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Ensaios-->Esquerda e Direita não existem -- 13/08/2007 - 14:05 (Félix Maier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
ESQUERDA E DIREITA NÃO EXISTEM: VAMOS NOS LIVRAR DESSA IMPOSTURA!

por Augusto de Franco

Comecemos com algumas perguntas. A manutenção dessa anacrônica e reducionista divisão das forças políticas e sociais entre esquerda e direita interessa a quem? Sim, a quem interessa o jogo da polarização esquerda (supostamente ao lado do povo, da justiça social, dos direitos coletivos, enfim, do bem) versus direita (que seria do lado das elites, da iniqüidade social, da violação dos direitos, do mal)?

E qual o poder analítico dessa divisão? Quem defende a universalização da cidadania e a inclusão dos chamados excluídos em uma sociedade mais justa e mais fraterna deve ser, obrigatoriamente, de esquerda? E quem defende a liberdade do indivíduo contra o totalitarismo das alternativas igualitaristas, está condenado a ser chamado de direita?

Para ser de esquerda alguém tem que apoiar o protoditador Chávez? Tem que defender a ditadura de Fidel? Tem que ter feito campanha para Marie Ségolène Royal contra Nicolas Sarkozy?

Quem apóia Lula é de esquerda? Renan, Sarney, Jader, Delfim, Maluf e Paulo Henrique Amorin são de esquerda? E quem é contra Lula é de direita? Roberto Freire, Raul Jungmann, Fernando Gabeira, Arnaldo Jabor e Nelson Motta são de direita?

E Lula é de esquerda? E quem vaia Lula é de direita? E Serra é de direita? E quem não vota em Serra é de esquerda?

Quem apoiava os bandidos da comunidade de informações da ex-URSS, como o protoditador Wladimir Putin – aquele que recentemente mandou matar a jornalista Anna Politkovskaya (apenas a ponta de um iceberg de todo tipo de violações dos direitos humanos, de crimes medonhos contra a sociedade e outros ataques à democracia) – contra o protoliberal Boris Yeltsin, era de esquerda?

Qualquer pessoa inteligente percebe que não estamos aqui diante de uma classificação séria, mas de um embuste.

Qualquer pessoa minimamente inteligente percebe que não existem essas coisas chamadas de ‘esquerda’ e ‘direita’ a não ser: a) nas cabeças dos tolinhos que acreditam que tal classificação guarda alguma racionalidade e, assim, ainda querem se perfilar num dos pólos de uma divisão reducionista da diversidade política que acompanha a complexidade social; ou b) dos espertinhos que usam essa divisão embusteira para consolidar a sua posição ou as suas pretensões de poder.

Existe, sim, quem se declare, ou se ache, de esquerda ou de direita. Mas a idéia de que as forças políticas em uma sociedade complexa possam ser divididas sempre em dois campos, em dois pólos, além de levar inevitavelmente à autocracia, não resiste a cinco minutos de análise. Os argumentos a favor da sua manutenção são, em geral, baseados em alegações vagabundas que podem ser facilmente desmontadas pelo raciocínio mais elementar.

Embora Jung tenha afirmado que 'vivemos numa época em que nos surge a percepção de que o povo que vive no outro lado da montanha não é composto unicamente por demônios ruivos responsáveis por todo o mal que existe no nosso lado da montanha', o mito recorrente de que sempre existem dois lados ainda remanesce.

De todas as caracterizações operativas da política, a distinção entre 'esquerda' e 'direita' foi a que mais contribuiu para a apreensão da política como questão de ‘lado’, dificultando a compreensão e a prática da democracia.

Vale a pena perder dois minutos examinando de onde saiu isso.

'Esquerda' e 'direita' são noções que remontam ao final do século 18. E que se consolidaram no vocabulário e nas teorias políticas a partir da ideologia do Partido Bolchevique, isto é, das idéias adversariais da fração majoritária do Partido Operário Social-Democrata Russo que dirigiu a revolução de outubro de 1917. Essa fração, constituindo uma ala 'esquerda', evocava a distribuição espacial dos membros na velha Assembléia da Revolução Francesa.

Todavia, não é sem razão que conceitos originalmente geométricos tenham adquirido tão forte conteúdo político, ou melhor, político-ideológico. O lado em que se sentavam os membros de uma assembléia passou a indicar com que lado da sociedade eles estavam. A topografia do salão de reuniões refletia uma 'ideologia tomográfica' da própria sociedade. Tal como eu posso, sempre, dividir – more geometrico – uma sala (em geral um quadrilátero ou polígono) em dois lados, também posso dividir – por força de ideologia – em dois lados o espaço social.

