Usina de Letras
Usina de Letras
176 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62269 )

Cartas ( 21334)

Contos (13267)

Cordel (10450)

Cronicas (22539)

Discursos (3239)

Ensaios - (10379)

Erótico (13571)

Frases (50658)

Humor (20039)

Infantil (5450)

Infanto Juvenil (4776)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140816)

Redação (3309)

Roteiro de Filme ou Novela (1064)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1961)

Textos Religiosos/Sermões (6204)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Artigos-->Tarzan, jane, chita, Romeu e Julieta -- 25/10/2000 - 22:13 (Fatima Dannemann) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Tarzan, Jane, Chita, Romeu e Julieta







Realmente eu não sou saudosista. Pelo contrário. Mas, quando li nos jornais que o cine Rio Vermelho (em Salvador, Bahia) foi transformado em casa de show, não pude deixar de lembrar dos velhos tempos. Nem tão velhos assim, aliás. Década de 60, lá pela segunda metade, quando eu e meus irmãos não perdíamos um filme na sessão da tarde do velho cinema. Não que os filmes prestassem... Eram coisas assim como Tarzan, Ivanhoe, uns filmes velhíssimos do tempo do ronca, com Johnny Weissmüller que eu até hoje irreverentemente chamo de João Vai Sem a Mula e a molecadinha da geração pós-moderna se acaba de dar risada... Os filmes eram tão velhos, tão velhos que, lá pelas tantas, no meio da história, invariavelmente a fita quebrava. Ouvíamos o estalo e ficava tudo às escuras na sala de projeção.

Aí começava a molequeira. Meu dinheiro! Meu dinheiro! A gritaria tomava conta do cinema até que a máquina consertava e continuava a projeção. Mas, a molequeira continuava de outro jeito. Gritando êêê quando Tarzan aprontava alguma com os inimigos, dando fiu-fiu quando ele beijava Jane. Tudo absolutamente ingênuo, apesar dos bem-comportados sempre torcerem o nariz para a gente.

Quando eu lembro de tudo isso, penso que o Cine Rio Vermelho está para mim e meus irmãos (hoje todos adultos, profissionais, trabalhadores e pais de família, antes que alguém pense o pior da molecada lá de casa...), como o Cine Oceania esteve para a geração de meus tios (Evinha, Hernani, Roskild, Carlinhos e Eduardo). Pois é, no finado Cinema Oceania, do qual muita gente nem se lembra que existiu, meus tios (hoje adultos, formados, trabalhadores e além de pais de família avós...) também aprontaram muitas.

O melhor do cinema não eram as instalações, bem ruinzinhas... Cadeira de pau, ar-condicionado invariavelmente quebrado e pulga para dar e vender (antes da reforma, compreenda-se). Mas o fato de ser perto de casa. Naqueles tempos, não tinha pivete. No máximo, moleques de rua que eram amigos da gente. Só ir ao cinema andando sem os pais para dar regulagem, era uma farra. Chegávamos ao cinema, era aquela fila de crianças, pré-adolescentes, adolescentes, aborrecentes, chatolescentes, etc e tal para entrar. Dizíamos sempre ao porteiro o ingresso está lá atrás... Ou o bobo acreditava, ou era mesmo muito bonzinho pois deixava todo mundo ir passando (mas quem ficava para o fim, sobrava, pelo menos a sua tinha que pagar mesmo...). Eu até que não fazia muito isso não. Ficava com pena do porteiro e da bilheteira que, com certeza teriam que pagar o ingresso depois.

Um belo dia, fecharam o cinema para reforma. Quando reabriu, estava uma belezura. Fim do calor (tinha um ar condicionado beleza), fim das cadeiras de pau e as pulgas com certeza tiveram que fazer as malas e se mudar para outro cinema. Até a programação ficou de luxo... Foi aí que eu assisti Romeu e Julieta. Não o modernoso com Leonardo di Caprio, mas o de Zefirelli. Um xororô dentro do cinema. Prometi levar um balde para aparar as lágrimas de minha irmã Lydia (que como toda canceriana é boba e chora até vendo Lassie).

Esta fase de ouro do cinema Rio Vermelho demorou mais um pouquinho. Lembro que até os anos 80, ele funcionava regularmente e tinha uma programação razoávelzinha. Talvez tenha perdido na concorrência para o Cine-Teatro Maria Betânia que passava filmes de arte (alguns meio chatos, apesar de eu até gostar do gênero). Um belo dia, o Rio Vermelho fechou... Eu passava pelo cinema e me perguntava se algum dia ia vê-lo reabrir para glória da pirralhada de hoje que pode até não saber quem é Tarzan, mas tem seus próprios heróis e seus sonhos de cinema. Só torcia para não virar supermercado como aconteceu com o Cine Amparo, do Engenho Velho de Brotas, um poeirão que eu não conheci mas onde meus irmãos, Marcelo e Carlinhos iam ver filmes de cow-boy. Ou então sumir do mapa, como outros que eu nem sei o nome.

Pois é, o Rio Vermelho ficou descinemado... Um bairro que se diz cultural, coisa e tal, perdeu seu cine-teatro para um bingo e seu cinema levou anos fechados e alvo de boatos maldosos envolvendo seitas protestantes e pentecostais. Aí, soube que o cinema virou casa de show... Até aí, tudo bem, só que isto aconteceu justamente quando a cidade inaugurava um multiplex, complexo de 12 cinemas no shopping da cidade moderníssimo. Prêmio de consolação? Maneira de desviar a atenção do público para o fato de mais uma de suas casas de exibição tradicionais mudar de ramo? Mera coincidência?

Seja como for, melhor do que virar ruínas. Pelo menos o prédio do cinema está preservado e continua um espaço voltado para as artes. Pior são os outros cinemas que sumiram na poeira e nas memórias e que não tiveram melhor sorte. O Capri, onde fui barrada ao tentar ver um filme impróprio até 18 anos quando eu era de menor, virou hotel. O Aliança, que só passava filme de sacanagem, virou uma loja de confecções. Até hoje lutam para revitalizar o Cine Roma, na Cidade Baixa, e o Cine Brasil, na Liberdade. E alguém se lembra do Popular, que só passava filmes de arte? Nada contra os multiplex, que são muito bem-vindos. Mas, a memória da cidade merece mais consideração.



(Nota da Autora: hoje o cinema virou igreja de crente)
Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui