Um comentário despretensioso que acabo de inserir no quadro de avisos me levou a reflexões mais profundas. Como de hábito, não posso deixar de compartilhá-las com os meus fiéis cinco leitores aqui da Usina. Fiz referência, naquele espaço, a uma notinha publicada por Edilberto Brito da Silva, em que esse colega, com a melhor das intenções, “elevava” a mulher à condição de co-autora da criação. Co-autora, vejam bem, da estupenda obra de Deus, aquele senhor de barbas compridas e brancas que provavelmente carrega um órgão parecido com o meu no meio das divinas pernas.
Ora, isso é muito engraçado. Como eu disse lá no quadro, qual a prova consistente, material ou lógica de que Deus – o tal velhinho de barbas brancas a que aludi há pouco – pertença ao sexo masculino? Não consta que algum dos viventes tenha tido com essa criatura contato tão íntimo a esse ponto, isto é, que lhe permita afirmar tão peremptoriamente a que gênero pertence o tal Deus.
E, juntando nove com meia dúzia, vou mais longe, já invadindo o campo dos mais renitentes e ortodoxos leitores da bíblia: “imagem e semelhança” tomando como referência exatamente quem, meus caros caras pálidas? Quem foi que disse que a suposta semelhança, constante das escrituras no momento em que tiveram a má idéia de inserir o homem no universo, quem foi que disse, dizia eu, que essa semelhança partiu de uma coisa feia e desengonçada, parecida comigo e com tantos defeitos quanto os que tenho?
Bem, bem, poderiam contrapor, os mais fanáticos: e a história da costela? Ora, em primeiro lugar, não é fácil criar, a partir de uma costela estupidamente feia, algo tão bem bolado como esse outro sexo que puseram na nossa espécie. Portanto, esse negócio de costela não me convence e pode muito bem ter servido aos propósitos de Abraão, querendo iludir seu povo.
Enfim, é isso. Limpando a parte jocosa deste texto, agradeço ao Edilberto por me ter levado a uma percepção com tal grau de profundidade, porque não há nada mais discriminatório nem mais cretino do que essa idéia de vincular a figura divina central ao sexo masculino. Trata-se de um preconceito que percorre a totalidade das culturas, até as politeístas, onde o Deus bam-bam-bam, o maioral entre todos, nunca é mulher. E é um preconceito muito estúpido, porque, a depender dos critérios clássicos de comparação – inteligência, graça, beleza, simpatia e autocontrole –, devo lhes dizer, sem nenhuma margem de erro: o tal Deus, se seu gênero for determinado a partir desses parâmetros, não precisa fazer a barba, nem tem como deixar crescer aqueles cabelos todos que lhe atribuem debaixo do queixo.
|