Renascença
Europeia: mercadologia mas não só
João
Ferreira
31 de agosto
de 2019
A União Europeia, que é o maior
conglomerado político e econômico do mundo, nasceu do Mercado Comum Europeu. A
Europa ainda hoje é um grande mercado: Europa Market. Tem organização,
produção, sistema bancário unificado, distribuição, democracia, ausência de
fronteiras, livre circulação, cidadania. Quando no ano 2016 tive a oportunidade
de passar uma temporada em Portugal, calhou de ler um artigo do filósofo e poeta Ramón Andrés publicado no jornal espanhol El País, datado de 28 de dezembro de
2016. Esse artigo me chamou muito a atenção e me levou a algumas reflexões. Reflexões
que diziam respeito à nova forma de apresentação da Europa e que se tornavam interessantes aos olhos de quem gosta de conhecer
e refletir. Ramón Andrés é um cidadão espanhol, nascido em Pamplona
em 1955. Suas considerações eram dirigidas para o lado mercadológico, aspecto que é quase um bilhete de identidade
da própria União Europeia. Ao mesmo tempo Ramón Andrés alertava para o perigo
do parasitismo assumido pela grande maioria dos cidadãos que se contentam com o
simples acesso e fruição de bens materiais e esquecem a necessidade que há de
se evoluir e de se dar às sociedades humanas a catarse purificadora que lhes
permite a renovação mental e uma nova dinâmica de vida. Julgamos essencial para
avaliar esta Europa e sua regeneração o seguinte juízo de Ramón Andrés:
"Contra o pessimismo e a
perversão de uma Europa de mercadores há que buscar nas entranhas da arte e do
pensamento os pilares de sua regeneração." Na altura em que li o artigo de
Ramón Andrés, lembrei certas fases que Portugal atravessou também. Fases de prosperidade
seguidas de momentos e períodos de decadência. A Fênix Renascida no século XVII
foi um exemplo. Outro exemplo foi a Regeneração no século XIX. O exemplo mais
recente deu-se com a Renascença Portuguesa no período de 1912 a 1915. Em qualquer tipo de Renascimento
que se analise, nos vários países ou comunidades, ao mesmo tempo que se
reivindicam melhores condições de vida, quer se trate de Europa Market ou de
qualquer outro sistema econômico, permanece o dado fundamental a não esquecer: o
homem, a pessoa humana, em seu conjunto. Dizia Ramón Andrés: "É
necessário renovar e "dar uma incensada" nas doutrinas que por aí
proliferam. O mercantilismo é inevitável. Mas construamos ao lado do mercado
"nossa tenda espiritual". Nela será salutar colar nas paredes
internas da tenda os lembretes que mantenham nossa alma viva. Por exemplo:
"Show de música", "Palestra sobre doutrinas cristãs", "Debate
sobre o budismo e outras religiões orientais", "O que é o
espiritismo", "O texto da nova Bíblia de Jerusalém", "Como ter
paz interior", "O valor do silêncio", "Como educar nossos
filhos", "Amor na vida", "sejamos gente fina com alma
renascida"...etc. Duas coisas claras aparecem nas
reflexões de Ramón. De um lado, a evidência de que existe uma Europa mercantilista.
De outro lado, a certeza de que na outra ponta, e para além desta mentalidade
mercantilista, existe na alma do homem europeu uma vontade de renovação, que poderemos
constatar na busca de novas formas de vida, presentes na arte e no pensamento que
são fontes permanentes de renovação. Nestas fontes permanentes de renovação se
descobre a outra face de que a Europa é rica: suas formas de filosofia, suas
correntes de espiritualidade, sua teologia, suas escolas e doutrinas de
pensamento, sua arte em várias modalidades,
sua tecnologia, suas religiões, seus misticismos, suas tradições místicas e
espirituais. A Europa deve ficar atenta a estas duas almas que a sustentam e que
fazem sua riqueza. Uma que leva a bandeira da realização material. A outra que
renova e encanta pela elevação do pensamento e da arte com os melhores reflexos
no condicionamento da qualidade da cidadania. São duas almas. Com uma só, a
Europa, como qualquer outra comunidade humana, ocidental ou oriental, capengará.
Com as duas, irmãmente unidas,o cidadão caminhará sempre mais seguro amparado pelas
duas fontes de necessária sustentação.
Jan Muá |