Não vamos cogitar de aqui compor,
Em dias de cruel estardalhaço.
A trova, seja boa o quanto for,
Sempre haverá de se perder no espaço.
Assim, eu recomendo, com vigor,
Que agora vá pegar papel almaço,
Que está a perigo o bom setor elétrico,
Que o nosso tema não quer ser mais tétrico.
Não tenho propensão para faquir:
É sofrimento injusto a pobre rima.
Eu sei que quer o nosso Wladimir
Pôr no papel a prova desta estima,
Mas há um tempo imenso, no porvir,
P’ra melhorar, ó raios, este clima.
Caso dê certo apenas uma oitava,
É porque a transmissão a chuva entrava.
Não liga este meu médium para o medo
E, intimorato, faz o bom trabalho.
Não quer deixar o posto muito cedo.;
Não quer pensar jamais: “Agora eu falho!”
Mas quando vê que o verso é tão azedo,
Nesta improvisação de quebra-galho,
Percebe que amanhã é um outro dia,
Para o apanhado justo da poesia.
Esse sujeito aí não toma jeito,
Interessado mais num novo chiste,
Que possa vir dizer-lhe, com respeito.
Se é com amor que o gajo sempre insiste,
Esse tempinho extra eu bem aceito,
Porque não quero vê-lo nunca triste.
O duro é que o leitor fica de fora,
Que é outra a lei do verso que vigora.
Então, vou resumir a situação,
Que a tempestade já está mais calma.
Houve faíscas salpicando o chão,
Deixando mui pequena a nossa alma.
P’ra receber do etéreo a vibração,
O nosso bom amigo a mão espalma,
Pois seu desejo de servir supera
O medo de vir logo p’ra esta esfera.
Ao desligar a máquina eletrônica,
Não tinha que temer perder o verso,
Mas ganhou o tema uma outra tônica,
Estando no presente agora imerso.
A mente sente a rima, catatônica,
Enquanto co’o leitor aqui converso.
Talvez possa extrair qualquer lição.;
O mais certo, porém, é dizer “não”.
Como provar, no fato, que o improviso
Não é a forma de valor corrente?
Eu não sabia só que o meu aviso
Iria refletir-se-lhe na mente.
O resto estava pronto e agora biso,
Leitura mui fiel que levo à gente,
Para pensar nos itens da existência,
Em forma diletante ou de ciência.
Mas, no final da vida, o bem se acerta:
Ludibriar o povo é inoperante.
A morte é, simplesmente, a porta aberta,
Para mostrar que a alma segue adiante.
Assim, esta poesia a gente oferta,
Para provar o amor ao semelhante,
Esteja confiante no futuro,
Esteja a equilibrar-se sobre o muro.
Não sei se convenci o meu leitor
De que é lorota apenas o improviso.
Quando aqui vem o verso seu propor,
A turma julga sempre ser preciso
Deixar, na trova, um bem de grão valor,
Sem prometer abrir-lhe o paraíso.
Então, faz com que pense ser verdade
O enredo, p’ra que a imagem mais lhe agrade.
O dia esteve mais ameaçado,
Porque o caro médium fraquejou,
Mas, quando o medo foi ultrapassado,
Ouviu-me a repetir o “aqui estou”,
Tão próprio dos poetas deste lado,
Que gostam de ensaiar o nobre “show”,
Para agradar e pôr em segurança
Aquele que nos serve e jamais cansa.
O exemplo vivo que me trouxe aqui
Estava pronto já, há uma semana.
Tendo caído a chuva que previ,
Pedi ao mestre a tarde mais insana,
Na parte em que descasco o abacaxi,
Ouvindo alguém dizer: — “Ele se engana,
Se pensa que lucrei com sua vinda!...”
Senti que a emenda está pior ainda.
Mas agradeço a Deus a persistência
Que demonstrou o irmão que me atendeu.
Bem sei que, para a trova, a tal freqüência,
Em grande parte, a turma me valeu.
Mas foram doze estrofes, contingência
Que tive de ditar: crédito meu.
Porém, quem mais ganhou foi o leitor,
Que sabe, agora, o quanto é bom compor.
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