De Apolo, tua beleza emprestei,
Dei um toque de guerra de Marte,
Acresci a inteligência sagaz de Minerva,
A terna sapiência de Metis.
Mesclei a doçura de Gaia
Com a fogosa paixão de Afrodite
E a cálida serenidade de Rea.
Fiz-te um Deus-homem personificado.
Forjei-te na borbulhante caldeira da mente,
Meu mais profundo poço de ilusões,
E, a ti, entreguei meu coração.
Mas, que medíocre criatura eu sou!
Quem eu não inventei, me desprezou.
Não quis os raros pedaços de realidade
Que iluminam minha triste escuridão!
Deixou-me perdida numa insólita solidão!
Afogada na humana ignorância da criação
Que se encontra apartada da social razão!
E tu, estado de tão pura perfeição,
Teus lábios, ambrosia dos céus,
Teu corpo, força física da Terra!
Teus olhos são como segredos do mar,
Teu amor, delicioso fogo do Inferno.
Ah! Homem-Deus da perdição,
És o tesouro de minha alma, não guardado!
Pois, quem sou eu senão mulher,
Com qualidades e iguais defeitos?
Como poderia viver contigo?
Em eterna insegurança,
Nas gélidas garras do medo?
E, se te afastasses do meu olhar,
Domaria eu, o letal veneno do ciúme?
E, se te perdesses em outros braços,
Buscando tua semelhante excelência
E, que isto se tornasse tua exigência?
Vasculharias, cruel, no Olimpo,
Uma companheira de igual perfeição!
Tu, amor, cresceste em demasia,
Tornando-me tão ínfima, desprezível...
Não, meu adorado, não pode ser.
Hades nos receberia sorrindo feliz,
Gozaria múltiplas vezes de nossas contendas!
Viveríamos em tumultuada convivência!
Deixo-te, então, profundamente magoada,
Por ser perfeito demais para mim!
Claudia O Hama - SP 30/08/03
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