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Erotico-->5. MEUS AVÓS -- 19/02/2003 - 07:06 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Em geral, a juventude mal conhece os mais velhos. Não são poucas as criaturas que sequer tiveram ensejo de entrar em contato com eles, por terem desencarnado precocemente. Quando os avós sobrevivem aos netos, ou melhor, quando presenciam a transferência de um ou de mais de um para o outro plano existencial, é dor de infindável sofrimento.

E Deus falha em sua misericórdia? Absolutamente não, porque faz com que os velhos estejam com o tempo contado, prestes ao reencontro, mesmo quando não põem fé nessa possibilidade.

Se as crianças têm permissão para virem, através dos médiuns, colocar paradeiro aos pensamentos de suprema tristeza, esclarecendo que se encontram bem, na companhia de amigos e benfeitores espirituais, aí a alegria do reconhecimento da bondade do Criador gera a sublime convicção de que a vida continua, estendendo-se por campos de felicidade superior, onde o materialismo rude deste mundo corpóreo não atua, a não ser na recordação dos feitos da maldade e da malícia.

Este intróito visa a levar os leitores à presença dos velhinhos que se encontravam ainda encarnados quando de meu tresloucado gesto.

Deveria explicar a expressão “tresloucado”, mas isso produziria quebra de expectativa diante do narrado, de modo que me permito adiar as explicações. Contentem-se em saber que os quatro seres, estando eu com trinta e quatro anos no momento do suicídio, viviam, lúcidos, acompanhando com o coração apertado os feitos de minha vida sentimental.

Temiam o desfecho, pela memória viva do acontecimento que envolveu papai, principalmente os pais dele, Clarêncio e Vitória, que testemunharam a derrocada de ânimo do filho a partir dos insucessos nos negócios.

O meu caso foi muitíssimo diferente.

Preparem-se para a tragédia, porque não suporto mais procrastinar a informação de como perdi os dois meninos.

Um dia, estando alcoolizado, fora dos hábitos, pois raramente bebia, voltava para casa de uma festa em que ouvira falar de Criseide e de seus desatinos, bati o carro contra um muro, em alta velocidade e despachei os dois rapazolas de uma só vez. Desse acidente, saí inteiro quanto ao físico mas arrasado pela dolorosa impressão de que fora o único culpado.

O mistério que resta resolver é o fato de Criseide não haver tido conhecimento do falecimento dos filhos, destacando os jornais o noticiário, particularmente porque, naquele dia, as matérias estavam fracas e o desastre atingia pessoas mais ou menos postadas na sociedade, caso específico dos pais dela. Eu não fiz questão de levar-lhe ao conhecimento o trespasse das crianças, ainda mais porque me achava em lastimável estado psicológico. Os avós estavam inutilizados. Mercedes é que mantinha melhor a aparência da resignação, envolvida desde algum tempo com o Espiritismo, desde que perdera o marido, no intuito de receber dele comunicação. Entretanto, ninguém se mexeu, no sentido de descobrir o paradeiro de minha ex-mulher, confiando em que teria conhecimento dos fatos através da imprensa. Só muito recentemente é que me surpreendi com a ignorância de Criseide do destino dos filhos, embora saiba que pratiquei o suicídio.

Devo salientar que essa crença de mamãe no outro mundo, de certa forma, me afastou dela, uma vez que não podia suportar o pensamento de que levara os filhos a serem carcomidos pelos vermes, pois era o que meus sentidos conseguiam penetrar. Rejeitei-lhe as palavras de muita sabedoria, afastando-me dela, por força de ter ouvido de meus irmãos a estupidez das recriminações, embora Carla não partilhasse desses sentimentos, chorando sentida a perda dos estimados sobrinhos.

Quando nos reunimos, vários anos depois, soube que tiveram permissão para o contato mediúnico, conversando com Mercedes no Centro Espírita, escrevendo diversas mensagens aos meus avós e aos deles, tratando-os com carinhoso afago sentimental, chamando-os pelos nomes e apelidos, segundo os costumes infantis, aliviando-lhes a sobrecarga emocional, dando-lhes a esperança de breve reencontro no etéreo.

Eu é que não tive a oportunidade de receber nenhuma cartinha especial. A bem da verdade, Mercedes me havia falado dessa possibilidade. Disse também que recebera informações de espíritos protetores de que os netos estavam bem. Mesmo os primos entenderam que eles vinham até os encarnados, para o regalo do conforto moral. Eu é que não prestava atenção a esses...

Subitamente me vem a desconfiança de que estou adentrando terreno de subjetividade evidente, para quem não admite o relacionamento entre os mortos e os vivos. Minha cabeça acaba ficando confusa com o inopinado das idéias subversivas que estou impondo aos descrentes. Na verdade, os adeptos da filosofia espírita devem estar julgando a exposição muito pobre, mas os que estão tomando conhecimento agora destas teses devem estar colocando em primeiro plano as dúvidas estruturais de quem não viu, não sentiu, não meditou, não se esclareceu, não vivenciou os fenômenos mediúnicos.

E, para os que se preocupam com o desenrolar da história, deve estar parecendo absurda a constante interferência do autor, a atomizar o interesse pelas personagens como forjadoras da vida e, portanto, como realizadoras do enredo, especialmente porque se conhece o desfecho desde o início.

Então, vou reiterar que esta criação literária está em pleno desenvolvimento, facultada pela participação dos companheiros do “Grupo das Azaléias Multicoloridas”, que me sustentam junto ao mediador encarnado, para que lhe passe as impressões que vou mentalizando, com extraordinária dificuldade no presente momento, tanto que estou tendo a necessidade de fazer uso do magnetismo de um dos parceiros.

Como gostaria de estar com os filhos, com mamãe e até com meus avós, todos já deste lado! No entanto, caminham por sendas desconhecidas, evidentemente mais avançados em todos os setores da personalidade, por terem realizado o ideário evangélico com propriedade, com sobriedade e fé no Senhor.

Um dia, não agüentando mais as acusações conscienciais, sem objetivo na vida, desprezado por alguns e desprezando a todos, cego para os que me amavam verdadeiramente, turvada a alma pelo desespero da ausência das duas pequenas criaturas, encurtei a vida tresloucadamente, pondo em polvorosa os velhinhos, pela certeza que tinham de que deveria o neto cair nas profundezas mais negras do Umbral.

Para o efeito do entendimento da Doutrina Espírita, contribuíram a morte de Pedro e o empenho de Mercedes. O meu crime era acréscimo de dor ao evento material. Não respeitei os sentimentos alheios e precisei pagar cada uma das lágrimas que se verteram por mim, pela natural comoção que os seres imperfeitos sofrem, quando são surpreendidos pelo desregramento espiritual dos companheiros de existência. Se as lágrimas podem causar o despertar do suicida para a extensão dos males que provocou, também não há negar que significam pesar verdadeiro, ao se reconhecer que o coitado não poderá fugir ao castigo que a consciência lhe propiciará.

Quantas vezes roguei o perdão dos velhos e dos moços! Não tenho, portanto, necessidade agora de realizar o ato de contrição pelas culpas purgadas e ainda não esquecidas. Se encarnado fosse, o palor da face indicaria, contudo, as tremendas descargas emocionais que me perpassam por todo o ser, desequilibrando-me para a serenidade a que o ato da escrita obriga.

Aos leitores peço que relevem os trechos incompreensíveis. Ponham-nos na conta dos repelões mentais que a consciência me força a suportar, caso contrário, nada poderei comunicar e frustrarei as esperanças em mim depositadas por todos. Não foi exatamente isso o que ocorreu ao me matar?

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