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Ensaios-->“Na teia do sol”: o retrato do ativista quando hortelão -- 31/10/2004 - 04:01 (José Pedro Antunes) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Até se tornar reconhecido com 'À sombra do cipreste' (2000), Menalton Braff havia publicado dois livros sob o pseudônimo de Salvador dos Passos.

Em entrevista a Jônatas Protes (zine 'ao pé do ouvido'), o escritor fala sobre a diferença entre ambos: 'O Salvador era político, talvez excessivamente político. Ou seja, era panfletário. Ele achava que a redenção do homem, o fim das injustiças (sobretudo sociais) passavam pela literatura. Então havia que ser muito simples, muito claro, pois era preciso atingir o leitor, era preciso comovê-lo e movê-lo para uma posição. Era uma função conativa da linguagem. O Menalton acha que a literatura não tem esta obrigação. Pode até fazer isso tudo, mas sua principal função é encantar. Texto que não encanta pode ser ensaio, tese, informação, pode ser tudo menos literatura'.

Dia desses, o entrevistador me dizia que, para ele, Menalton Braff se traduz numa palavra: ternura. Em dada passagem de 'Na teia do sol' (Editora Planeta do Brasil, 2004), fui constatar que André vê passar, no fluxo de sua consciência, uma certeza: 'Acho que Guevara, quando disse isso pensou foi em mim: sin perder la ternura. La ternura. Se eu fosse inventar um mundo, enchia tudo quanto é porra de coração de ternura. Então a vaga de torturador ia continuar vaga para sempre'.

Esta noite, no espaço da Biblioteca do Sesc/Araraquara, Menalton lê passagens desse romance e fala sobre 'A subversão na literatura”, para depois conversar com os presentes. Claro, sem perder a ternura, jamais.

Fiel a uma de suas influências literárias mais marcantes, Clarice Lispector, Menalton vem se esmerando no cultivo de uma técnica que já marcava tanto os contos de 'À sombra do cipreste', como os dois romances que se seguiram: 'Que enchente me carrega?' e 'Castelos de Papel'.

Em 'Na teia do sol', ao longo de 159 páginas, o leitor vai conviver, num sitiozinho perdido nalgum rincão deste Brasilzão sem porteira, com André, codinome Tito. André e uma laranjeira que ele espera ver vestida de noiva (claro, tem e não tem a ver com 'Meu pé de laranja-lima'), o cachorrinho Barão (pois não, um tataraneto da Baleia, de 'Vidas Secas') e um velho verdureiro, que não só não lhe traz as notícias esperadas, como só faz protelar o frágil fiapo de esperança de que a laranjeira floresça, com presentes que são verdadeiros cavalos-de-Tróia literários. Vencidos os sete volumes de 'Em Busca do Tempo Perdido', não é que o homem lhe aparece com 'A Comédia Humana'? No mais, tudo são angústias e temores. E uma horta por cultivar. Até quando?

Uma das imagens mais recorrentes para se falar da literatura é a do rio, que em latim se diz 'flumen', que nos deu, entre tantos outros, o vocábulo 'fluxo'. O 'fluxo de consciência' é uma técnica cultivada por tantos mestres, depois de Joyce, e que encontra em Menalton Braff, com este seu 'Na teia do sol', um momento de plena realização.

Participar do fluxo de consciência desse ativista político, quando hortelão, é mergulhar no fluxo de consciência de uma geração inteira que, como Salvador dos Passos, panfletariamente acreditou no poder redentor da literatura, e que, com Menalton Braff, vai se despedindo da famigerada 'consciência histórica' (André tem medo de ser herói, recusa-se à autocrítica), para abraçar a 'consciência narrativa'.

A História não pode prescindir das nossas tantas histórias individuais, diz o suíço Peter Bichsel; contar uma história é sempre contar uma história sobre a impossibilidade de se contar uma história.

Basta abrir os jornais para saber que a clandestinidade de André é não apenas o exílio, o silêncio de uma geração inteira, mas, sobretudo, a clandestinidade em que todos nós, hoje, consciente ou inconscientemente, nos vemos mergulhados.

'Na teia do sol' é um aceno de despedida a tantas fracassadas tentativas panfletárias, é um gesto de resistência, legítimo, porque prenhe, finalmente, da mais apurada consciência narrativa.

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[Artigo publicado no dia 26/10/04, na coluna Oxouzine, jornal Tribuna Impressa de Araraquara.]
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