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Cronicas-->Bowle -- 15/12/2002 - 00:53 (Renato Rossi) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Antes de mais nada permitam esclarecer que em nenhum dos vários dicionários que consultei tanto em papel como em meio magnético, apresenta o significado da palavra bole. Ainda acho que em português é assim que se escreve. Pronuncia-se o o como ó. Mas como verão, sou voto vencido. Nem mesmo o velho Aurélio que a tudo abençoa, lembrou que bole existe e, desta forma, prejudica as comemorações de ano novo de milhares, talvez milhões de pessoas. Tentei colocar um u após o ó, depois tentei com um w e, nem mesmo o velho Webester´s deu conta do recado. Inajá salvou-me com seu "Comer Bem" da famosa Dona Benta. Ela coloca o w, formando bowle e o apresenta na seção Ponches e Grogues, na página 474 da 65ª edição, revista e experimentada. O ponche sim está em todos os dicionários e um deles avisa derivar do inglês - punch - que por sua vez teria origem no sànscrito. Ai já é por conta do dicionário inglês do Lotus Word Pro.

Pois o fato concreto é que há famílias que não podem passar a noite de ano novo sem o tradicional bowle. Pra quem não sabe, bowle é aquela bebida preparada com vinho, champanhe, cidra, guaraná e qualquer outro líquido com bolhas que esteja disponível. Deve-se contudo evitar shampoos e alvejantes pois na verdade estes itens produzem espuma e não bolhas, como exige o bom bowle. Além da bebida, naturalmente, não podem faltar as frutas cortadas em pequenos pedaços. Na realidade, as frutas são a alma do bole. Maça, pera, laranja, abacaxi, ameixa, entre outras. Não, melancia não pode. Jaca também não. Só frutas discretas, elegantes, cortadas em pedaços minúsculos, mas capazes de ser capturadas com um palito. Guarde a melancia e a jaca para o pagode no dia 1º, após o almoço. Fica mais adequado. Quando o bowle é reformado para o almoço do dia seguinte, pode. A esta altura pode tudo. Mas na véspera do novo milênio há que manter a compostura.

Há quem chame bowle de ponche, mas isto não parece justo. Bole é bole, ponche é ponche, como todos sabem. Como comentei, Dona Benta é uma delas. Dá receita de ponche e dá receita de bowle. De minha parte, se antes já achava que são coisas diferentes, valho-me agora da sábia Dona Benta.

Pois bem. Esta iguaria líquida é preparada em um tigela grande, chamada bowleira - Dona Benta chama de poncheira. Grande, nada com menos de 50 centímetros de diàmetro pode realmente ser chamado de bowleira. Quando a festa de ano novo não ocorre na própria casa, surge o dilema. Não ir e ficar em casa desfrutando o bowle ou ir e levá-lo, dividindo assim com todos as alegrias de uma boa taça ou caneca de bowle. Lembro que este ano não haverá a apresentação do ET, restando apenas o show do Faustão. Sugiro então que não se deixe de ir à festa e que o bowle então seja levado. A menos que a festa seja em uma casa que cultive a tradição da mesma forma. Não sendo, não há porque não levar o próprio bowle.

O problema então é o transporte e há duas formas de pensar, ambas merecedoras de todo o respeito. A primeira faz questão de levar o bowle já pronto, com receio de que o tumulto normal nestas ocasiões impeça a correta mistura. Vai que ele se engane e coloque o champanhe antes do vinho. Há ainda o fato concreto de que as frutas devem fazer um estágio mínimo de duas horas dentro da mistura, antes que seja servida. Só assim, vão adquirir e ceder gosto. O transporte deve ser feito com todo o cuidado, motivo pelo qual se recomenda que a bowleira seja cuidadosamente instalada sobre as pernas da senhora, assumindo-se que seu marido siga ao volante. O sinto de segurança deve contornar a bowleira protegendo a todos. Pode ser ao contrário, a bowleira nas pernas do senhor e a senhora ao volante, embora isto arranhe ligeiramente a tradição. A senhora nas pernas do senhor e a bowleira ao volante não é socialmente aceito. Pelo menos não antes de uma meia dúzia de taças do bowle. Naturalmente, quem vai ao volante haverá de ter todo o cuidado para que o precioso líquido não saia da bowleira gerando estragos na roupa de festa de toda a família, sem falar na capa do banco do automóvel, presente do dia dos pais. Toda tigrada - uma beleza. Repito, insisto, todo cuidado é pouco. Uma tragédia está à sua espreita em qualquer curva do trajeto. Se a sua bowleira tem tampa, não se iluda. A tampa serve para evitar moscas, não consegue conter o líquido em uma freada ou curva mais acentuada.

