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Ensaios-->Cartéis agradecem e pedem passagem -- 01/02/2011 - 12:34 (Félix Maier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Cartéis agradecem e pedem passagem: Segredo judicial e impunidade matam o Direito Econômico

Edição do Alerta Total – http://www.alertatotal.net/

Por Jorge Serrão e João Vinhosa

Tornou-se perigosamente comum no Brasil o costume de advogados usarem abusivamente brechas jurídicas para livrarem seus clientes das punições claramente previstas na Lei. Tal esperteza foi usada de maneira impressionante pelos defensores dos integrantes do “Cartel do Oxigênio”, organização criminosa que praticava, entre outros, um crime inegavelmente hediondo: fraudar o caráter competitivo das licitações para superfaturar contra nossos miseráveis hospitais públicos.

Mais grave que o uso e abuso de brechas jurídicas pelos advogados é a utilização – por parte de nossas autoridades – de brechas que impedem a aplicação de medidas inibitórias à atuação de cartéis no País. Sem a aplicação de medidas inibitórias, o Brasil não conseguirá combater tal cartel, formado por poderosas transnacionais que usam de todos os recursos para se livrarem das malhas da Lei. Pela impunidade quem paga a fatura é o cidadão indefeso.

Os recentes processos movidos pelos integrantes do cartel do oxigênio contra as punições impostas pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) colocaram dúvidas sobre a reputação do órgão responsável por combater tal tipo de crime no território nacional. A dúvida lançada sobre a reputação do CADE não será desfeita antes do julgamento em última instância dos processos movidos pelos integrantes do cartel.

Pior de tudo é a sensação temporal de impunidade. Corremos o risco de esperar mais de dez anos – após os sete anos já passados – para saber se o Brasil tem, ou não, disposição política para defender os consumidores brasileiros - há décadas inapelavelmente explorados por esse cartel. Além do risco de abalar irreversivelmente a reputação do CADE, as investigações contra o “Cartel do Oxigênio” já provocaram um grande dano à defesa da livre concorrência no país: a falência do Acordo Brasil-EUA para combater cartéis.

Segredo de Justiça?

O ajuizamento de ações privadas, movidas pelas vítimas do cartel com o objetivo de se ressarcirem dos danos sofridos, é da maior importância para desestimular a prática de tal tipo de conluio.

Segundo o CADE, a litigância privada já se transformou em peça chave da política de defesa da concorrência nos Estados Unidos, por demonstrar, na prática, sua eficácia para inibir a infração da lei.

É impossível negar que a aplicação de segredo de justiça dificulta sobremaneira o ajuizamento dessa espécie de ação. Afinal de contas, é essencial que um prejudicado conheça detalhes dos procedimentos comerciais daqueles que o lesaram para que possa estimar seu prejuízo e o valor do ressarcimento que demandará.

Informações abertas

Diante disso, o CADE defende a tese que o Poder Judiciário deveria tornar público grande parte dos documentos relativos ao “Cartel do Oxigênio”.

O CADE argumenta que, passado tanto tempo da obtenção desses documentos, eles não possuem mais valor empresarial de relevo, não havendo prejuízo em sua divulgação.

O CADE ressalta que esses materiais já foram visualizados pelos principais concorrentes de cada empresa, o que reforça a perspectiva de que eles não possuem mais valor para as acusadas.

O Conselho defende a tese objetiva de que, pelo fato de tais documentos não terem caráter pessoal, não haveria qualquer dano à intimidade na sua divulgação.

O problema é que a Justiça não está entendendo assim, concedendo segredo de justiça aos processos movidos pelas integrantes do cartel contra as penalidades a eles impostas pelo CADE.

O caso do “Cartel do Oxigênio”

Começou em fevereiro de 2004. Em uma operação de busca e apreensão realizada nas dependências de quatro multinacionais produtoras de gases medicinais e industriais, foram coletados documentos que comprovaram de maneira inequívoca a existência da organização criminosa.

Os documentos apreendidos desnudaram o “modus operandi” do cartel, expondo, com riqueza de detalhes, a forma de se dividir o mercado, a sistemática da cobertura em licitações públicas, os procedimentos para inviabilizar concorrentes que não faziam parte do cartel e, até mesmo, a maneira de se punir os integrantes que transgredissem as normas de conduta da associação.

Instaurou-se, no CADE, um processo administrativo contra as empresas, por formação de cartel. Os investigados apelaram para manobras procrastinatórias. Por isso, somente em setembro de 2010 o CADE conseguiu julgar o processo.

Condenação exemplar

Por unanimidade, o Plenário do CADE condenou os integrantes do “Cartel do Oxigênio” à pena máxima já aplicada pelo órgão (cerca de R$ 3 bilhões).

Agora, aquilo que chegou a ser considerado uma histórica vitória de nossas autoridades no combate aos cartéis tende a se transformar no caso que manchará indelevelmente a reputação do órgão que defende a livre concorrência de mercado no País. Afinal, se, de posse de provas tão categóricas, o CADE não consegue que os integrantes do cartel sejam punidos, como fica a reputação da defesa do direito econômico no Brasil? Vitória de pirro em defesa econômica de nada vale.

A perfeição do julgamento feito pelo CADE merece um desfecho justo. Foram exemplares tanto o voto do relator do processo administrativo, quanto as atuações da Procuradoria do CADE, do representante do MPF e dos Conselheiros. Se um julgamento justo e perfeito não tem sua sentença cumprida, o que esperar de outros julgamentos em semelhantes casos? E, como ficará a disposição política dos integrantes do CADE para travarem novas batalhas?

O acordo Brasil-EUA

Em 1999, o Departamento de Justiça dos Estados Unidos iniciou um processo contra os laboratórios farmacêuticos ROCHE e BASF por manipulação de preços de vitaminas no mercado norteamericano.

