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Artigos-->POESIA - SEIICHI NIIKUNI - ARTE -- 11/05/2013 - 11:05 (LUIZ CARLOS LESSA VINHOLES) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

 



POESIA - SEICHI NIIKUNI - ARTE[i]



 



L. C. Vinholes



 



Ninguém pode imaginar o quanto estou feliz por ter a oportunidade de escrever a respeito do poeta objeto desta histórica exposição.



 



A primeira vez que ouvi falar sob sobre o poeta Seiichi Niikuni foi pelo poeta Yasuo Fujitomi, em 1963. Também dele foi a notícia a respeito da antologia ZERO ON, ilustrada por sua esposa Kiyo e publicada em setembro daquele ano.



 



Não vou escrever sobre a vida e obra de Niikuni, uma vez que isto é melhor-conhecido por estudiosos e poetas em atividade na segunda metade do século XX que tiveram o privilégio de serem seus contemporâneos. Colocarei no papel apenas lembranças das quais fui testemunha, como prova do meu respeito pelo homem que superou as ideias do surrealismo e trilhou o caminho de uma nova visão da poesia concreta.



 



 



O nosso nunca a ser esquecido Niikuni foi um dos meus caros amigos em uma constelação de poetas, alguns independentes e outros membros de bem-conhecidos grupos, tais como VOU, Pan Poésie[ii], Almée, Sabi[iii], EN[iv], Shinjinryugaku[v], Hi, etc., com os quais estive em contato durante meus quatorze anos no Japão.



 



Em outubro de 1963, Niikuni chegou no meu escritório na Embaixada do Brasil com um exemplar da sua singular coleção de poemas. Conversamos sobre uma nova linguagem na poesia visual e sonora e sobre as relações entre poesia e a peculiaridade de diferentes tipos de arte plástica e da linguagem plural das expressões musicais. Mencionei detalhes do movimento da poesia concreta pelos irmãos Haroldo e Augusto de Campos e Décio Pignatari e seus papéis no surgimento da poesia concreta na Europa. Expliquei como e porque, em abril de 1960, organizei a Exposição de Poesia Concreta Brasileia no Museu Nacional de Arte Moderna de Tóquio, quase dois anos antes de iniciar meu trabalho na Missão Diplomática do Brasil - Seção Cultural. Também coloquei-o a par do meu projeto para organizar uma exposição internacional de poesia concreta, incluindo trabalhos de poetas japoneses. Depois, nos encontramos várias vezes até decidirmos colaborar um com o outro para a exposição realizada no Sogetsu Kaikan[vi], em julho de 1964, com a participação de 28 poetas de 5 países. Esta nossa colaboração resultou em um dos mais importantes eventos nas relações entre poetas brasileiros e japoneses com a participação direta de Niikuni: foi o momento no qual, valendo-se de “palavras chave” em inglês e francês, Niikuni traduziu para o japonês o livro-poema Servidão de Passagem (1964), de Haroldo de Campos. Junto com a antologia Kemuri no Chokusen[vii], de Katsué Kitasono, por mim traduzida para o português, que as duas obras foram lidas em ambas as línguas por Niikuni, a jovem poetisa Kyoko Torisawa e por mim. Como resultado do êxito e repercussão da mostra, Niikuni decidiu criar, em 1965, a Associação para Estudos da Arte (Geiditsu Kenkyu Kyokai) e, depois, a revista periódica ASA.



 



Devemos recordar que durante sua visita a Pierre Garnier, em Amiens, França, Haroldo de Campos vendo, pela primeira vez, a antologia ZERO ON, pediu-me conseguir um exemplar. Atendi ao pedido em fins de junho e, em 28 de julho, pela primeira vez, Niikuni recebeu carta de Haroldo de Campos, comentando seus poemas.



 



 



Como registro histórico, quero salientar que em julho e 1965, em colaboração com o artista plástico Kanzo Tanaka, fundador da Sociedade Internacional de Artes Plásticas e Àudio-Visuais (ISPAA), a Galeria Nunu, em Osaka, realizou a exposição de um poema de cada um  dos participantes da mostra no Sogetsu Kaikan, incluindo um poema de Niikuni. A mesma exposição foi montada no Museu de Arte Homma, em Sakata, em agosto de 1965.



 



Fiquei tão impressionado com os trabalhos de Niikuni que decidi traduzir para o português os primeiros nove poema de ZERO ON: ”em favor do equilíbrio das flores”, “o castelo das crianças”, “o templo horiuji”, “do lago”, “mulher”, “sobre a harmonia das nuvens e do céu”, “parte do espaço”, “os degraus do vento” e “a segunda mão do relógio”.



 



 



Depois da assinatura do manifesto “Posição Internacional” apresentada por Pierre Garnier e pulicada na revista Le Lettre nº 32 (abril/junho de 1963) no qual o Japão, juntamente com 14 países, foi representado por Katsué Kitasono, Toshihiko Shimizu e por mim, enviei carta a Garnier apresentando poemas de Niikuni. Como resultado, Garnier incluiu o poema “transmissão 9” na revista Le Lettre nº 33 (outubro/dezembro de 1964). Sou especialmente orgulhoso e feliz por ter sido o “nakodo”[viii] entre eles. Dois anos depois, o poema “mizumi wo”, em versão em espanhol, foi publicado no Uruguai, na revista Cormoran e Delfin nº 3 (outubro de 1966), sendo a primeira publicação de poema de Niikuni nas três Américas. Niikuni e Garnier começaram a trabalhar e produzir singulares poemas concretos em japonês-francês[ix].



