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Teses_Monologos-->Da jukebox à vitrola de ficha (2) -- 14/09/2002 - 16:55 (José Pedro Antunes) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Defronte da estação, não tenho como não me lembrar de cidades européias por onde passei. Nice, no sul da França, é uma delas. Imagino que nela resista ainda o cenário que me ajuda a recompor uma Araraquara mítica, uma cidade que só me foi dado contemplar em ruínas.

[Para Peter Handke, o escritor conduz o seu barco sobre as águas de um lago e tenta adivinhar uma cidade submersa. O tradutor atravessa esse mesmo lago, mas já pode divisar as ruínas da cidade por sob a superfície da água.]

Uma fileira de casas antigas, descascadas, hotéis baratos, um que outro detalhe art nouveau fora de lugar, bares sebosos, rebordosas incríveis, compondo um como que bas fond araraquarense. Bem no centro da cidade.

Ali, com seu ruído característico e inesquecível no interior do aparelho, cada compacto simples era uma lágrima que rolava, um corpo que despencava, um boleraço daqueles tinindo no que restava daqueles tímpanos, trilha sonora de tragédia. Foi o final de uma época grandiosa. E que não terá tido o seu cronista?

Quantos souberam da resistência heróica daquela jukebox em meio a passageiros e funcionários da via férrea, entre bêbados, rufiões, prostitutas e um que outro forasteiro curioso, incapaz de medir os riscos a que expunha a própria pele?

Terminava um capítulo da história econômica do país. Nos últimos tempos, tão reiteradamente se aventa como se rejeita a idéia de desviar os trilhos que cruzam o centro da cidade, ou de criar um metrô de superfície. Alguns abnegados tentam arrancar a gloriosa equipe de futebol da Ferroviária da lenda em que se perdeu, num passado em que, rodeados por seus respectivos séquitos, Sartre e Simone de Beauvoir chegaram ou não chegaram a cruzar com Pelé na esplanada desaparecida.

Vigia ainda a história dos discos de vinil. Ah, saudosos LP’s, valorosos compactos duplos ou simples, quem haveria de dizer que tudo haveria de ser assim tão súbito?

Dia desses, num dos postos de abastecimento da cidade, com sua prestativa lojinha de conveniências, eis que me surge ante os olhos o que julgava impossível. Sim, ela mesma: a jukebox. Apenas, atualizada. Os compactos de vinil haviam cedido espaço ao charme brilhoso, à aura futurística dos CD’s.

Assim – um tradutor não descansa - tratei de dar continuidade a uma de minhas tantas pesquisas em andamento. Cada palavra desconhecida ou problemática acaba por ocupar-me os neurônios por tempo impossível de ser determinado. Antenas ligadísimas, alerta máximo, o tradutor é antes de tudo um obcecado. Quando a ocasião se lhe oferece, ei-la que ressurge incontinenti, a palavrilha aquela, a saltar para fora da caixa craniana, a impulsioná-lo em direção às migalhas de informação que ainda sobejem em mesa que já foi lauta.

Perguntei ao rapaz do balcão como aquilo se chamava. Não, ele não sabia. Mas era só meter ali uma ficha e escolher: sertanejo, pagode, axé. Tinha de um tudo. Que aproveitasse enquanto era tempo, pois o aparelho ali estava só de passagem. Era coisa da zona, sei lá. Iam levá-lo pra uma casa lá no Cristo.

[A zona do meretrício, em Araraquara, fica ao pé da imagem do Cristo Redentor. Dizer "lá no Cristo" significa dizer "na zona".]

[continua]
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