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Erotico-->28. PREPARA-SE A ALTA DE CLÉBER -- 02/02/2003 - 08:07 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Durante a semana, Antunes compareceu ao hospital três vezes. Recebera recado para preparar-se para a alta do rapaz. Tinha de providenciar uma cadeira de rodas e condução adequada, além de diversos medicamentos em falta na farmácia da Assistente Social.

Assim que recebeu o primeiro aviso, foi dar notícia a Deodato, no serviço. Encontrou-o muito pensativo:

— Que preocupação é essa?

— O que traz você aqui?

— O teu filho vai pra casa esta semana.

— Pra minha ou pra tua?

— Pra minha, a menos que você deseje causar mais problemas a tua mulher.

— E Odete não vai ficar cheia...

— Ela concorda que o mocinho passe uns tempos lá. Vai ser bom pro irmão e ambos poderão...

— Eles nunca se deram. O mais velho sempre foi muito birrento e o mais novo não conseguia seguir os pensamentos dele.

— Agora as condições são outras. Gaspar tem ido bem na escola. Ainda não escreve, mas tem lido tudo que lhe cai nas mãos. Toda semana, Naninho passa pela biblioteca pública e traz um ou dois livros novos. Faltam uns oito dias pra consulta dele. Você vai ver como as coisas vão melhorar. Você quer ir comigo ao hospital, na hora do almoço?

— Posso ir, mas devo estar de volta às duas.

— Eu levo e trago. As minhas rondas são “pro forma”, pois não estou em condições de enfrentar a bandidagem. Vou com os companheiros na viatura e o mais que faço é lidar com o rádio. Regalias da promoção. Também faço os relatórios. Isso é trabalho muito leve, que tiro de letra. Quando preciso ir a qualquer lugar fora do serviço, eles me levam e depois vão buscar. Eu sei que isso não vai durar, mas, enquanto não me dão trabalho mais duro, vou aproveitando.

— Deus te ajude e não se esqueça de mim!

— É verdade. Você não me disse o que o traz tão preocupado. Parece um defunto. Ontem estava meio jururu. Saiu cedo do Centro. Que se passa?

— Conversei com Maria. Ela quer que eu fique com ela. Mas eu não sei como é que vai ser.

— Deixa pra lá. O que tem de acontecer acontece. Vocês brigaram?

— Ao contrário, mantivemos um bom relacionamento.

— Então, vamos pôr as coisas nas mãos de Deus. Ao meio-dia, eu venho te buscar.



De fato, ao meio-dia e meio, estavam conversando com Cléber.

— Pai, eu gostaria de ir pra casa. Eu sei que a mãe não vai poder cuidar de mim, mas eu me viro sozinho.

— O Guarda Antunes quer levar você pra ficar junto de Gaspar.

— Ele falou comigo. Mas eu acho que vou ficar melhor cuidando de mim mesmo. Quero ser o mais independente possível. Ele prometeu fazer umas visitas e levar mantimentos e remédios.

— Você não me disse nada disso.

— Queria que Cléber falasse com você de viva voz. Achei que podia mudar de idéia.

— Não mudei. Quero experimentar...

— Eu acho que era melhor ouvir o que Antunes tem pra dizer. Ele sabe mais que você e que eu. Eu sou teu pai e gostaria de ver você lá em casa. Mas não sei se vou poder arcar com mais as tuas despesas.

— Eu vou procurar ser útil. Se me derem alguma coisa pra fazer em casa, logo pego prática. Se ficar com o Gaspar, vou ficar desesperado com aquele cabeça-dura.

Antunes não podia acreditar que Cléber realmente estivesse desejando voltar para a casinha sem conforto. Desconfiava de que tramava algo. Mas não atinava com o quê. Seria para causar mais problemas ao pai? Estaria preparando alguma vingança? Os modos atuais apontavam para a reconciliação, contudo, já aprontara tantas que não seria de admirar se quisesse desforrar as pernas amputadas. Ficaria de sobreaviso.

Quando o médico chegou, confirmou que daria alta na sexta-feira. Tinham três dias para providenciar tudo.



Naquela mesma noite, Deodato sondou Maria quanto a irem juntos ao Centro Espírita. Imaginou que teria de enfrentar os olhares curiosos das pessoas que sabiam de sua separação. Por outro lado, poderia apresentar as rivais. Quem sabe lhe dariam alguma solução inesperada para a esdrúxula situação sentimental que havia criado.

— Vou pensar. Com Cléber em vias de chegar, preciso preparar tudo em casa pra acomodar ele. Vai ter de ficar na sala com você. As meninas têm medo dele.

— Será que elas se lembram das malvadezas?

— Se lembram, sim, e como! Mas eu não disse nada a elas.

A conversa se passava no quarto, com a porta fechada. As meninas estavam vendo televisão. Maria agarrou o braço do marido, sem violência, afetivamente.

