Estive, noutro dia, passeando,
Que a gente se aborrece, cá no etéreo,
Quando, insistentemente, o antigo bando
Nos busca apenas lá no cemitério,
E o nosso sacrifício é grande, infando,
Bolando as rimas, num cortejo sério.
Fui visitar o mar, deserta praia,
Em horas em que o Sol se põe, desmaia.
Queria meditar mais sobre a vida,
Pois sempre nos atiça o seu mistério.
A morte superada não convida
Apenas a gozar de refrigério.
A dor do amigo sangra esta ferida:
A gente não é mais água e minério,
Mas sente o coração bater bem forte,
Rogando p’ra que a vida não aborte.
Iluminava o Sol aquelas águas.
Eu punha o pensamento bem distante,
Nos tempos mais terríveis dessas mágoas,
Em que a maldade a vida não garante
E o inferno prometia duras fráguas,
Por não levar em conta o semelhante,
Pois, imbecil, lembrava do evangelho,
Como remédio, p’ra tomar de velho.
Às vezes, cá na Terra, eu não fazia
Nenhum esforço p’ra cuidar do amigo,
Aqui no Etéreo, eu passo p’ra poesia
Que o sentimento nunca é tão antigo
P’ra transformar-se em mera fantasia.
Quem pensa assim não sabe do perigo
De se enfrentar o tempo, inoperante,
Enquanto sofre mais o semelhante.
A hora é boa, sempre, para a ajuda:
Não deixes p’ra depois a caridade.
O panorama dessa vida muda,
P’ra acentuar apenas a saudade.
Se não tens meios de ajudar, estuda,
Sem negligência, que o saber invade
A tua mente, com gentis idéias,
Como abelhas em férvidas colméias.
Se, de todo, estiveres impedido,
Sempre resta o consolo de uma prece.
Eu não conheço nada parecido
Que faça com que o etéreo mais se apresse,
Mas é preciso que se dê sentido
Ao pedido que o amigo favorece,
Rogando com amor, com esperança
De que essa intercessão logo se alcança.
Aí, o nosso amigo morre louco
E nós choramos lágrimas sentidas,
Bastante mais por nós, por ele um pouco,
Julgando nossas preces más, falidas.
Teria feito o Pai ouvido mouco
Ou são tão miseráveis nossas vidas
Que a dor há de forjar sempre o destino,
Contestando do evangelho o bom ensino?
Era essa a resposta que eu pedia
Ao mar, ao Sol, à praia, nessa hora.
Não desconfies de que eu bem sabia:
Sabia que no etéreo a lei vigora,
Porém, meu coração não resolvia
O drama do meu bando, quando chora,
Que o sentimento a gente não domina,
Mas busca a causa fútil e elimina.
O Sol me disse assim: — “Perseverança!”
A Praia me adiantou: — “Respeito e calma!”
O Mar assim falou: — “A Noite avança,
Descolorindo o verde de minh’Alma,
Mas, de Manhã, as cores da Esperança
Hão de me cortejar com sua palma,
Que a Natureza sempre se renova,
Para mostrar que a Vida é só u’a prova!”
Agradeci ao Pai tanta beleza,
Dizendo a prece que melhor sabia.
Depois, lembrei-me desta santa mesa
E pus os pensamentos na poesia,
Sem graça, reconheço, que a surpresa
É ver como deu certo a melodia,
Nos metros em que dei ao bom leitor
Um pouco do que sinto... ao recompor...
|