Invasão
maria da graça almeida
Outra vez a poesia
bate-me à porta.
Insiste em adentrar.
Confortável, instala-se.
Atrevida, quer viver
às minhas custas.
E bem que o consegue.
Brusca, abre-me
o compartimento da emoção
e degusta-me as iguarias.
No tempero do sofrimento
refoga antigas paixões,
remói velhas melancolias.
Abusada, estira-se à cama
e macula-me os lençóis.
Sob tal dominação,
minhas mãos rendem-se
e, reféns da poesia,
para sempre se curvam,
depondo-lhe as certezas,
a insensatez, as dúvidas.
Pelo útil ou pelo fútil,
bendita seja tal invasão.
Certos versos
que me saem pelas palmas,
nas almas se eternizarão...
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