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Contos-->ILUSÕES VIRTUAIS -- 30/07/2000 - 15:18 (Fernando Tanajura) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
ILUSÕES VIRTUAIS

Vi seu endereço numa lista de um "site" cultural. Aproveito para lhe convidar a visitar: www.ppoesias.com.br - Abraços poéticos, Renato.

Angelamaria: Obrigado por fazer contato. Visitei o "site" recomendado por você. Adorei a sua poesia. É forte e direta. Eu adoro poesia. Eu também escrevo e tenho até dois livros publicados. Se puder mande mais. Abraços também poéticos, Angelamaria.

Renato: Obrigado por ter visitado o "site". Foi uma homenagem bonita que fizeram para mim, não foi? Fico feliz por você ter gostado da minha poesia. Abaixo mais uma que fala de um rouxinol. Abraços, Renato.

Angelamaria: Achei linda a poesia do rouxinol. Engraçado que também escrevi uma sobre um rouxinol. Foi uma coisa incrível. Um dia estava atrasada e quase pronta pra sair, quando no espelho da sala da minha casa apareceu um rouxinol bem serelepe sobre a minha cabeça. Todas as janelas estavam fechadas e as portas também. Não sei como ele entrou na sala. O bendito do rouxinol ficou pousando sobre a minha cabeça parecendo o Divino Espírito Santo: uma coisa sobrenatural mesmo!!! Esqueci do atraso, corri para o lápis (sempre escrevo com lápis, porque qualquer coisa eu posso apagar ;):):)...) e pro papel e escrevi o poema todo de uma vez. Foi lindo e acho que é uma das mais belas poesias que já escrevi. Se quiser eu mando para você. Não suma e um grande abraço, Angelamaria.

Renato: Mande o poema se quiser. Hoje estou com pressa pois tenho muitas e-mails para responder e estou tentando terminar um projeto de mais um livro de poesias. Até outra hora. Renato.

Angelamaria: Também ando sem tempo. Estou também acabando de escrever mais um livro e depois vou tentar publicar. A minha editora não está fazendo nada por mim, porisso vou tentar descobrir alguém que acredite no meu trabalho e o publique. A gente tem que suar. Imagine que já publiquei dois livros, sou professora e membro da Academia de Letras da minha cidade. Ocupo a única cadeira da academia que fundei e mesmo assim as editoras não investem em mim. Um dia eu chego lá e alguém vai me dar valor. Em tempo: abaixo a poesia do estranho rouxinol sobrevoando a minha cabeça. Beijos. Angelamaria.

Renato: Tive um problema no meu computador e não consegui ler e imprimir sua poesia. Se puder mande de novo. Abraços, Renato.

Angelamaria: Mando a poesia assim que tiver tempo. Estou num stress danado. Tenho que viajar para São Paulo para fazer um pós-graduação de três dias (acabei Filosofia e Letras no ano passado) e de Sampa vou direto para Londres para fazer inglês em um mês. Beijão.

Angelamaria: Mais uma mensagem hoje. Estou lhe mandando de novo a poesia do rouxinol. Escute: depois do dia 15 mande os e-mails para rouxxinol@uol.com. Este é o meu endereço que posso checar as minhas mensagens enquanto estiver viajando. Estou puta da vida com esse FHC. Fui comprar os dólares para minha viagem e está tudo caríssimo!!! Como se pode viver neste país? Eu com 23 anos de idade ando desiludida. A gente estuda tanto para ganhar R$2.00/aula. Pra pagar meu módulo de pós-graduação e fazer esta viagem a Londres tive que pedir ajuda a tudo e a todos: irmãos, tios, primos e até sair vendendo meus livros pelos bares. Um aperto. Beijões, Angelamaria.

Renato: Você vai a Londres? Eu moro em Paris há mais de dez anos. Quando tiver tempo vou ler sua poesia e, conforme for, vou enviá-la para uma revista de língua portuguesa daqui, conheço o pessoal da revista, quem sabe eles gostam e publicam. Vamos ver o que pode dar... Consegui uma editora que vai publicar meu livro. Abraços, Renato.

Angelamaria: Vou sumir por uns tempos em Sampa para fazer o meu módulo. Não suma da minha vida. Beijões, Angelamaria.

