Que fazes tu, homem, sentado nesse banco com tão medonha expressão de tristeza na face? Por que razões te achas tão abatido? Tua alma está cinzenta, crua de sentimentos, dependente de uma recordação que o tempo, bem devagarinho, vai fazendo desbotar? Foi-se o tempo em que as pessoas te achavam alguém interessante, cativante mesmo quando te tomavas de inexatidões filosóficas e querias ser o dono da verdade?
Alguma vez disseste aos teus filhos que o mundo foi criado em sete dias por Deus e que hoje, depois do absurdo avanço tecnológico, o homem pode destruir a obra divina num único dia? Tens razão por estares tão deprimido.
Eu também sonhava com um mundo sem perigos, sem dissimulações de sentimentos, sem artimanhas de pessoas que nos cercam querendo apenas tirar proveito de nossas boas intenções. Meus filhos não são mais os anjos que alegravam a casa. Será que estás tão apático porque as tuas crianças deixaram de ser crianças, indo cada uma para o seu lado, casando, descasando, indo estudar em outros estados? Estás só com tua mulher, e ela aparentemente não te ama mais como há trinta anos? O que fazer? Deves comprar as flores iguais a da primeira vez? Deves beijá-la com a mesma paixão do primeiro beijo? Deixar-lhe um sorriso com a mesma inocência do instante em que teus olhos brilharam ao vê-la, linda, jovial, passeando por entre dezenas de estátuas no burburinho das ruas?
Não! Não me digas que estás assim porque teu grande amor partiu! Deixou-te por um outro ou deixou a vida? Se te deixou por um outro, tu também poderás encontrar consolo em outro coração. Porém, se tua tristeza nasceu com a morte de quem amavas, então, amigo, esse teu dia é o Dia mais negro que possa existir, de lágrimas torturantes, de gemidos inexprimíveis, de lembranças que se tornam, ao mesmo tempo, o motivo dessa dor presente e, não sei depois de quantos anos, das alegrias futuras, quando as boas lembranças de vocês vivendo e sonhando juntos, os momentos de regozijo por algum fato engraçado, uma piada, um lance de jovialidade qualquer, farão retornar a imagem daquela que se foi.
Se estás cercado de angústias infernais, sabe que ninguém é forte diante da morte. Não estamos prontos pra enfrentá-la. Não fomos criados pra morrer nem ver morrer os que muito amamos. Ansiamos por manhãs que não tenham fim, por tardes eternas em que as flores sempre vicejem e perfumem, por noites de lua cheia, tão vigorosa que nossos olhares e sorrisos se encham de superabundante brilho.
Por que nossos amores vão embora? Por que nos deixam órfãos de seus ternos afetos? Por que temos que abrir mão à força do calor dos abraços quando a distância e a saudade de quem amamos fazem-nos suspirar pelo reencontro?
Bem amigo, como nada me respondes, talvez estejas abatido por algum motivo menor, talvez indigno de minha sincera preocupação. Até desejo que seja assim, pois, se muito te falei e nada me respondeste, isso em nada aumenta a minha própria tristeza, pois podes muito bem chegar em tua casa e desfazer os laços que te prendem nessas tuas cadeias tristonhas. Eu é que jamais terei novas alegrias, e já te declarei as causas, pois são as mesmas que me motivaram a te confortar. Adeus, amigo. |