A 'esquerda', muito mais do que a 'direita', foi responsável pela difusão dessa ideologia, porquanto tentou urdir uma 'ética' sobre ela, instituindo-a como critério axiológico-normativo. De fato, toda a 'esquerda' está constituída sobre a idéia de que existe um lado certo: o 'seu lado'. Ser 'de esquerda' é estar ao lado dos explorados, oprimidos e dominados contra o outro lado: o lado dos exploradores, opressores e dominadores. É assim que, durante muito tempo, acreditou-se que o fundamental, em política, era estar do lado certo.

Entretanto, na medida em que se multiplicam resultados objetivos reprováveis da atuação da 'direita' (como os genocídios de Hitler) e da 'esquerda' (como os genocídios de Mao), tal ideologia vai perdendo verossimilhança. E vai ficando claro que, do ponto de vista ético, não pode existir, em política, um lado certo. E na medida em que, em política, ninguém está, a priori, com a verdade, ninguém também pode, a priori, ser aprovado eticamente pelo fato de estar situado num suposto lado certo. Tanto Hitler quanto Mao acreditavam estar do lado certo. O próprio bolchevique (majoritário) Lênin – responsável, aliás, pela difusão da 'ideologia científica' do lado certo: o chamado marxismo-leninismo – não podia estar eticamente correto ao introduzir, contra a opinião do menchevique (minoritário) Martov, a pena de morte no Estado pós-revolucionário. Trotski, teórico de uma 'ética de lado' (tanto que escreveu o texto: 'A nossa moral e a deles'), não pode ser eticamente aprovado por massacrar os sublevados de Kronstadt.

A 'esquerda' caracterizou a 'direita' como necrófila. Mas inúmeras barbaridades também foram cometidas pela 'esquerda' no século passado (em volume, aliás, incomparavelmente maior), sob a justificativa da sua necessidade para o triunfo da revolução socialista e para a instauração do futuro reino da liberdade (e da abundância). Porém se os fins justificam os meios, então já não se pode falar de ética.

Passadas tantas catástrofes – inclusive aquela benfazeja que sepultou o 'socialismo real' – só alguém muito impregnado da ideologia do lado certo ainda acredita que a sociedade humana possa ser dividida em dois lados: um com a verdade e o bem; o outro com o erro e o mal. Por incrível que pareça, entretanto, ainda são muitos os que pensam assim.

É óbvio que, para a democracia, o que é certo eticamente não é estar em uma posição ou na posição oposta, mas o modo de resolver o conflito gerado entre opiniões circunstancialmente confrontantes. Porque, afinal, a política é um modo de resolver conflitos. E, do ponto de vista democrático, não pode ser aprovado nenhum modo que impeça o alargamento da liberdade, atente contra a vida e a integridade física ou psíquica ou inflija voluntariamente sofrimentos aos semelhantes, como já percebia Agnes Heller (1982) ao argumentar sobre a impossibilidade de uma ética marxista, quer dizer, de uma 'ética de lado'.

Ademais, se ninguém, enquanto pólo de um conflito, tem de antemão a verdade, não se trata, na política democrática, de convencer os outros de nossas crenças, de fabricar ideologias para que os demais acreditem nelas. Pelo contrário, trata-se de promover a 'polinização' mútua das idéias, viabilizar o trânsito do pensamento ao invés de exigir alinhamentos de posições, para que da interação dos contrários (e dos diferentes em geral) possa emergir a construção de novas idéias e práticas.

Portanto, na medida em que a política vai se desideologizando, ou seja, deixando de ser uma questão de lado e se democratizando, isto é, passando a ser uma questão de modo, também vão se desconstituindo as bases axiológico-normativas que impulsionavam alguém a ser 'de esquerda' ou, simetricamente, 'de direita'. Trata-se de referências tópicas já ultrapassadas pela compreensão de que, numa sociedade cada vez mais complexa (com mais pluralidade e diversidade), em que os lados são múltiplos e as diferenças variadas e variáveis, não tem mais cabimento constituir forças políticas sobre a base de que existem agentes, de um lado da sociedade, cujo movimento contra o outro lado – se resultando na sua prevalência política, quer pela força, quer pela hegemonia de suas idéias – cria a condição para a transformação de toda a sociedade.

