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Ensaios-->Os radicais sempre vencem -- 26/04/2011 - 09:10 (Félix Maier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

 

Os radicais sempre vencem
Tue, 26 Apr 2011 07:39:50 -0300

NOS últimos meses. com o desenrolar das revoluções no Oriente Médio, a Turquia foi apresentada como um modelo possível e desejável para a região. O país, de população quase totalmente muçulmana. seria um exemplo perfeito de convivência exitosa entre valores democráticos e um governo sob o comando de um partido islâmico, no poder há quase uma década. A utopia turca, contudo, não se sustenta, segundo um de seus mais atentos e qualificados observadores: o historiador Soner Cagaptay, do Washington Institute, um centro de estudos sobre o Oriente Médio com sede nos Estados Unidos. Diz Cagaptay: "A Turquia é um modelo falso. A imprensa está acuada e os tribunais foram dominados pelo partido do governo. Os políticos do AKP dizem o contrário, mas suas políticas acabarão levando à criação de um estado islâmico". Muçulmano, Cagaptay cresceu e se formou em Istambul, antes de se mudar para os Estados Unidos, onde fez seu doutorado e deu aulas nas universidades Yale, Princeton e Georgetown. O historiador concedeu a seguinte entrevista, por telefone, de seu escritório, em Washington.
A democracia turca é um exemplo para as nações do Oriente Médio que estão se desfazendo de seus regimes ditatoriais? Não. O modelo da Turquia é falso. Quando o Panido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP, do premiê Recep Tayyip Erdogan) chegou ao poder, em 2002, o país já tinha tradição democrática. Esse partidO islâmico aceitou as regras da democracia apenas para eliminá-Ias em seguida, impondo o controle sobre os tribunais e pressionando a imprensa. O sistema de pesos e contrapesos, cuja função é estabelecer limites ao Poder Executivo, está sendo destruído na Turquia. Recentemente, o governo obteve o direito de indicar praticamente todos os juízes da Suprema Corre, sem a necessidade de aprovação no Parlamento. Já a intimidação à imprensa chegou a um ponto muito crítico, com jornalistas sendo grampeados, presos ou acusados de tentativas de golpe "de estado. Há mais jornalistas presos na Turquia do que na China ou no Irã. Muitos estão em penitenciárias de segurança máxima, junto com os criminosos mais perigosos. Em 2007, dois repórteres investigativos do diário Alilim foram condenados a 3000 anos de cadeia cada um, sob a acusação absurda de terrorismo. Há quase I 000 processos criminais contra jornalistas. O governo está cada dia mais autoritário e disposto a calar a oposição. A Turquia é a prova de que, quando os partidos islâmicos participam de eleições, escondem o faro de que, depois de chegar ao poder. não têm a menor intenção de respeitar a democracia.
No Egito, a Innandade Muçulmana pre• tende apoiar candidatos seculares à Presidência. Isso se assemelha à estratégia usada pelo AKP para chegar ao poder na Turquia? Sem dúvida. O partido islâmico turco chegou ao poder com a ajuda de politicos seculares e, menos de uma década depois, já enfraqueceu a maioria das instituições indispensáveis a uma democracia. As próximas eleições. em junho deste ano, podem até ser limpas, mas não serão justas, porque a imprensa está totalmente acossada. Se depender da vontade dos panidos que querem subordinar o estado à religião, eles foram eleitos para nunca mais deixar o poder. A essa estratégia chamo de "uma pessoa, um voto. uma só vez". Algo parecido ocorreu no Leste Europeu depois da JJ Guen"a Mundial. Na Checoslováquia, os panidos comunistas subiram ao poder com o apoio de sociais-democratas. Uma vez confonavelmente instalados no governo, expulsaram os antigos aliados. Um deles foi atirado pela janela e morreu, dando um sentido macabro ao verbo "defenestrar". cuja raiz contém a palavrafeneslra. "janela", em latim.