 



Niikuni foi o mais direto e eficaz artesão da nova poesia visual/sonora da segunda metade do século XX no Japão. Sua criatividade deu nova vida a linguagem e aos ideogramas japoneses. Devemos lembrar que Niikuni surgiu no cenário cultural da sociedade japonesa no momento em que o Japão começou a construir um novo período histórico e que suas relações com o Brasil estavam melhorando significativamente. Em 1960 vimos a arquitetura monumental de Kenzo Tange edificada em Tóquio; a inesquecível Olimpíada de Tóquio (1964) exibindo para o mundo não apenas o desempenho dos atletas, mas também o crescimento da indústria e da economia; a distância entre Tóquio e Osaka da linha Tokaido foi encurtada pelo “sinkansen”[x]; iníciou uma nova ponte tecnológica entre o Japão e o Brasil, com a construção simultânea de duas modernas siderurgias, Usiminas em Ipatinga, Brasil, e Tobata, em uma ampla área do mar aterrada,  em Kyushu[xi]; as longas viagens entre o Japão e o Brasil por navios da Osaka Shosen Kaisha, via Canal do Panamá, e da Companhia Holandesa pela rota do Cabo das  Tormentas transportando imigrantes agricultores, foram substituídas por linhas aéreas de ambos os países levando jovens engenheiros e técnicos para a indústria brasileira; a chegada ao Japão da “bossa nova”, a nova maneira de compor, tocar e cantar a música popular brasileira, atraiu e influenciou compositores e músicos japoneses; obras primas do teatro brasileiro foram traduzidas, publicadas e apresentadas não apenas em Tóquio, mas também em muitos lugares Japão afora, inclusive As mãos de Eurídice, de Pedro Block, traduzida por Jun Shimaji, com mais de mil apresentações ao público japonês.



 



 



O Plano Piloto da Poesia Concreta Brasileira (1957) foi traduzido para o japonês por Katsué Kitasono e publicado na revista VOU nº 95, em julho de 1964. E uma nova tradução por Seiichi Niikuni foi publicada na revista ASA nº 3, em 1969. Não podemos esquecer o seu impacto na Europa assim como no Japão.



 



Àqueles que tiverem interesse em conhecer passo a passo as relações Brasil-Japão no campo da poesia concreta, recomendo ler o artigo Intercâmbio, Presença e Influência da Poesia Concreta Brasileira no Japão, publicado, em 1975, nos Anais do IX Colóquio de Estudos Luso-Brasileiros, patrocinado pela Sociedade para Estudos Luso-Brasileiros da Universidade Sofia, de Tóquio.



 



Muitas vezes Niikuni e eu conversamos sobre música e não apenas sobre poesia. Ele sempre mostrou que era bem-informado sobre as tendências da nova música produzida na segunda metade do século XX. Ele era também muito interessado em conhecer as razões pelas quais eu havia abandonado a teoria dos doze sons de Schoenberg e criado minha própria teoria “tempo-espaço” para composição musical (1956). Sempre fazia muitas perguntas sobre as novas ideias para música que eu desenvolvia com minha Instrução 61 para quatro instrumentos quaisquer, publicada na revista Design nº 37 (1962), com texto em japonês e inglês, apresentada pela primeira vez em 31 de dezembro de 1961 pelo Grupo de Música Nova Tomohisa Nakajima, de Tóquio. Certa vez comentei com Niikuni meu interesse em desenvolver uma linguagem poética deixando de lado aspectos visuais do escrever (poesia para ser lida e/ou para ser vista), dando papel principal/total aos sons das palavras, colocando em primeiro plano a fonética e esquecendo a semântica.



 



Niikuni era um homem do diálogo, mas às vezes era muito radical defendendo suas ideias. Por exemplo, no início de setembro de 1973 algumas palavras e expressões colocadas no texto do Manifesto da ASA criou pequena divergência entre nós. Niikuni enviou-me as versões do Manifesto em japonês e inglês e um cartão postal pedindo “posição urgente e clara: objeção ou não objeção”. Dei uma resposta diferente e o problema foi solucionado. O Manifesto foi publicado em dezembro de 1974 na revista ASA nº 7, comemorando o 10º aniversário da produtiva e amistosa associação de Hiro Kamimura, Yasuo Fujitomi, Yokinobu Kagiya, Shutaro Mukai, Toshihiko Shimizu, Niikuni e eu.



 



Pessoalmente, não posso esquecer os momentos passados com Niikuni, na sua casa no bairro de Ota, e a oportunidade que me deu de participar da marcante mostra na Galeria Cristal de Tóquio (maio de 1967) com a escultura/poema Espiral, criada de parceria com senhora Kiyo Niikuni.



 



À medida que o tempo passa, Seiichi Niikuni e ASA são inesquecíveis partes da história da literatura japonesa na segunda metade do século XX. 



 



 



 



 



 



[i] Nota do autor: traduzido para o japonês por Michiko Honjo, diretora do Museu e Biblioteca Musashino, em Musashino, Japão, este artigo foi publicado em inglês e japonês (pags, 76-77 e pgs.2-74) no catálogo da exposição retrospectiva do poeta Seiichi Niikuni, de 8 a 29 de junho de 2009.





[ii] Liderado pelo poeta Shuzo Iwamoto.





[iii] Ferrugem.





[iv] Círculo.





[v] Nova antropologia.





[vi] Sede da escola de ikebana Sogetsu, fundada por Sofu Teshigahara.





[vii] Reta da fumaça.





[viii] Assim são chamadas as mulheres que tem a missão de aproximar os pares com prospeto de casamento.





[ix] Que chamei “poemas a quatro mãos”.





[x] Shinkansen  é o nome dado ao primeiro trem de alta velocidade, entre Tóquio e Osaka, construído antes das Olimpíadas de 1964.





[xi] Uma das quatro maiores ilhas do Japão, situada no sul do país.



 




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