeitos sistemas fônico e auditivo para o efeito. Mas não atinou com a incongruência. Tampou a vista com ambas as mãos e não percebeu que o fizera.

Bateram-lhe no ombro e ele despertou para a realidade.

— Chamou, querido amigo?...

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