Mencionamos já os três ferozes cães de guarda. Precisamos descrevê-los para demonstrar o quão perigosos eram para qualquer pessoa.
Brútus, César e Mocinha eram da mesma ninhada, da amável espécie dos cães fila. Entretanto, permanecendo fechados durante todo o dia, sem treinamento especializado para se afeiçoarem às pessoas, aprenderam a ser selvagens.
De grande porte, com menos de três anos, os três ficavam separados em seus canis, unindo-se somente à noite, quando se assenhoreavam do terreno, dominando toda a parte dos fundos e do jardim, latindo fortemente para qualquer pessoa, animal ou veículo que farejassem.
Lutécia não encontrava coragem para sair quando estavam soltos. Apenas Juvenal, que os alimentava uma vez por dia, se atrevia a fazer-lhes uns afagos, ainda assim com as focinheiras e um de cada vez, sob a vigilância de Tiago ou de Tadeu, únicos cuja presença os cães aceitavam.
Quando da construção no fundo do terreno, por pouco um dos pedreiros não acabou atacado por eles, entrando inadvertidamente enquanto estavam soltos, apesar de ter sido bem avisado pelos tratadores. Foi tão grande o susto, que não voltou mais ao trabalho. Salvaram-no os moços que se aprestavam para recolhê-los.
A criadagem tremia de medo e não se aventurava jamais para perto das grades, embora não fossem recebidos com ferocidade. É que, de pé sobre as patas traseiras, eles chegavam quase à altura dos altos portões de ferro, maiores do que qualquer pessoa da casa.
Naquela semana decisiva para as nossas personagens, estando a cadela no cio, Brútus e César, nomes escolhidos por Renato, que tinha especial admiração pela cultura romana dos tempos clássicos, haja vista o nome dos filhos, estavam sobremodo inquietos, principalmente pela presença do lado de fora dos muros e das grades de uma grande quantidade de animais das vizinhanças.
Em tais circunstâncias, Mocinha permanecia presa noite e dia, ela mesmo ficando muito agitada, desejosa de dar curso aos apelos naturais do organismo.
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