Angelamaria: Já estou em Londres. Estou arrasada, ou melhor, puta mesmo da vida. Imagine que um árabe, com que me correspondo há mais de dois anos pela net, resolveu ir do Oriente Médio até Sampa só para me conhecer. Ele já morou no Brasil por uns tempos e fala bem o português. Marcamos encontro e ele me tratou como segunda classe. Me fez andar, ou melhor correr, para baixo e para cima como se estivesse correndo de Saddam. Eu já estava cansada, com bolhas nos pés e ele me fez correr sem destino. Estava meio perdida e amedrontada em Sampa, que não conheço muito bem, e ele me fazendo andar como uma louca, sempre me deixando pra trás. Me senti inferiorizada na minha própria terra e não pude fazer nada por delicadeza. No dia seguinte nos encontramos de novo e cheguei atrasada três minutos. Foi o bastante. Falou alto, gritou, me apontou o dedo em público. Quase chorei. Imagine que levei pra ele um pouco de tutu de feijão que cozinhei e congelei com carinho e ele nem deu bola. Ele me pertubou durante dois anos querendo saber o que era tutu de feijão e quando viu a comida sentiu nojo e disse que não queria. Dei-lhe também um dos meus livros com dedicatória e tudo e ele nem ligou. Disse-me que guardasse na minha bolsa e depois pegava. Se esqueceu depois. Me senti mais baixo do que cu de cobra. Contei isso pra uma amiga minha e ela me disse que eu devia mandar ele tomar... Desculpe eu estar lhe contando isso. É que não posso falar estas coisas para minha família e tive que me desabafar. Chego aqui em Londres um frio danado e estou numa casa longe de tudo. Sinto frio nos pés, sinto frio nas mãos e na casa que estou só tem homens e são muitos bagunceiros e desorganizados. Eu sou a única mulher. Mas em compensação Londres é linda. Igualzinha como imaginava e via nos filmes. Primeiro mundo é tão diferente!!! Até a lua é diferente. Estava cheia ontem e fiquei umas três horas na janela extasiada. É mais limpa, sei lá, mais prateada. Senti até vontade de fazer uma poesia... Hoje dei uma esmola a um pobre e ele sorriu e agradeceu. No Brasil os pobres não se comportam assim. Estou aprendendo muito e espero levar estas experiências de volta a minha cidade. Beijões e não suma não. Se quiser me ligar meu número é 44-1-333-5698. Preciso de um ombro amigo para chorar e você é tão compreensivo comigo. Obrigado. Rouxinol.

Renato: Meu ombro é grande e pode chorar à vontade. Rouxinol, quando a gente cai no mundo é assim mesmo. Não podemos culpar somente FHC pela queda do Real. O mundo está todo em crise financeira. Veja a Rússia, a Ásia, o resto da América Latina... Os árabes também são diferentes. Dão um tratamento à mulher de modo diferente de nós latinos. Você não acha que se expôs demais?... Vá devagar. Mas se você gosta de apanhar, que tenha bom proveito. O mundo está aí pra dar porrada na gente. Anotei o seu número e ligo a qualquer dessas horas.

Angelamaria: Desculpe eu ter molhado seu ombro enorme. Você levantou o meu astral. Você é tão compreensivo e tão maduro. Sinto tanto equilíbrio depois que leio suas mensagens... O rapazes aqui estão menos bagunceiros e tudo está bem melhor. Me liga assim que tiver um tempinho. Rouxinol.

Dias depois, ao telefone.

- Alô.

- Alô, Renato? Sabia que era você. Estava aguardando seu telefonema ansiosa.

- Tudo bem?... Ou ainda está levando as porradas da vida?

- Tudo ótimo. Inclusive estava falando isso com um amigo meu que é solteiro que nem você. Você é solteiro, não é?

- Não, sou divorciado.

- Divorciado? Mas não está pensando em casar de novo?

- Não. Quero estar longe dessa. Estou muito bem como estou e muito feliz com a minha poesia e com a publicação de meus livros.

- Ah... Engraçado... Estava falando com um amigo meu assim da sua idade, ele tem uns trinta anos... Você tem trinta anos, não é?

- Não. Eu sou um senhor de quase sessenta anos bem vividos.

Angelamaria silenciou do outro lado do Canal da Mancha. Com poucas palavras se despediu desapontada. O rouxinol parou de cantar. Nunca mais recebi e-mail de rouxinol.


© Fernando Tanajura Menezes
(n. 1943 - )
(in Revista Alternativa
Boston-MA/USA - Fevereiro 2000)
http://tanajura.cjb.net





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