Tal ideologia fundamentava-se originalmente na estranha 'teoria' segundo a qual existia um grupo social cujos supostos 'interesses históricos', uma vez satisfeitos, inaugurariam uma era de liberdade e abundância para toda a sociedade humana. 'Teoria' que, no fundo, era uma crença, mítica, de que havia uma classe social cujos particularismos, uma vez realizados, se universalizariam. E que, portanto, o critério último que deveria definir a política era estar ao lado desta classe, que recebeu da própria história a missão de transformar a realidade social desigualitária, mas que, para tanto, precisaria tornar-se hegemônica na sociedade.

Os que continuam insistindo nessas idéias revelam um certo pendor para o fundamentalismo e, inevitavelmente, para a autocracia. É o caso, por exemplo, dos que continuam tentando salvaguardar o patrimônio da 'esquerda', como fiéis cavaleiros da tradição marxista-leninista, os quais não têm mais razões filosófico-sociológicas consistentes a seu favor, mas apenas uma herança histórico-antropológica à qual não sabem bem como renunciar sem perder o sentido da própria vida.

Sim, apesar do esforço mais recente de Bobbio (1994) para esclarecer as razões da distinção entre 'esquerda' e 'direita' como uma distinção tipicamente política (coisa que ela não pode ser totalmente, exigindo sempre algum 'doping' ideológico), tal distinção reforça idéias autocráticas, dificultando a apreensão – e a prática – da democracia.

Cair nesse jogo da divisão esquerda x direita e sucumbir à tentação do alinhamento a um dos seus pólos é fazer o jogo dos inimigos da democracia. É contribuir para perverter a política (que é uma questão de modo), transformando-a numa questão de lado. Isso é próprio dos bandos, não do metabolismo da comunidade política.

O problema é que contingentes consideráveis de democratas, que não concordam com o uso instrumental da democracia contra a democracia que está em andamento nos dias que correm, quer pela via protoditatorial (de Putin e Chávez), quer pela via da manipulação (de Kirchner e Lula), caem como patinhos na armadilha urdida pelos que conspiram contra a democracia. E dizem assim: 'Bem, se eles são de esquerda, então eu sou de direita'. E ainda perguntam: 'Qual o problema? Temos mesmo que assumir a nossa condição de direita'. Ao cometerem essa tolice, estão pensando, talvez, que a denominação de direita indica seu compromisso com a liberdade do indivíduo contra os totalitarismos estatizantes da esquerda. Acham que estão fazendo a coisa certa. Mas não estão. Estão apenas servindo aos que querem tirar proveito dessa ideologização perversa com objetivos abomináveis.

Tudo o que Chávez queria era poder chamar seus opositores de golpistas das elites, de conservadores, de direita. Tudo o que Lula quer é chamar seus opositores do movimento Cansei de golpistas das elites, de conservadores, de direita. Lula usou e abusou desse embuste durante a última campanha eleitoral. E agora, diante de legítimas manifestações de contrariedade com o comportamento de seu governo por parte de amplos setores da sociedade civil, está repetindo a dose, comparando os manifestantes da última passeata de São Paulo com os que apoiaram o golpe militar de 64.

Mas não foi nenhuma elite, nem foi nenhuma direita, que vaiou Lula. Vamos nos libertar dessa atitude genuflexória em relação às leituras economicistas da realidade social. Pessoas podem ter opiniões independentemente das classes a que supostamente pertençam (definidas a partir da sua posição em relação ao processo de produção e acumulação do capital). Essa subordinação da política a uma suposta infra-estrutura econômica da sociedade só existe nos esquemas mecânicos que foram criados para interpretar a realidade social a favor dos que queriam conduzir como um rebanho a sociedade para algum lugar. Quem vaiou Lula, quem se manifestou na passeata de São Paulo, foi a opinião pública.

Sim, existe uma opinião pública, composta por aqueles que proferem opiniões no espaço público. A esquerda homiziada na imprensa tentou rotular e desqualificar o evento dizendo que foi uma manifestação da 'classe média'. Foi sim, seus panacas! Quando vocês ainda estavam nos cueiros ou nem haviam nascido, eu já organizava a passeata dos 'Cem Mil', no Rio de Janeiro, junto com meus colegas... proletários? Não, de 'classe média', essa mesma 'classe média' que sempre controlou o PT e que hoje está no poder. Porque o que está em questão aqui não é o fato de ter sido a 'classe média' (aliás, uma caracterização de classe impossível nas teorias de classes inspiradas no marxismo) que se manifestou e sim o fato de ter sido uma manifestação de indivíduos mobilizados em torno de opiniões políticas, coisa muito difícil de acontecer com a maioria da população.