Apesar de terem motivos para confiar em sua lei de combate a cartéis, as autoridades dos EUA não abriram mão de uma eficaz medida inibitória: usaram a mídia internacional para dar publicidade ao processo e às duras penas aplicadas às empresas e aos seus executivos.

Dessa maneira, mandaram um claro recado para os cartéis não se aventurarem a explorar o consumidor norte-americano, pois seriam punidos exemplarmente.

O bom exemplo

Alertados para o caso ROCHE-BASF, os órgãos brasileiros de defesa da concorrência, suspeitando que referidos laboratórios praticassem o mesmo crime em nosso território, solicitaram ajuda às autoridades norte-americanas.

A ajuda foi prontamente dada, e demonstrou, na prática, que a troca de informações entre os países é a mais eficiente arma para combater os cartéis internacionais que atuam em seus territórios.

Diante do êxito de tal colaboração, os dois países firmaram um acordo de cooperação para facilitar a troca de informações entre suas autoridades de defesa da concorrência.

A essência do acordo

Como não poderia deixar de ser, a sistematização da troca de informações entre as partes é a essência do acordo.

Procurou-se diminuir a burocracia e tornar mais célere a troca de informações entre as partes, que passou a ser obrigatória (exceto “se o fornecimento de tal informação for proibido segundo as leis da Parte detentora da informação, ou se for incompatível com os importantes interesses daquela Parte”).

O Acordo Brasil-EUA para combater cartéis entrou em vigor em maio de 2003.

O caso do “Cartel do Oxigênio”, iniciado em fevereiro de 2004, parecia ter sido feito sob medida para a troca de informações prevista no Acordo, pois as empresas aqui investigadas também dominavam (diretamente, ou por meio de suas controladoras) o mercado norte-americano.

A ignorância inaceitável

O fato gravíssimo é que nossas autoridades ignoraram o Acordo.

Se fossem submetidas a investigações nos Estados Unidos em conseqüência da atuação de suas filiais no Brasil, as matrizes das multinacionais determinariam a imediata moderação das ações de suas filiais.

Isso significa que, ao não notificarem os EUA, nossas autoridades perderam a grande chance de intimidar tais criminosos do colarinho branco, minorando a exploração sobre o consumidor nacional.

Em novembro de 2004, o representante do MPF junto ao CADE recebeu denúncia que o Brasil estava descumprindo deliberadamente o Acordo por se recusar a notificar as autoridades dos EUA sobre as investigações que aqui estavam sendo realizadas contra o “Cartel do Oxigênio”.

Em decorrência, foi instaurada, junto ao MPF, o Procedimento Administrativo nº. 1.16.000.002028/2004-6.

A interpretação do MPF

Depois de cinco anos de tramitação no órgão, o MPF decidiu pela não notificação aos Estados Unidos, interpretando da seguinte maneira os termos do Acordo:

“O tratado apenas obriga as partes soberanas a notificarem uma à outra a respeito de investigações que coletem indícios de que os cartéis apurados também atuam no território da contraparte”.

Ficou claro que o Acordo, em vez de facilitar, está prejudicando a troca de informações entre as partes.

Constata-se, também, que, se o Acordo já estivesse em vigor à época da cooperação havida no caso do cartel das vitaminas (caso ROCHE-BASF), as “exigências” contidas em seus termos teriam inviabilizado a própria troca de informações ocorrida (que foi o seu embrião).

Pela interpretação de que uma investigação realizada no Brasil contra um cartel internacional deva coletar indícios de que o cartel também atue nos EUA, o Acordo Brasil-EUA fica parecendo um “Acordo de Patetas”.

Combinação contra o Exército Brasileiro

Nada mais perfeito para se analisar o potencial danoso de um acordo de fornecedores para combinar preços e dividir mercados que o incrível superfaturamento que vitimou o Exército Brasileiro.

No Hospital Central do Exército (HCE), aconteceu o seguinte: em cinco licitações anuais consecutivas, de 1995 a 1999, somente uma empresa apresentou proposta de preços.

Ela chegou a cobrar pelo oxigênio o extorsivo valor de R$ 7,80.

A armação

Em 2000, quando outras concorrentes participaram da licitação, a empresa propôs o valor de R$ 1,63.

E, ainda assim, foi derrotada por duas outras, saindo vencedora a que propôs R$ 1,35.

Diante da comprovação de tal superfaturamento, o Tribunal de Contas da União (TCU) determinou a devolução aos cofres públicos do valor R$ 6.618.085,28, conforme consta no processo TC 012.552/2003-1 e correspondente Acórdão n°1129/2006-TCU-PLENÁRIO.

O improvável

Acontece que não se pode provar formalmente que essa “coincidência” foi uma ação combinada de concorrentes para fraudar o caráter competitivo das respectivas licitações.

Não se pode provar, apesar de ser lícito inferir que, ao propor preços tão elevados nas licitações realizadas de 1995 a 1999, a empresa tinha a certeza que seus “concorrentes” não participariam das disputas (a chamada cobertura por omissão).

Não se pode provar, apesar de saber que, enquanto a empresa concorria sozinha no Exército, na mesma cidade do Rio de Janeiro, outra empresa fornecia para a Aeronáutica e uma terceira fornecia para a Marinha.

Não se pode provar a ação combinada dos fornecedores para fraudar o caráter competitivo das licitações do HCE, apesar de todo o histórico dos envolvidos.

Conclusão

Diante do abalo na reputação do CADE e do sepultamento do Acordo Brasil-EUA para combater cartéis, só resta aos integrantes de cartéis agradecerem às autoridades que colaboraram para tal situação.

E, aos explorados consumidores nacionais, resta implorar para que os cartéis ajam com moderação.


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