A segunda opção, naturalmente é a de levar os ingredientes. As frutas inteiras para não escurecer e as bebidas em garrafas fechadas. O transporte é mais tranquilo, mas deve-se ir com pelo menos três horas de antecedência. Uma para o preparo, outras duas para que as frutas tomem e cedam gosto. Com isto pode ocorrer de surpreender a dona da casa ainda com bobes na cabeça. Peças desculpas e siga rápido para a cozinha. É desagradável mas não há outro jeito. Sem o bowle a festa não pode começar e você não vai querer atrasar a todos. É bom lembrar que o bowle é a bebida perfeita para as conversas preliminares, enquanto se aguarda o sinal de largada para o ataque ao peru e tudo mais que esteja disponível.

Agora, se você chegar à casa da festa e lá encontrar um bowle pronto, não se acanhe, não se intimide nem fique chateado. Esta tradição é muito disseminada e não há motivo para que você seja o único a gostar dela. Negocie com o o dono da casa uma divisão de territórios. Você fica com a área externa e ele com a interna. Pode ser ao contrário. Você fica com a área interna e ele com a externa. Agora, o ideal realmente é misturar os boles numa prova inequívoca de boa vontade. Tal situação é muito apropriada para as reuniões de famílias que se unem em função do casamento de seus filhos. Uniões familiares seladas com a junção dos boles transcendem ao casamento e duram por mais de três gerações. Se judeus e palestinos tivessem misturados seus bowles em 1947, o mundo seria muito diferente. Não haveria este ódio todo e a palavra já estaria no dicionário.

Por último, vale comentar a forma correta de servir e tomar o bowle. O bowle pode ser servido em taças de boca larga, como as que se usavam para guaraná antigamente. Ou em canecas, de cristal é claro. Não vá querer tomar o bowle naquelas canecas de baile do chopp. Não servem, a taça, caneca ou que seja não pode ser muito profunda.. No máximo três quartos do comprimento de um palito. Certas bowleiras são vendidas já com as canecas, mas são sempre em pequeno número para tantos convidados. Assim, pode-se usar taças avulsas, mas nunca estas taças alongadas. Elas são ótimas para champanhe se o convidado não tem nariz, mas totalmente inadequadas para o bowle. Com elas é impossível usufruir das frutas que ficam no fundo.

Há quem diga que as frutas não devem ser comidas pois absorvem o álcool das bebidas. Nada mais enganador. As frutas constituem a alma do bowle e não podem ser dispensadas em nenhuma hipótese. As frutas devem ser deixadas para o final. Primeiro a bebida. Depois, com um palito, você vai catando, um a um, todos os pedacinhos de fruta, até o último. É totalmente descortês deixar as frutas no fundo da taça. Quem assim procede pode cair em desgraça junto ao preparador do bole podendo inclusive torná-lo violento.

Sendo assim, proponho um brinde com bowle.

Feliz e próspero Novo Milênio!


p.s.: correndo o risco de ser processado, transcrevo da obra citada a receita de Dona Benta para o bowle deste ano. É coisa fina, como podem observar.

Bowle (para bailes e saraus de cerimónia) - despeje numa poncheira 2 garrafas de champanha fino, 2 de Borgonha, 4 de Bordeaux, 12 garrafas de Paulotáris e 2 abacaxis cortados em rodelas finas. Adoce à vontade, junte um pouco de gelo em pedaços e deixe descansar por duas horas. Sirva em taças.

Nota: todas as doses para festas e saraus devem ser aumentadas proporcionalmente.
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