Ou seja, a opinião pública não é a opinião da maioria da população, como somos induzidos a acreditar depois que apareceram os institutos de pesquisa de opinião. A opinião pública, repito, é aquela que se forma quando as opiniões são voluntariamente proferidas no espaço público e não quando são arrancadas por um entrevistador que bate à sua porta ou corta o seu caminho na via pública e depois totaliza as respostas que arrancou porque perguntou mas que você não estava disposto a dar espontaneamente. Se existisse Ibope ou DataFolha naquela época da passeata dos 'Cem Mil', os jornais poderiam noticiar que foi a manifestação de uma minoria da população. E foi mesmo. Em, 1970 a maioria da população brasileira – aqueles 90 milhões em (in)ação do jingle de Luiz Gustavo – apoiava a ditadura.

Assim, não importa se a maioria da população não 'estava representada' na passeata do Fora Lula. Ela também não estava na passeata dos 'Cem Mil' contra a ditadura militar. Como, no passado, as mobilizações eram contra a direita, podia. Mas como, agora, são contra a esquerda, não pode mais. Ora, tenha paciência!

É evidente que essa divisão entre esquerda e direita só interessa à esquerda. Do contrário ela não seria recorrentemente colocada (por quem?) senão pela esquerda. Vejam que quem ganha com essa dicotomização política é a esquerda, nunca a chamada direita. É preciso ser tolo para imaginar que, declarando-se de direita, alguém vai acumular alguma coisa, construir um outro pólo com chances de derrotar a esquerda. Porque a divisão entre esquerda e direita foi feita para desqualificar a direita. E, antes, porque a questão não está aí, nos supostos dois lados em eterno confronto. Essa não é uma divisão política legítima, não, pelo menos, do ponto de vista democrático, porque dividir assim o espectro político, como vimos, leva necessariamente à autocracia, não à democracia.

A divisão que interessa, aquela que faz sentido quando não estamos sob o efeito dessa droga pesada que se chama ideologia, é a divisão entre democratas e autocratas, não porém em termos de localização em um dos lados do salão ou da sociedade, e sim em termos da adesão a um modo de mediar conflitos, um modo que, aliás, vem para desconstituir as inimizades permanentes urdidas pela compreensão autocrática da política como questão de lado.

Há uma longa discussão sobre isso, que deveria ser feita. Como neste artigo não teremos mais tempo de desenvolvê-la, basta apresentar um critério prático para saber se alguém está ou não convertido à democracia. Basta perguntar ao sujeito: 'Você apóia Chávez?' É batata! Não falha jamais. Vale tanto para os dirigentes e militantes políticos quanto para aquele criptopetista ou criptolulista homiziado na academia ou nos meios de comunicação. Vale para as legiões de sociólogos defensores da democracia participativa (que, por incrível que pareça, não estão convencidos da democracia).

Esse é o critério fundamental: a democracia realmente existente, com suas imperfeitas instituições e com seus limitados procedimentos, mas compreendendo o Estado de direito. Não importa se o sujeito defende – como eu – a radicalização (no sentido de democratização) da democracia. Se ele não defender também aquela democracia cujos fundamentos Chávez está violando, então podemos dizer, com toda certeza, que ele não está convertido à democracia. Não importa para nada que ele se diga de direita ou de esquerda. O tempo das narrativas totalizantes que davam sentido a esses posicionamentos já passou. E já foi tarde.

Por favor, vamos olhar para frente. Vamos nos livrar dessa impostura.


***

Comentário

F. Maier

Discordo do Sr. Augusto de Franco. Direita e Esquerda existem, sim senhor:

Direita – Quem é de direita é, antes de tudo, direito. Ou procura sê-lo. Quem é de esquerda é sinistro, como comprovam os vocábulos originais, tanto em latim, quanto em italiano.

Esquerda – Os muçulmanos usam a mão esquerda para limpar a bunda. A mão esquerda é “suja”, a mão direita, “limpa”: serve para comer e cumprimentar as pessoas.



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