A Innandade foi criada em 1928 com o objetivo de tomar o Egito um estado isIâmico, governado pela sharia. O objetivo do grupo mudou? A organização agora quer copiar o modelo turco - tal como é na realidade, e não como alguns sonham. A Irmandade tem visto na ascensão do AKP uma maneira eficiente de alcançar o estado em que a religião dirige a polftica interna e externa. Os fundamemalistas egípcios perceberam que, mesmo em um país onde os militares eram os mais fonemente seculares do Oriente Médio. onde a democracia já, existia fazia seis décadas, onde havia,uma imprensa livre e uma Justiça independente, o panido islâmico conseguiu impor seus valores ao restante da sociedade. Por isso, em democracias incipientes como o Egito e a Tumsia, a chance de eles conseguirem o mesmo é muito maior.
Os militares egípcios são muito poderosos. Eles podem manter sob controle as forças islâmicas mais radicais? Na Turquia. o Exército também era visto como o guardião do estado secular. mas o governo islâmico usa o argumento de que sofre tentativas de golpe como desculpa para perseguir a oposição, inclusive os militares. O que ocorre na Turquia nos ensina que até os adversários militares mais cedo ou mais tarde são obrigados a se ajoelhar diante dos partidos islâmicos. A campanha de difamação do governo de Erdogan corroeu a popularidade das instituições militares turcas. O AKP convenceu a população de que o Exército estava disposto a sabotar seu próprios aviões, a bombardear mesquitas históricas de Istambul e a vender armas para crianças. Militares que se opõem ao AKP são grampeados. e as autorizações judiciais para as escutas são dadas não apenas para conversas com conteúdo político, mas também para assuntos particulares e familiares. A maioria dos oficiais está tão intimidada que não quer mais levantar a voz contra o governo. O mesmo pode ocorrer com o Exército do Egito, que, além do mais, não tem tradição democrática alguma.
Qual a possibilidade de os países do Oriente Médio serem governados por islâmicos moderados? Isso até pode acontecer, mas por pouco tempo. Toda vez que a religião se torna o centro da vida política, os muçulmanos moderados são derrotados pelos fundamenralistas. O processo pode ser comparado a um concurso de beleza em que o vencedor é sempre o sujeito mais feio. Nessa disputa. a nota de corte é dada pela pureza ideológica. Cada um quer se mostrar mais islãmico que o outro. Quando o governo dominado por um partido de orientação religiosa anuncia uma nova medida, imediatamente aparece outro grupo dizendo que a decisão não foi islãmica o suficiente e propõe algo ainda mais radical. Dessa forma. a religião torna-se o compasso moral do estado e tamo a política externa como a interna passam a ser medidas por seu grau de pureza ideológica.
No século XI, a região da Andaluzia, na Espanha, era considerada um exemplo de coexistência religiosa. Embora fosse governada por muçulmanos, havia liberdade para cristãos e judeus. Esse fato histórico é frequentemente citado como prova de que um estado islâmico pode ser tolerante e condizente com os ideais de liberdade. O senhor concorda? Em plena Idade Média, cidades como Sevilha, Córdoba e Granada de faro tiveram uma sociedade relativamente liberal, na qual eram reconhecidas as liberdades de pensamento, de expressão e de religião. Sob a dinastia dos almorávidas, os não muçulmanos eram muito bem aceitos. Alguns estudiosos, no entanto, pensam que esse período foi interrompido por invasões externas. Nada disso. Ele acabou" porque os almôades, xütas fundamentalistas, conseguiram submeter toda a região. No início, eles se apresentaram como moderados. Depois, passaram a impor a religião como a única bússola moral da sociedade. Por fim, a influência dos almorávidas acabou sendo tOIalmeme substituída pela dos almôades. Quem não era muçulmano foi perseguido e deu-se início a uma guerra religiosa. Isso é fundamemalismo: a compreensão de que existe uma única forma possível de expressar a própria fé. A história nos ensina que, no concurso de beleza ideológica, os muçulmanos fundamentalistas sempre vencem os moderados no poder.