Deodato ficou sem saber como reagir. Não moveu um músculo para retribuir ao carinhoso apelo. Levantou-se, desprendendo-se suavemente das mãos que se deixaram descair. Maria olhava fixamente para os olhos dele. Sem lágrimas e sem palavras. Deodato apenas deixou escapar uma frase:

— Amanhã vai ser um bom dia pra irmos ao Centro.

E saiu.



Quando o casal chegou ao Centro, despertou a maior curiosidade. Mas ninguém se atreveu a perguntar muito. Enquanto esperavam Antunes, sentados no salão principal, as pessoas vinham chegando. Deodato ia apresentando a mulher aos conhecidos. Ninguém tomava a liberdade de vir especular a presença da esposa. Os dirigentes olhavam de longe, acenavam e não se aproximavam.

Antunes muito se admirou de ver a mulher ali.

— Ulalá! Que felicidade! Bons olhos te vejam! Tenho boas novidades pra vocês. Arranjei a cadeira de rodas. Não foi difícil. Um companheiro perdeu o pai recentemente e a cadeira está em desuso. Vai emprestar, até que a gente arrume uma definitiva, do tamanho adequado.

— Muito obrigado, amigo! — Deodato reconhecia que Antunes estava empenhado em cumprir as promessas. Não duvidava que estivesse mesmo frustrado por não ter convencido Cléber a acompanhá-lo.

Ia por aí a conversa, quando Josefa veio ao encontro deles. Fora avisada na cozinha da presença da esposa de Deodato e se despachou imediatamente para o entendimento que julgava de lei.

— Deus te abençoe, querida irmã! Eu sou a Josefa que o teu marido deve ter falado. Graças a Deus que você veio até o Centro! Agora tudo vai ficar claro pra tua compreensão. Rezei muito pra que o casal se unisse, se fosse esse o destino de ambos.

Deodato não sabia o que dizer. Maria gostou dos modos da viúva. Não fazia idéia de que poderia aceitar tão pacificamente a perda do homem por quem se interessara. Compreendia, finalmente, que era verdade o que o marido dissera sobre ter sido ela quem o incentivara a procurar resolver os problemas antigos, antes de criar um novo lar. Mas não disse palavra, com medo de não corresponder à lucidez da outra. Apenas estendeu o braço, oferecendo a mão para o aperto da polidez social.

Josefa, entretanto, se espremeu no estreito corredor entre as cadeiras, empurrou as que estavam na frente, fez espaço, puxou a grávida para si e a apertou demoradamente contra o peito, sussurrando-lhe ao ouvido:

— Esteja certa de que o teu marido gosta de você e que só está procurando um motivo pra se reconciliar de vez. Deus te ajude, irmãzinha!

Pela primeira vez, durante todos aqueles meses, brotaram lágrimas dos olhos de Maria. Mas não aninhou a cabeça no peito do marido, como seria de se esperar. Pegou um lenço no bolso e mergulhou a cara nele. Precisava esconder a vergonha. Quando levantou a cabeça, Antunes e a viúva haviam desaparecido. Só Deodato estava sentado no mesmo lugar, olhos vazios perdidos no espaço.

Em silêncio ficaram até o início da palestra.

O orador falou sobre a necessidade de os médiuns se resguardarem dos maus pensamentos nos dias de sessão. Houve quem fizesse perguntas. Quarenta e cinco minutos depois, iniciava-se a sessão de passes, para o que se formou uma fila, a partir de uma das portas laterais.

— Você quer tomar passe?

— Que é isso?

— Você entra. Senta. Põe as mãos sobre os joelhos, com as palmas pra cima. Fecha os olhos. Faz uma oração. Pode ser o pai-nosso. Enquanto isso, uma pessoa reza por você, pedindo aos bons espíritos que tirem tudo que encontrarem de ruim: encostos, maus fluidos etc. Se não fizer bem, mal não vai fazer.

— Vamos lá.

Maria não era tão ignorante que não soubesse o que era uma benzedeira. Imaginou alguma coisa assim e foi tomar lugar na fila.

Ali, uma senhora perguntou a Deodato se era o primeiro filho. Não se apertou, parecendo ter a resposta na ponta da língua:

— O sexto. Dois meninos e três meninas. Esse aí também é menino.

— Hoje em dia, os exames mostram claramente o sexo das crianças. Até está perdendo a graça.

Maria não quis participar da conversa. Fingiu estar concentrada numa oração, movimentando sutilmente os lábios. A curiosa se calou e Deodato passou o braço em torno dos ombros da mulher. Sentiu um estremecimento que lhe foi transmitido involuntariamente pela esposa. Percebeu que o rosto se ruborizava, mas se manteve firme. Lembrava-se da atitude de Josefa. Não havia mais dúvida possível: iria voltar para a esposa. “Seja o que Deus quiser!...”

Naquela noite, Deodato reassumiu seu lugar no leito conjugal.

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