Com raras exceções, o Oriente Médio conhece apenas dois sistemas políticos: as ditaduras nacionalistas e os estados islâmicos autoritários. Os países de maioria muçulmana são incompatíveis com valores democráticos? O islamismo pode coexistir perfeitamente com regimes representativos. A prova atual disso pode ser vista em países como a Indonésia e a Albânia. O problema do fundamentalismo é específico dos países árabes que viveram ditaduras, nacionalistas ou muçulmanas. Durante a Guerra Fria, tanto os Estados Unidos quanto a União Soviética sustentaram esses regimes para tê-Ios como procuradores de seus próprios interesses na região. Esses países hoje carecem quase tocalmente de uma cultura democrática e ao mesmo tempo abrigam forças dispostas a sepultar o que sobrou da noção mais arejada de organização social.
Como instalar a democracia com sucesso no mundo muçulmano e árabe? A democracia pode ser aplicada em sua
forma plena em países do Oriente Médio, mas depende da ajuda de outras nações. Foi o que ocorreu com Portugal, nos anos 70, após a ditadura de Amónio Sal azar. Dizia-se que o país jamais seria uma democracia. pois a tradição era de regimes autoritários. Hoje, Portugal é um país democrático. Políticos e autoridades portuguesas. tanto de direita como de esquerda, receberam ajuda de partidos da Europa, principalmente de sociais-democratas alemães. Eles deram apoio financeiro, treinaram as lideranças locais e as ajudaram a construir uma rede de relacionamentos em todo o mundo. O mesmo deve ser feito no Oriente Médio, para evitar que o poder seja dominado pelos islamistas, que são mais fortes e querem destruir a democracia. Os partidos islâmicos recebem forte apoio de entidades muçulmanas externas. Por isso, são mais organizados. Será uma dispura injusta se os partidos seculares não receberem apoio para chegar ao poder e, uma vez lá, construir um sistema político estável, com equilíbrio entre os poderes, tribunais independentes e imprensa livre. Se houver ajuda decisiva, o risco de
os partidos islâmicos tomarem o poder será menor.
Os árabes estão abertos a receber ajuda política do Ocidente? O sentimento antiamericano na região é fone, e isso aumenta a necessidade de que o apoio externo seja dado predominantemente pelos europeus. Os americanos não devem nem tentar ajudar. Isso só atrapalharia.
Mulheres com hijabs e burcas participaram dos protestos no Egito, na Síria, na Tunísia, no Barein e no lêmen. Que futuro elas terão? Se os radicais islâmicos conquistarem o cenrro do espectro político, elas terão menos liberdades ainda. A Turquia sempre foi um país em que as mulheres podiam andar com a cabeça descoberta e cabelos à mostra sem problemas. Recentemente foi demitida a teóloga Ayse Sucu, que montou um braço feminino na Diyanet, organização estatal que constrói mesquitas e forma líderes religiosos islâmicos. Ela acreditava que cabia à mulher decidir se quer ou não cobrir a cabeça. Isso foi considerado ofensivo pelos demais diretores da Diyanet. Eles sustentam que não há espaço para uma interpretação pessoal do Islã. Para muitas mulheres. usar o véu já não é mais uma decisão individual. Elas estão cobrindo a cabeça por pressão do marido.
Na Turquia de hoje: se a esposa de um empresário não usa o véu, ele não consegue selar contratos com o governo. Se o marido é um funcionário público, não é promovido.
No Irã, uma teocracia, as universidades estão repletas de mulheres. Isso é um sinal positivo? Em estados dominados pela religião, as mulheres até podem estudar, conseguir um diploma universitário e virar Ph.Ds. Depois serão apenas mães e esposas. As empresas e os governos daqueles países não contratam mulheres para cargos relevantes. Na Turquia, a porcentagem de mulheres no mercado de trabalho caiu de 35%, nos anos 90, para cerca de 20%, hoje. Embora elas detenham 40% dos diplomas de advocacia, não há uma única mulher ocupando altos cargos no Judiciário. Eis mais um motivo para não cairmos no como do estado islâmico moderado.

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